Diz-se muitas vezes que o brincar é “o trabalho das crianças”. Entre o 1 e os 5 anos de idade, o brincar assume-se como actividade primordial e de extrema importância para o desenvolvimento global da criança. É o seu mundo por excelência. A criança brinca com tudo, e, tudo pode ser motivo para brincar.

O Brincar, para além da função recreativa que possui por si só, bastante útil às gratificações que suscitam à criança, possui ainda uma função simbólica importante que contribui para a organização do mundo interno da criança. O brincar, indirectamente, é igualmente uma forma de comunicação. Ao mesmo tempo que traduz o que se passa dentro do mundo da criança, privilegia a interacção e inter-relação com o universo exterior a si – brincar/comunicar com todos aqueles que a rodeiam.

Através da brincadeira, compreende-se melhor o mundo dos adultos, recriando-o por vezes nas brincadeiras, resolvendo nesse lugar do faz de conta até algumas angústias. Aprende-se de forma não estruturada. Socializa-se, no caso das brincadeiras com os outros. Aprende-se a estar só, nas brincadeiras individuais.

O psicanalista Winnicott, em 1971, afirmava que somente no acto do brincar que a criança ou o adulto assumem a sua personalidade por inteiro e usam a sua criatividade. Assim, por esta via, livre e informal, percebemos como acedemos mais a nós, nos conhecemos melhor, expandimos  e aprofundamos até o nosso self.

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À medida que avançamos na idade parece que restringimos a espontaneidade em brincar, assumindo a acepção de uma postura de certa seriedade por considerar tal ser crescido, ser adulto? Sem nos apercebermos, acabamos por ir perdendo uma qualidade tão favorável para a nossa saúde mental. João dos Santos, uma referência passada na área da educação  e da psicanálise em Portugal, dizia que a maturidade consistia precisamente em aceitar aquilo de infantil que cada indivíduo possui. Com a singularidade e inteligência do seu pensamento, foi um grande defensor do brincar. São inúmeras as frases proferidas por ele em relação a este tema. É de ler os seus livros e encontrar o melhor que deixou, de forma tão pedagógica, sobre o assunto.

Claro está, que o adulto brinca quando se permite descontrair, ser desinibido, sempre que adopta uma atitude lúdica, divertida, prazerosa. Brinca a conversar livremente, dizendo o que lhe apraz, rindo, trocando piadas com outros, quando joga desportivamente, quando explora um hobbie criativamente, quando namora, quando descobre coisas novas atrás uma curiosidade natural.

Brincar desperta bem estar. Por isso, ser capaz de fazer uso dessa capacidade que nos é inata é conveniente para a nossa saúde mental e para fazer face a alguns momentos mais difíceis, permitindo-nos assim dar a volta e ultrapassar dificuldades. Não desistir de brincar é sinónimo de não desistir de viver o melhor possível. Sozinhos ou acompanhados, é compensador brincar para todo o sempre.

anaeduardoribeiro@sapo.pt