Uma publicação que circula nas redes sociais assegura que o governo chinês pediu à Zâmbia que integrasse cidadãos chineses nas suas forças de segurança — um pedido que aquele país do sul do continente africano se viu “obrigado” a aceitar por medo de “represálias” da China, com quem tem uma “dívida exorbitante”, alega o autor do post. Segundo a publicação, esta será uma prova de que, “aos poucos”, África vai sendo “vendida” e que será “totalmente controlada pela China”, que ali terá “bases militares em todo o canto” e “chineses juntando-se às elites políticas africanas que governam”.

A publicação é acompanhada por três fotografias: uma, com maior destaque, em que um oficial com uniforme chinês é medalhado pelas forças de segurança da Zâmbia; e outras duas, em que agentes chineses posam ao lado de agentes zambianos, com as bandeiras dos dois países afixadas por detrás. Mas enquanto a primeira fotografia nada tem a ver com o texto (foi tirada noutro acontecimento) as duas últimas carecem de contextualização.

As fotografias terão sido, as três, tiradas em 2017, só que em diferentes momentos. Uma pesquisa mais aprofundada revela que a primeira imagem consta num artigo do jornal estatal Zambia Daily Mail e mostra o inspetor-geral da polícia do país, Kakoma Kanganja, a atribuir uma medalha a Sun Ming, um adido chinês que trabalhava, então, na embaixada chinesa na Zâmbia, pela ajuda no treino de oficiais zambianos. Segundo o jornal, aquela foi a “primeira vez” que a polícia da Zâmbia atribuiu “uma medalha por bravura a alguém que não é membro daquele serviço”. Ou seja, Sun Ming não exercia funções nas forças de segurança zambianas, ao contrário do que a publicação dá a entender.

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As outras fotografias foram tiradas em dezembro de 2017, sendo que a primeira pode ser encontrada, por exemplo, no artigo do jornal zambiano Lusaka Times, que noticia a entrada em funções de oito oficiais da comunidade chinesa a residir no país nas forças de segurança da Zâmbia.

De facto, o anúncio dessa contratação ocorreu a 18 de dezembro de 2017, mas a ele seguiu-se uma onda de indignação pública, sobretudo porque, no início daquele ano, tinha sido introduzida uma lei que proibia agentes da polícia da Zâmbia de casarem com cidadãos ou cidadãs estrangeiros por “questões de segurança” — e por alegações de que haveria estrangeiros a infiltrar-se nas forças policias do país. Nem mesmo os zambianos de dupla nacionalidade podiam entrar para a polícia. Os intensos protestos levaram a polícia a recuar, 24 horas depois do anúncio, e a retirar os agentes de funções. É isso que consta numa notícia de 19 de dezembro de 2017 da BBC.

Segundo o site da estação televisiva britânica, as críticas foram adensadas por uma desconfiança que existe no país em relação à comunidade chinesa — que, em 2015, contava cerca de 20 mil pessoas. Aqueles agentes — recrutados em regime de part-time e como reservistas — não teriam sido contratados para desempenhar nenhuma função ligada à comunidade chinesa e sim para dar assistência aos agentes zambianos.

Além disso, não foram encontrados argumentos que validem a alegação feita na publicação de que a Zâmbia foi “obrigada” pelo governo chinês a fazer essa integração (que, como vimos, não chegou a completar-se) por receio de “represálias”, dado o “peso da dívida com a China”.

É, porém, verdade que existe uma estreita relação entre a Zâmbia e a China, que já é antiga. Por exemplo, de acordo com o site norte-americano Quartz, a China ajudou a Zâmbia, um país sem contacto com o mar, a construir uma linha ferroviária de 1.860 quilómetros entre o porto de Dar es Salaam, na Tanzânia, e Kapiri Mposhi, no centro da Zâmbia, nos anos 70. A China não só é um dos principais parceiros comerciais da Zâmbia, como tem financiado avultadamente muitos projetos de infraestruturas no país. Mas, apesar dessa relação económica, há tensões entre as comunidades dentro do território, descreve o site de notícias.

Conclusão

A polícia da Zâmbia chegou a integrar cidadãos da comunidade chinesa residente no país, mas perante os protestos da opinião pública, recuou na decisão. Além disso, uma das fotografias usadas na publicação corresponde a outro acontecimento — à atribuição de uma medalha a um adido da embaixada chinesa na Zâmbia que não integra as forças de segurança daquele país africano. Também não foram encontrados argumentos que corroborem a ideia de que o pedido para a integração de agentes chineses nas forças zambianas tenha sido feito pelo governo chinês e que a Zâmbia se tenha visto obrigada a aceitar por medo de represálias dada a “dívida exorbitante” para com a China. Mas, de facto, apesar da relação económica, são conhecidas as tensões entre as comunidades dos dois países.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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