Dizia-me um amigo inglês a trabalhar há várias décadas numa agência europeia em Portugal que, se perdesse o seu emprego agora com a crise, não saberia o que fazer. A sua função é eminentemente técnica e numa área muito específica. Pelo que sei, ainda bem que não perdeu, mas leva-nos à questão: está a nossa força laboral preparada para este embate, seja na mudança para teletrabalho, redução de faturação ou mesmo desemprego?

As competências técnicas – hard skills – são essenciais no desempenho da nossa função, mas quando falamos de trabalhar com pessoas e adversidade, entram em cena as soft skills, ou seja, as competências não técnicas. Contam-se entre elas, a comunicação, a negociação, a resiliência, a criatividade, o pensamento crítico, a resolução de problemas, a coordenação com os outros, a gestão do tempo, etc. Antes da pandemia, o World Economic Forum elegeu muitas destas competências como essenciais para 2020.

Quando enfrentamos esta pandemia, uma das competências importantes para lidar com ela é a resiliência. O que é resiliência? É a capacidade de “bounce back”, isto é, de recuperar de um trauma ou período difícil e voltar para a saúde ou bem-estar original. Numa altura como esta, é essencial que as empresas e o governo, não só possam prover com dinheiro, mas também com ferramentas que ajudem as pessoas a lidar com as dificuldades e as treinem para as que aí vierem. Como dar o peixe e a cana de pescar. Por vezes tem mesmo de se dar o peixe, o mínimo, mas se ajudarmos as pessoas a lidar com a adversidade, melhor ficarão equipadas para o futuro e tratá-las-emos como agentes capazes de mudar a sua vida e a dos outros.

Os hackathons de tecnologia em tempo de Covid-19 têm sido um excelente exemplo de resiliência. E o que são “hackathons”? Os hackathons são concursos de ideias lançados a startups, as quais desenvolvem projetos para resolver os problemas mais complexos. Não são coisa nova, mas em tempo de Covid têm aparecido muitos e focados na criação de impacto social. Tive o prazer de participar como mentor e especialista em resiliência e recursos humanos em dois; um, o maior hackathon alguma vez realizado online (e offline), o #EUvsVirus, e o Oxford Global Shapers Policy Hackathon, ambos procuraram dinamizar a criação de ideias para combater os vários problemas que nos coloca o Covid-19. O primeiro juntou de forma completamente remota mais de 20,000 pessoas e organizações. Iniciativa da Comissão Europeia, muitas equipas constituíram-se de forma completamente remota ad hoc, sem se conhecerem de lado nenhum, milhares de pessoas de todos os continentes, de graça, a oferecer o seu conhecimento, experiência e voluntarismo. Todos engenheiros, PhD, MBA e profissionais de elevado nível. Saíram daquele concurso variadíssimas ideias, a maioria delas baseadas em tecnologia ao serviço das pessoas. As que tive o prazer de mentorar foram — apenas para nomear alguns — desde uma app para melhorar a resiliência pessoal, até um projeto de empowerment de mulheres desempregadas na Roménia; uma aplicação que, baseada em machine learning, permite otimizar o uso de ventiladores por toda a Europa; uma plataforma de financiamento de PME para o Reino Unido. Foi uma experiência muito gratificante e deu-nos esperança no meio da adversidade. Através da resiliência, colaboração e criatividade podemos resolver os maiores problemas.

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