Nos últimos dias antes do Ramadão, multiplicaram-se as indignações, avisos, rejeições, exigências e interpelações relativamente a uma quase inevitável ofensiva israelita sobre Rafah.

Este aglomerado urbano fica junto à fronteira com o Egipto e, à medida que no Norte e no Centro de Gaza, as operações israelitas se vão reconduzindo a meras acções de limpeza para eliminar elementos, estruturas e pequenas unidades do Hamas, o que resta do poder militar do movimento islamista (cerca de 10 000 homens) acantonou-se nessa zona.

É o seu último reduto e, fiel à sua táctica habitual, mistura-se e protege-se atrás e debaixo de mais de um milhão de civis, não directamente participantes nos combates.

Rafah assegura também o cordão umbilical por onde circulam, não só à ajuda humanitária à população, mas também, os reabastecimentos que permitem a continuação da vida, movimento e combate dos elementos do Hamas.

Manietar Israel e impedir a operação militar é neste momento o objectivo declarado de muitos actores do sistema internacional.

Do Irão, do Hamas e da rua “muçulmana”, porque a destruição da organização terrorista implica a derrocada da acção estratégica iraniana que visa, em última análise, tornar insustentável a existência de Israel. A mera sobrevivência do Hamas vibraria um golpe fatal na confiança e capacidade de dissuasão de Israel. Para este autodenominado “Eixo de Resistência”, faz todo o sentido a feroz oposição ao ataque a Rafah.

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Também de bastas vozes do Ocidente, porque uma operação deste tipo, implicaria necessariamente um grande número de baixas civis, dadas as tácticas do Hamas, e muitos dos políticos ocidentais que mais veemência colocam nos pedidos, exigências e até ameaças, são de áreas de esquerda, mais preocupados com o pulsar antissemita de muitos dos seus eleitores, do que com a necessidade israelita de neutralizar o Hamas.

É notório o caso da esquizofrénica liderança democrata americana, dividida entre o claro interesse estratégico de ajudar o seu aliado mais fiável no Médio Oriente, e os cálculos partidários internos, face a um eleitorado radicalizado, cada vez mais fanaticamente hostil a Israel.

Algumas lideranças ocidentais nem sequer enfrentam tais dilemas e assumem claramente a hostilidade a Israel, o “judeu” do Sistema Internacional, como alguém já lhe chamou. Casos como a Espanha, Noruega, Irlanda, etc., onde pontificam lideranças desviadas para a esquerda, são típicos deste posicionamento marcadamente antissemita (por tratarem Israel de forma bem mais agressiva do que outros actores do Sistema Internacional), e há até quem verbalize, sem qualquer hesitação, que Israel não tem o direito de se defender, se isso implicar a morte de civis inimigos.

A posição destes actores políticos ocidentais, que o Hamas agradece, como é o caso do governo socialista português, é completamente irracional e só pode ser explicada pelo ódio, rancor, ou medo. Levada ao absurdo implicaria, por exemplo, que para conquistar Lisboa, Madrid, ou qualquer cidade europeia, bastariam 30 homens armados, que avançariam disparando, rodeados e protegidos por 1000 civis, de preferência crianças e mulheres. E ninguém poderia travar esse ataque, porque isso “implicaria a morte de civis.”

E ainda de dirigentes de várias agências humanitárias e da ONU, porque relevam de um antissemitismo estrutural que se consolida na escolha de responsáveis e funcionários, e porque tal operação iria provocar a morte de civis e a impossibilidade de ajuda humanitária. Não por acaso, estes dirigentes, com António Guterres à cabeça, estão profundamente implicados nos escândalos e omissões que permitiram que algumas dessas organizações, como a UNRWA e a WHO, se tenham transformado em agentes colaboradores ou até executores de acções terroristas dirigidas aos judeus. Pretendem obviamente que os escândalos colaboracionistas não sejam totalmente expostos, ou sejam rapidamente esquecidos, e isso é patente pelo facto de em nenhum momento exigirem ou sugerirem a maneira mais óbvia e simples de parar os combates: a rendição do Hamas!

Quanto a Israel, com Ramadão ou sem Ramadão, não pode deixar que o Hamas sobreviva. Seria uma derrota em toda a linha, e seguir-se-ia a paulatina recuperação do terreno e controlo das populações por parte do movimento terrorista, para além da perda de capacidade de dissuasão e a replicação, em todas as suas fronteiras, do modelo vitorioso do Hamas. No fundo, a vindicação da estratégia do Irão, para prosseguir o objectivo abertamente declarado de “erradicar a entidade sionista”.

É também incompreensível que tanta gente se preocupe com o Ramadão e as suas potenciais consequências mobilizadoras, assumindo de forma subliminar e quase cómica, que um país não muçulmano não se pode defender de um ataque de um agressor muçulmano, durante as celebrações religiosas islâmicas. É ridículo, mas

Israel terá pois de erradicar o Hamas e para assegurar esse objectivo, bem como a recuperação do maior número possível de reféns, parece ter apenas duas opções:

  • Um acordo que garanta a libertação dos reféns, o fim do Hamas, o exílio dos seus líderes e a desmilitarização da Faixa de Gaza!
  • A conquista militar de Rafah, caso em que o Hamas perderá as últimas unidades militares, as últimas posições organizadas, o último esconderijo de líderes e reféns, e o seu canal de reabastecimento.

A primeira modalidade de acção é preferível para Israel e para a população de Gaza, já que minimizaria baixas próprias e da população, e o grau de destruição dos objectivos.

