No século passado, na década de 40, já Abraham Maslow explicava, através da sua pirâmide, que só quando satisfeita a necessidade básica da alimentação é que se poderia prosseguir com outras realizações pessoais.

Talvez por essa razão, a prioridade que cada país dá à alimentação demostra a sua evolução e a sua ambição futura de sociedade. Demonstrativo desse facto é a importância que cada um dos sete países mais industrializados do mundo dá ao setor da alimentação, bem como ao desafio global que nos está a “bater à porta”, levando mesmo a que o G7 tenha incluido a crise alimentar na sua agenda.

Sem um setor agroalimentar robusto, que envolva todo o território e população, não existe coesão social e muito menos desenvolvimento sustentável. Este setor é altamente empregador (a título de exemplo, nos Estados Unidos da América e em França o setor agroalimentar representa mais de 10% da população empregada) e é responsável por grande parte da ocupação do território.

O desafio que o sistema alimentar tem é enorme – produzir mais com menos, mas de forma segura e saudável, numa população mundial crescente (8.5 biliões de pessoas em 2030) e salvaguardando os nossos recursos naturais.

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Por outro lado é necessário realçar a importancia da economia da alimentação na governança dos paises (segundo dados da USDA – Departameto de Agricultura dos Estados Unidos – em  países desenvolvidos, os gastos por familia em alimentação corresponde a mais de 12% do rendimento familiar).

O peso do setor agro-alimentar no PIB, a sua influência no mercado de trabalho e o seu contributo para o equilibrio da balança comercial, são argumentos suficientes para que qualquer país deva estar bastante preocupado com a situação atual.

E por isso mesmo, Portugal não deve deixar de estar apreensivo com a conjuntura atual, tendo que agir urgentemente!

Recentemente, dados apresentados pelo Eurostat, afirmam que Portugal é o 3º país da zona euro onde o preço dos alimentos mais cresceu. Por outro lado, uma sondagem da Aximagem, há pouco mais de uma semana, mostrava que 68% dos Portugueses já tinham alterado os seus padrões de consumo devido ao aumento dos preços dos alimentos.

Estes dados são inquietantes para um país como o nosso, cada vez mais dependente de terceiros e com níveis de rendimentos per capita bastantes baixos, em comparação com grande parte dos países da União Europeia.

Com o aumento dos custos de produção, o bloqueio na cadeia de abastecimento, a seca severa, o aumento galopante da inflação e as exigentes metas da transição ecológica, podemos estar perante uma inédita crise na economia alimentar em Portugal.

Uma possível diminuição na produção e perda de competitividade em relação a mercados terceiros, irá afetar, claramente, as contas públicas e em especial a nossa balança comercial.

Ninguém tem dúvidas que o setor da alimentação é um dos que mais valor acrescentado aporta à economia nacional, existindo produtos como o vinho que são disso um exemplo, uma vez que traduzem uma relação “end to end” de incorporação nacional, correspondendo a uma mais valia económica muito significativa em termos de consumo interno e no plano das exportações.

Qual seria o prejuizo para Portugal se, por exemplo, na hotelaria e na restauração tivesse que importar a maioria dos bens alimentares transacionados?

Qual seria o valor acrescentado para Portugal se tivesse milhares de  estrangeiros a visitar-nos, mas os nossos empresários fossem “obrigados” a comprar carne, peixe, legumes ou vinho a outros países para alimentar todas estas pessoas?

No fundo estriamos a desequilibrar, ainda mais, a nossa balança de transações e a aumentar exponencialente  o crescimento das importações.

Por tudo isto urge salvaguardar a robustez do nosso setor agroalimentar.

É necessario manter a competitividade e a qualidade da produção de alimentos tradicionais mas, também, apostar  em novas visões alimentares como os insetos e algas que nos permitam liderar o mundo dos “novos alimentos”e fazer deles uma marca nacional, de uma forma ambientalmente sustentada e inserida no roteiro da descarbonização.

O Estado não se pode demitir da responsabilidade de criar instrumentos que permitam aos produtores e industriais do setor uma clara diferenciação em relação ao mercado externo, seja pela inovação e qualidade seja pelo valor perante o mercado global. A nossa vocação exportadora não pode parar, muito menos por falta de políticas publicas que tragam essa competitividade (é incomprensível continuarmos a ter custos nos fatores de produção superiores ao dos nossos vizinhos europeus e ter rendimentos 30% a 40% abaixo dos deles).

Portugal precisa de uma estratégia nacional para a alimentação, que trace um caminho de sustentabildiade e crescimento para o setor agroalimentar e que marque  a nossa diferença no espaço da União Europeia, onde temos de continuar a ser mais competitivos.

A economia da alimentação é muito mais do que números, é uma das melhores formas de demonstração do estágio de evolução de cada país.

E no nosso caso, como é cada vez mais evidente, a situação é cada vez mais alarmante.