Há duas guerras a serem travadas contra a Rússia. Uma que opõe a Rússia à Ucrânia, e outra entre o Ocidente e a Rússia. Enquanto a primeira se trava no campo de batalha, a segunda trava-se nas chancelarias e nos meios diplomáticos. Nas últimas semanas o Ocidente marcou várias avanços nesta segunda guerra, usando as instituições multilaterais do pós-guerra para a integração das políticas externas e de defesa dos países do campo ocidental contra a ameaça russa.

O primeiro desenvolvimento, a oferta, à Ucrânia e à Moldávia, do estatuto de estado candidato à União Europeia foi primeiro anunciada durante a visita a Kiev de Scholz, Macron, Draghi e Ciucă. Mostrando uma clara vontade política dos Estados europeus no processo de integração da Ucrânia, foi depois secundado no Conselho Europeu de 23 de junho. Este foi um concerto entre a Alemanha e a França no sentido de não deixar o processo ser conduzido pela Comissão.

A clara vontade do governo alemão em garantir um sinal de apoio a Zelensky – depois de este ter condenado repetidamente a Alemanha pelo seu tímido apoio militar a Kiev – foi uma manifestação clara de que a mudança de política externa e de segurança alemã – a Zeitenwende – é uma realidade com impacto também na política europeia.

Mais, durante a reunião do G7 em Munique, a centralidade da relação entre Berlim e Washington na gestão da crise da Ucrânia, e a confiança gerada entre os dois governos durante esta parceria, foi patente. No videoclip inicial da chegada a Munique, a conversa entre Olaf Scholz e Joe Biden segue o mantra de que “devemos permanecer juntos”, e que, ao contrário das expectativas do Presidente russo Vladimir Putin de que a NATO e o G7 se separariam, nós “não o fizemos e não o faremos”.

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Durante a reunião, os países do G7 comprometeram-se a apoiar a reconstrução da Ucrânia e prometeram mais 4,5 mil milhões de dólares para combater a insegurança alimentar, elevando o esforço este ano para cerca de 14 mil milhões de dólares. Apesar das dificuldades em arranjar um mecanismo para contrariar o aumento do preço do gás através de um limite de preços, a reunião do G7 demonstrou que o sistema multilateral que junta os países parceiros dos EUA continua a mobilizar-se efetivamente para contrariar a investida russa.

Por último, a cimeira da NATO que começou esta quarta feira em Madrid, iniciou-se sob o signo do acordo entre os aliados para a adesão da Suécia e da Finlândia. Logo na quarta feira, o Presidente Biden anunciou uma série de medidas de reforço dos compromissos de segurança para a Europa. Washington destacará um quartel-general de guarnição do Exército e um batalhão de apoio no terreno na Polónia – as primeiras forças dos EUA permanentemente localizadas no flanco oriental da NATO. Isto significa um upgrade significativo das forças neste flanco: não apenas batalhões, mas brigadas e divisões inteiras numa base permanente. Às tropas adicionais na Polónia, anunciadas pela Casa Branca, juntar-se-ão novas forças dos EUA na região do Báltico, na Grã-Bretanha, na Alemanha, em Itália, na Roménia e em Espanha. Juntas, representam um aumento de 20.000 tropas em toda a Europa.

Torna-se claro que a Aliança está a renunciar formalmente a limitações sobre o destacamento de tropas na Europa de Leste, sendo agora guiada unicamente pela sua concepção da ‘ameaça russa’. A Rússia como a principal ameaça da OTAN deverá tornar-se patente no novo Conceito Estratégico, e será um guia para a postura de defesa da NATO, o seu foco militar e dos seus investimentos.

Nas duas últimas semanas, as potências ocidentais avançaram decisivamente nas várias frentes de cooperação: política, militar e, com menos sucesso, económica, em face da investida russa. Apesar das dificuldade em apoiar efetivamente a Ucrânia no campo de batalha, na área da cooperação multilateral entre a Europa, os EUA e outros aliados, o Ocidente tenta salvar a ordem internacional, reforçando as instituições que, desde o pós-Guerra, lhe serviram de base.