Mas para que ela se concretize, a ameaça de invadir Rafah tem de ser credível, tem de colocar pressão sobre o Hamas, no sentido de obrigar os líderes terroristas a perceberem a inevitabilidade da derrota e aceitarem as condições israelitas, o que ainda não fizeram. Os israelitas irão certamente preparar tudo para desencadear o ataque, farão movimentos e fogos, mas um acordo com o Hamas, que fosse ao encontro dos objectivos de Israel resolveria o problema sem evacuações e ataques.

Não é líquido que resulte. Este mesmo racional esteve por detrás do compasso de espera prévio ao ataque a Khan Younis, e não resultou.

O Hamas não vacilou e manteve a estratégia de dar batalha a todo o custo, sempre com a ideia de que os reféns e a pressão internacional levariam Israel a parar a ofensiva e a aceitar os seus termos. A batalha de Khan Younis terminou, mas a estratégia do Hamas não parece ter mudado, apesar da destruição das suas unidades e posições. O Ramadão parece-lhes até uma espécie de bandeira revolucionária que irá levantar o Islão em peso.

Restará então a invasão, para a qual os planos já estão feitos, aguardando apenas pela resolução dos irritantes diplomáticos resultantes das pressões acima descritas, particularmente do Egipto e dos EUA.

Para o Egipto, a principal preocupação é a entrada no seu território de mais de um milhão de palestinianos, entre os quais milhares de combatentes islamistas, ligados à Irmandade Muçulmana. O Egipto não os quer lá!

Para os EUA e o Ocidente, a preocupação é com o expectável número de baixas entre a população civil e as eventuais repercussões nas ignorantes e manipuladas opiniões públicas ocidentais, diariamente servidas por números e imagens cozinhadas e fornecidas pelo próprio Hamas e “jornalistas” simpatizantes da “causa”.

O problema é pois, a evacuação da população, que será ferozmente contrariada pelo Hamas, e a ajuda humanitária, que o Hamas precisa de controlar, para sua própria sobrevivência.

Para onde será evacuada uma tal mole humana, com pessoas que já foram anteriormente evacuadas de outras zonas? E como minimizar o provável movimento de terroristas escondidos no meio dessas pessoas?

As hipóteses não são muitas: ou Khan Younis, ou uma área junto ao mar, sensivelmente à mesma distância de Rafah, (Al Mawasi) ou a zona central de Gaza.

Khan Younis ainda não está estabilizada, já que o controle operacional das forças israelitas é recente. Voltar a meter lá centenas de milhares de pessoas, implicaria coloca-las directamente na linha de tiro e facilitar eventuais tentativas de reagrupamento do Hamas na zona. Alguns civis poderiam ainda assim ser transferidos para as partes mais seguras de Khan Younis, não aquelas ainda insuficientemente consolidadas, nas quais as forças israelitas necessitam de liberdade de acção para neutralizar focos de resistência.

O Centro de Gaza, apesar de mais espaçoso e estar sob controlo israelita há mais tempo que Khan Yunis, é mais longe de Rafah. O movimento de civis exigirá mais tempo e uma logística mais complicada. Além disso também os aproximaria do norte de Gaza, região que os israelitas querem, para já, manter relativamente livre de civis, essencialmente para evitar a tentativa de infiltração do Hamas.

Al-Mawasi pode ser a melhor opção, até porque permitirá a ajuda humanitária por via marítima, mas tem o óbice de não conseguir facilmente acomodar tanta gente.

Quanto ao ataque em si, deverá ser similar ao de Khan Younis. Divisão de Rafah em vários sectores, e limpeza sector a sector, deslocando a população remanescente à medida do avanço. Ataques aéreos intensos e localizados, e movimento de forças terrestres acima do solo, reduzindo as posições defensivas do Hamas e cortando a sua rede de túneis, que serão mapeados e posteriormente destruídos.

A operação de Khan Younis, prolongou-se por mais de dois meses, é provável que essa seja também a duração de um avanço em Rafah, dependendo todavia da maior ou menor morosidade da evacuação de civis.

É isto que irá acontecer, a menos que a ameaça real de invadir Rafah, combinada com o corte dos últimos túneis de contrabando de rearmamento do Hamas a partir do Egipto, obriguem o Hamas a fazer o único acordo razoável que lhe resta: libertar todos os reféns e aceitar que o seu tempo em Gaza terminou, em troca da sobrevivência dos seus líderes, no exílio.

P.S : Uma nota quanto às baixas civis em Gaza: O ideal é que nenhum não-combatente morra, mas os números de Gaza são muito menores do que todos os outros casos equiparáveis. Nas guerras americanas na Síria, Iraque e Afeganistão, a proporção foi de quatro civis mortos para cada combatente, ao passo que a proporção nos combates em Gaza, é de menos de 2 para 1. É importante ainda ressaltar que os números adiantados pelo Hamas, já de si evidentemente falsos, não distinguem entre civis e militares. Se ainda assim os compararmos com os números de terroristas aniquilados por Israel, segundo as fontes militares do estado judaico, teríamos, quanto muito, 18 000 mortos civis. Muitos deles, atingidos pelos próprios mísseis do Hamas (30% dos projécteis caíram sobre a própria população), causas naturais, e assassínios de “traidores” e desertores, pelo mesmo Hamas.

O Hamas exagera também o número de mulheres e crianças, omitindo que as treina e usa para disparar mísseis, emboscar soldados, construir túneis, etc.

O que parece evidente é que a maioria deles morreu por ter sido usada como escudo humano, uma ostensiva violação do direito internacional.