As notícias sobre a proposta do Governo português de criar três novos impostos europeus são, afinal, manifestamente exageradas. O exagero, entenda-se, não está nas benditas ideias, que essas mantêm-se em cima da mesa. O exagero parece estar antes em considerar que há aqui ideias novas. Só que não. As propostas que António Costa estará tão empenhado em levar a Bruxelas no final deste mês não só já fazem parte de um projeto de resolução do Parlamento Europeu de janeiro deste ano, como parte tinha sido debatida pela Comissão Europeia no passado mês de setembro. Outros tempos e já as redes sociais estariam a multiplicar hashtags: ‘por acaso (não) foi ideia minha’…

Deixemos a ‘costa-espertice’ e a originalidade (ou a falta dela) de lado e falemos das tais ideias que Costa defende, mais para provar que está alinhado com a Europa do que inspirado por ela. O objetivo é ter medidas que ajudem a União Europeia, por um lado, a compensar o vazio orçamental que a saída do Reino Unido vai causar; por outro, a reforçar os apoios nas áreas de Defesa, Segurança e Migrações. E o plano passa por, entre várias opções, aplicar taxas a três grandes áreas: transações financeiras, economia digital e economia verde. Dito de outra forma: mais impostos para garantir novas fontes de financiamento, é isto que o governo português está disposto a subscrever (também aqui há nada de novo, certo?)

Tenho dúvidas, porém, de que este seja o melhor caminho para lá chegar. É certo que, com o Brexit, há menos um país a contribuir (a receber também) e isso obriga a descobrir fontes alternativas e a redistribuir o esforço entre os vários Estados-membro. É preciso reforçar contribuições país a país e descobrir o melhor modelo para as suportar sem exigir mais aos contribuintes. O próprio Marcelo já veio comentar as necessidades financeiras da Europa.

Mas a fórmula preguiçosa de agravar a carga fiscal, para sacar mais receita em pouco tempo, pode durar pouco e ser contraproducente. Pior: só vai complicar a já estafada e labiríntica burocracia da União Europeia, a mesma que se anda a tentar simplificar há anos e anos. Se é assim que a pretendem reformar, então boa sorte — é capaz de ser mais fácil chegar a Marte ao volante de um Tesla.

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E como explicar a escolha dos alvos fiscais? Anda um governo e os seus ministros a subir a palcos para dizerem ao mundo que a economia digital é uma aposta do país, que as tecnológicas não encontrarão melhor ambiente para crescer do que em Portugal, que os negócios verdes precisam de se expandir. Depois chegam e, surpresa, dão de caras com mais impostos. É isso que se quer?

Ora, quando a estratégia passa por tentar atrair novos investidores e empresas inovadoras, grandes tecnológicas e multinacionais, novas áreas e negócios sustentáveis, não me parece que o discurso das taxas e taxinhas seja o mais convidativo. E não vale a pena vir com a história do bicho papão de que, usando o fisco, se evita que certas plataformas digitais operem de forma ilegal ou se corrige a aparente injustiça das grandes margens de lucro, entre outros argumentos — porque não é com taxas que isto se resolve, é com lei e regulação.

Se o plano do Governo ao acenar com estas (não tão novas) propostas é cair nas boas graças da liderança europeia, está a ir na direção certa — só lhe falta mesmo receber o título de “bom aluno” da Europa (onde é que já ouvimos isto?). Mas, neste momento-chave da União Europeia, António Costa tem uma oportunidade de fazer chegar ideias novas, verdadeiras propostas de reforma, criar ruturas, de discuti-las com os decisores, fazer valer a influência portuguesa de que ele próprio tanto se gaba. Será capaz disso? Ou vai, simplesmente, representar a rábula do bom aluno, prestável e obediente? Ou, pior, armar-se no aluno cábula que prefere socorrer-se das ideias dos outros como se fossem suas para passar no exame?

Ainda sobre as revelações de Adolfo Mesquita Nunes.

Janeiro de 2014. António Simões era, aos 38 anos, presidente de um dos maiores grupos financeiros do mundo, o HSBC, em Londres. Numa entrevista ao Diário Económico, o banqueiro português falou então de quase todos os temas, incluindo do seu casamento. A homossexualidade “para mim nunca foi um tema. A única diferença é que em vez de dizer ‘a minha mulher’ digo ‘o meu marido’”, explicou.

O assunto, aliás, já deixara de ser assunto na sua vida há muitos anos, como já deixara de ser também para todos os que conviviam com António Simões, fosse na esfera privada, fosse no mundo da alta finança. E, por isso, acredita que a orientação sexual nunca condicionou o seu percurso profissional. Mas houve um momento em que o banqueiro percebeu a importância de partilhar esse lado privado: “muitos ainda precisam de alguém que lhes dê autoconfiança para que não vejam o tema como um problema. As pessoas têm mais confiança em mim, porque se sou honesto com algo que é difícil de partilhar também o serei em outros temas. É muito mais fácil ser honesto.”

As recentes revelações de Adolfo Mesquita Nunes e, já antes do vice-presidente do CDS, de Graça Fonseca, atual secretária de Estado, sobre a sua homossexualidade estão a contribuir precisamente para que este tema deixe de ser tema, como explicava António Simões. Não é para que o tema seja desvalorizado, mas sim para que tenha a mesma importância dos outros temas. Porque já não devia ser preciso um homem ou mulher afirmarem publicamente as suas orientações sexuais para se destacarem ou receberem rótulos de coragem pelas posições assumidas. A sociedade portuguesa ainda não chegou a esse ponto, em que a declaração de um deputado, um governante ou um empresário sobre a sua homossexualidade deixa de ser notícia. Mas ficou agora mais perto disso.