Em matéria de Segurança Social e pensões, a nossa classe política vive em permanente negação. Na verdade, da esquerda à direita, ouvimos os discursos, as proclamações e lemos os cartazes e chegamos à conclusão de que os nossos eleitos, todos eles, têm um comportamento infantil e irresponsável. São como crianças a quem se diz que pôr os dedos na torradeira queima, mas que só entendem no dia em que fazem a experiência e acabam com os dedos queimados.
Estamos a chegar ao fim da farsa. Mais uma crise económica em cima de outras tantas que tivemos nas últimas décadas e sem horizonte de futuro que se perceba, os dedos estão mesmo a encostar na resistência da torradeira. A inflação acelerou um processo que já se sabia inevitável e os cofres da Segurança Social estão a esgotar-se a uma velocidade alucinante.
Perante isto, o PS, que vive dos votos dos pensionistas, encontra-se num dilema: ou faz de conta que não se passa nada e continua a aplicar a fórmula de cálculo das pensões, levando o sistema à falência em muito pouco tempo, ou altera as regras e garante que durante alguns anos o sistema pode ainda resistir.
Num momento de rara lucidez, António Costa tomou a decisão certa. É verdade que usou um truque para aligeirar o impacto da notícia e, quem sabe, manter a ilusão por mais alguns meses a alguns pensionistas. Mas, apesar de tudo, foi responsável e fez o possível para garantir pensões durante mais alguns anos a mais alguns futuros pensionistas, hoje pagadores de pensões. Fez a sua obrigação, procurando causar o menor dano possível aos pensionistas de hoje que não têm alternativa para encontrar recursos suplementares. Mas, por uma vez, pensou no futuro de um país com cada vez mais velhos e cada vez menos jovens. Não poderá ser acusado neste caso de ter privilegiado a navegação à vista, deixando a fatura para os que vierem a seguir.
Andamos há muitos anos a brincar com o fogo, como se isso não tivesse consequências. E, nos últimos anos, muito por responsabilidade do Primeiro-ministro que agora mostrou ser responsável, linchámos um antigo Primeiro-ministro por ter tentado fazer a tempo uma reforma que agora chega tarde. Passos Coelho sabia em 2015 que se não fizesse nada o dia de hoje havia de chegar. É certo que não tinha a habilidade política do atual chefe do governo, mas tinha a frontalidade de não esconder os problemas aos portugueses. Essa fragilidade valeu-lhe a estocada final de António Costa, mas agora o país já percebe quem dizia verdade na altura. A história irá dizer que Passos Coelho estava certo em 2015 e António Costa aprofundou o buraco das nossas futuras pensões entre 2015 e 2022.
Por tudo isto, não se entende o mais recente cartaz que o PSD colocou nas ruas, anunciando que, em nome da justiça social, o PSD defende nenhum corte nas pensões atuais. Luís Montenegro, que até não se tem estreado mal como líder da oposição, tem de evitar ultrapassar António Costa na irresponsabilidade de um discurso político mentiroso e ilusório. Montenegro foi líder parlamentar de Passos Coelho e, bem, não se envergonha do seu passado. Os nossos pensionistas já passaram a fase Peter Pan e todos os que descontamos para a Segurança Social também. Todos sabemos que o sistema precisa de levar uma grande volta antes que acabe em falência. Mais vale explicar aos pensionistas de hoje que, se não aceitarem mudanças, são os seus filhos que vão sofrer no futuro. Mentir descarada e irresponsavelmente só serve para fazer o barco afundar.
Assim como se entenderam para pensar no aeroporto, Costa e Montenegro bem podiam deixar-se de infantilidades e entenderem-se também em matéria de pensões. Se não o fizerem de uma forma séria e adulta, o novo aeroporto só vai servir para trazer turistas para passarem aqui alguns dias e levar portugueses que vão embora para nunca mais voltar.