Outro dia, numa roda de conversa com amigas, o debate girava em torno dos desafios e dificuldades de ser uma mulher numa simples reunião de trabalho. Havia muitas visões diferentes: a de uma amiga que trabalha numa empresa estadunidense extremamente masculina, a de uma que trabalha no mercado editorial, a de uma que trabalha na área da saúde, uma outra que é advogada e, por fim, uma que trabalha no setor bancário.
Uma queixa era geral: ser interrompida o tempo todo por colegas homens e, algumas vezes, também por colegas mulheres. Outras queixas que surgiram: a de preparar e levar uma série de materiais para a reunião e encontrar todos os colegas homens sem nada além do próprio telefone; a de se sentir desconfortável para escolher um lugar ao redor da mesa (por não querer ficar perto demais nem longe demais dos colegas homens); a de automaticamente ser designada como a responsável administrativa da reunião (tomar notas, passar slides, enviar e-mails); a de se sentir excluída de conversas paralelas como futebol, happy hour e outros temas.
Ao longo da conversa, me flagrava refletindo sobre como o simples fato de ser mulher no ambiente de trabalho nos subtrai tempo para tantas outras atividades. Não bastava o fato de ter que encarar todos esses desafios e angústias (e gastar energia emocional com tudo isso), mas também o fato de que uma parcela tão significativa da nossa conversa de bar tratava de um assunto e seria inimaginável num happy hour masculino.
Muitas delas comentavam que, ao tentar questionar esses desconfortos com seus superiores (em geral, homens), ouviram feedbacks no mínimo curiosos. Uma delas ouviu que boa parte das interrupções às suas falas derivavam do fato de ela falar de forma “excessivamente delicada” e que ela deveria aprender a se impor nessas situações. Outra ouviu a mesma justificativa, baseada no argumento oposto, ou seja, que ela falava de forma muito agressiva, sendo a responsável pelo comportamento mais beligerante de seus colegas.
Sobre o fato de se preparar mais para a reunião do que os colegas homens, uma ouviu que ela só fazia isso por vontade própria e que isso até prejudicava sua produtividade em outras esferas. Já a que se queixava de se ver pressionada a executar toda parte administrativa da reunião, ouviu um suposto elogio do seu chefe, dizendo que uma de suas maiores qualidades era ser organizada e que os homens realmente não levavam jeito para isso.
Quando digo que as justificativas eram curiosas, obviamente estou sendo sarcástica. Responsabilizar as mulheres pelas interrupções que sofrem é algo tão estapafúrdio quanto injusto. Chega a lembrar os questionamentos de que roupa a vítima usava para justificar um abuso. Já os outros dois feedbacks para sensações de injustiça demonstram claramente que não existe uma noção real por parte da maioria dos líderes homens de que há, de fato, uma necessidade de produzir duplamente quando se é mulher, como forma de sobrevivência no próprio cargo.
Chego à conclusão de que não existe entonação correta quando se fala em voz feminina. Ou é delicada demais, ou é bruta demais. Também não há, na maioria dos casos, responsabilização masculina nas interrupções e outras formas de desrespeito institucionalizado. Assim como não se percebe que elogiar uma mulher por ser organizada, quando isso reflete numa carga extra de um trabalho subvalorizado, não é um elogio real. Não há, de um modo geral, empatia ou verdadeira percepção de que o ambiente de trabalho não acolhe as mulheres em sua pluralidade e nem se reconhece a evidente carga extra de desafios cotidianos.