Numa conjuntura em que tudo é quantificável, o World Happiness Report acaba de colocar Portugal na 77.ª posição do ranking mundial da felicidade em 2017. Uma posição a meio da tabela, pois Portugal é o 77.º entre 156 países e tem um índice de 5,41 numa escala de 0 a 10.

Uma classificação difícil de explicar se forem tidos em consideração o contínuo otimismo do primeiro-ministro e a propaganda que é feita de um país onde tudo corre oficialmente bem. Uma realidade que, por norma, tem merecido o beneplácito, quase cúmplice, de uma oposição que tarda em justificar a designação.

Uma classificação injusta. É o mínimo que se pode dizer. Pelo menos na versão geringoncial. Aquela que não percebe a razão de os portugueses não andarem com um sorriso de orelha a orelha. Afinal, os números do desempenho orçamental deveriam ser suficientes para um sorriso coletivo estampado na cara.

O que impede os portugueses de se sentirem tão – ou mais – felizes do que os finlandeses? Aqueles nórdicos que não têm direito ao sol português, mas vivem felizes – 7,63 pontos. Tal como outros vizinhos igualmente obrigados a sofrer as agruras do clima: Dinamarca, Suécia e Noruega. Provavelmente contentam-se com pouco. Como o direito à educação gratuita. Ou à proteção social a todos os níveis etários.

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Como é lógico, os dados do World Happiness Report devem ter incomodado o Governo. António Costa deverá estar incrédulo. Como é possível que Portugal seja o quarto país menos feliz da União Europeia? Mais tristes só a Grécia (5,25), a Croácia (5,31) e a Bulgária (4,93).

Só há uma explicação. Os portugueses são uns ingratos! Não sabem saborear aquilo que o Governo lhes proporciona. Parece que receiam pelo futuro e não desfrutam do presente. Não percebem o significado do carpe diem. Mesmo que no presente haja alguns grãozinhos na engrenagem geringoncial. Pormenores, na ótica costista. Nada que explique as reduzidas manifestações de felicidade.

Certo que houve aquele problema dos incêndios. Mais a mais em duplicado. Uma prova de que à segunda continua a haver quem persista no erro. Também parece que o investimento na saúde talvez devesse ser batizado de desinvestimento. A exemplo do que se passa na educação.

Situações que levam os portugueses, lá no fundo, a terem mais fé nos santos do que nos governantes. Malgrado a condição laica explicitada no artigo 41.º da Constituição, afinal há Santa Bárbara para o caso das trovoadas e, como março está a mostrar, São Pedro ouviu as preces e afogou a seca. Felizmente há uma lista infindável de santos a quem recorrer para sarar as mais diversas maleitas. Aquelas especialidades que só existem num número reduzido de hospitais. Mais fácil recorrer à fé.

Voltando ao Índice de Felicidade, diga-se que o mesmo é composto por seis indicadores: esperança média de vida, apoio social, perceção de corrupção, perceção de liberdade para fazer escolhas, perceção da generosidade e o produto interno bruto (PIB) per capita. Ora, apesar do tão propagado sucesso orçamental, convirá dizer que o último indicador – o PIB per capita – desceu em 2017.

O Dia Internacional da Felicidade coincidiu com o início da Primavera. Em Portugal não choveu, mas o céu esteve nublado e a temperatura pouco aqueceu os corpos. Como o povo diz: o tempo esteve «assim assim». Em sintonia com o grau de felicidade dos portugueses. Por mais que António Costa continue de sorriso aberto. Algo que, ao contrário do sarampo que grassa no hospital de Santo António, não é contagioso.

Professor de Ciência Política