Na República Cor-de-Rosa, a realidade tem de se enquadrar nessa cor. A única oficialmente recomendada. A fase que, com demasiada frequência, antecede a imposição do pensamento único. Por isso, quando o grande líder se digna falar, a maioria escuta atentamente a sua verdade.
Foi assim que os cidadãos do Reino, perdão, da República, ficaram a saber que era importante desconfiar de um dos aliados. Não era confiável. Adorava ser protagonista. Dava-se mal com o anonimato. Ameaçava pôr em causa a estabilidade e, obviamente, a realidade cor-de-rosa.
Verdade que alguns conselheiros tentaram lembrar o grande líder da sua responsabilidade. Afinal, o mediatismo das três principais caras do aliado contara com o seu apoio. Pessoal e oficial.
O grande líder fez-se desentendido. O importante era resolver o problema e não preocupar-se com as suas causas. Por isso e para isso havia que mobilizar as hostes e apostar na estratégia adequada.
Por falar em estratégia o grande líder e a sua entourage já tinham gizado uma. Séculos atrás, alguém tinha inventado que era preciso dividir para reinar. O grande líder, na sua República Cor-de-Rosa, ia revisitar o modelo, mas com a originalidade ditada pela conjuntura.
A estratégia passava por algo inédito: valorizar o outro parceiro. Aquele de quem o partido cor-de-rosa sempre tinha desconfiado. Sempre, mesmo. A desconfiança vinha dos tempos em que ambos tinham lutado para expulsar o antigo senhor. Desconfiança que não desapareceu quando tal aconteceu.
O agora parceiro quis tirar partido do maior ativismo oposicionista. A sua intenção passava por se apoderar do país. Confundiu intencionalmente unidade com unicidade. A luta foi exigente. Felizmente o partido dispunha de um verdadeiro grande líder. Com a agravante de a vitória não ter levado o opositor a desistir do seu modelo preferido. Aquele que promete amanhãs que cantam ao mesmo tempo que enche as prisões com aqueles que desconfiam desse paraíso terrestre.
Só que para o grande líder os tempos eram outros. Agora o parceiro estava totalmente controlado. Até tinha perdido a capacidade de organizar manifestações e greves. Tinha sido necessário inventar umas pardaladas para mostrar aos cidadãos a sorte que tinha por dispor de um líder de tal quilate. O único capaz de garantir que as férias continuavam garantidas.
Por isso, a estratégia, tal como todas as decisões do grande líder e respetivos conselheiros, não se discutia. Aplicava-se e ponto final. Malgrado algumas vozes internas que se encarregam de descobrir problemas. Uns alarmistas. Levantaram a hipótese de o partido vir a necessitar no futuro próximo do aliado que agora queria ostracizar.
Valeu ao grande líder o seu proverbial sorriso. A única forma de não se irritar com tal aleivosia. Como é que se atreviam a pensar que não tinha equacionado essa possibilidade?!
A bonomia acompanhou a explicação. Bastava reabilitar o aliado. Quem se habitua ao mediatismo está sempre disposto a voltar à ribalta. O protagonismo cria dependência. Até para gritar que se está contra o sistema. De preferência em horário nobre.
Uma pseudo oposição com que a República Cor-de-Rosa lida bem. Mesmo quando se finge ofendida.