No último fim de semana, Ricardo Araújo Pereira voltou ao horário nobre de domingo à noite, na SIC.  Nesse regresso de “Isto É Gozar Com Quem Trabalha”, o humorista convidou Ana Gomes, candidata presidencial, e lançou-lhe a questão: “Qual é o comentário político de Ana Gomes em relação a esta bandalheira de a Ana Gomes não abandonar o espaço de comentário político quando é candidata à Presidência da República?” A socialista colou-se ao exemplo de Marcelo, há cinco anos, quando se lançou na corrida a Belém — mas falhou o tiro.

Ana Gomes explicou que ia “seguir o exemplo” do atual Presidente da República, ex-comentador da TVI. “Ele suspendeu o comentário político na televisão — eu faço-o, como ele, há bastantes anos — no dia em que formalizou a candidatura. É exatamente o que eu farei. No dia em que formalizar a candidatura, suspenderei o comentário político na SIC”, garantiu Ana Gomes.

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Detalhe: Marcelo suspendeu o comentário a 11 de outubro de 2015, mas só formalizou a sua candidatura, com a entrega de 15 mil assinaturas no Tribunal Constitucional, a 23 de dezembro, mais de dois meses após a despedida da TVI. Aliás, nesse último encontro, que serviu como “justa homenagem” ao então comentador, o próprio Marcelo Rebelo de Sousa dizia que, naquele momento, o contrato que o ligava à estação de Queluz de Baixo estava “suspenso”. “Este já não é pago”, disse, em tom ligeiro, o então diretor de informação Sérgio Figueiredo sobre aquele último momento de comentário de Marcelo.

Na sexta-feira anterior, Marcelo já tinha feito o seu discurso de anúncio de candidatura, em Celorico de Baixo, a sua terra natal. O “exemplo” de que Ana Gomes se socorre para justificar o seu calendário não corresponde, por isso, à verdade. Desde logo, porque a última intervenção de Marcelo na TVI ocorre dois dias depois desse discurso. Mesmo que a socialista se estivesse a referir ao discurso de anúncio como momento de formalização, no seu caso, essa intervenção aconteceu a 10 de setembro. E, depois disso, já por duas vezes Ana Gomes esteve em estúdio para comentar a atualidade, já na qualidade de candidata à Presidência da República. Assume-se, por isso, que a “formalização” a que se referia é a entrega das assinaturas no Palácio Ratton.

Mas o tema não surgiu apenas no programa de humor da SIC. A presença de Ana Gomes no ecrã tem, na verdade, suscitado reações entre os candidatos (já anunciados) às eleições presidenciais do próximo ano. No dia 8 de setembro, o jornal Público fazia uma chamada de capa com uma citação da socialista: “Serei candidata.” Estava confirmada a corrida da ex-eurodeputada a Belém. Cinco dias mais tarde, a partir da Casa da Imprensa, em Lisboa, confirmava isso mesmo. “Declaro-me candidata às próximas eleições presidenciais.”

E, entretanto, o espaço de comentário que protagoniza na SIC Notícias, todas as semanas — o mesmo onde ensaiou uma viragem rumo às presidenciais, em maio — não sofreu quaisquer alterações. A propósito desse “palco” de que beneficia a ex-eurodeputada, Tiago Mayan, o nome apoiado pela Iniciativa Liberal para as eleições de janeiro, considerou, na semana passada, “inaceitável” aquilo que diz ser um desvio face ao “referencial ético” dos candidatos eleitorais. “Houve também quem instrumentalizasse, com o mesmo propósito, o espaço de que dispunha no comentário desportivo”, diz Mayan, numa referência a André Ventura e à candidatura às últimas legislativas.

Agora, é Ana Gomes que, depois de oficializar a candidatura, mantém um espaço de comentário televisivo. É inaceitável”, considera o adversário da socialista.

Marcelo Rebelo de Sousa estreou-se na TVI em maio de 2000. Nos quatro anos seguintes protagonizou um espaço de comentário naquela estação mas, em 2004, ruma à RTP, onde fica nos seis anos seguintes. Regressa à TVI em 2010, poucos meses antes de decidir avançar com a candidatura a Belém — que anunciou a 9 de outubro. Dois dias depois, está em direto pela última vez como comentador residente nas noites de domingo da TVI, numa “justa homenagem” que a estação lhe dedica.

No caso de Ana Gomes, a socialista estreou-se na análise da atualidade em novembro de 2016, dividindo o ecrã com o social-democrata Nuno Morais Sarmento. Mais tarde, muda-se para a SIC, onde passa a protagonizar o seu próprio espaço de comentário semanal, nas noites de domingo. E onde ainda se mantém.

CONCLUSÃO

Ao contrário daquilo que Ana Gomes disse, Marcelo Rebelo de Sousa não interrompeu a sua presença no espaço de comentário da TVI quando “formalizou” a sua candidatura a Belém. Em outubro de 2015, dois meses antes de entregar as assinaturas necessárias no Tribunal Constitucional, o social-democrata despediu-se dos ecrãs.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

De acordo com o sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA1: este artigo foi produzido no âmbito de uma parceria de fact-checking entre o Observador e a TVI

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