1 O ataque ao lucro une as extremas esquerdas à direita populista. O que André Ventura afirmou sobre os lucros dos bancos poderia ter sido dito por Mariana Mortágua e pelo Raimundo do PCP. É a velha inveja de quem ganha dinheiro. Como pode o Chega pensar numa coligação com o PSD com este tipo de discurso económico? Obviamente, não pode. Uma coligação de direita que precise de fazer reformas económicas em Portugal, de reforçar o sector privado e defender as empresas não resistiria um ano ao populismo económico de Ventura.

Eu defendo os lucros dos bancos. Beneficiam agora da subida dos juros, mas durante mais de uma década enfrentaram juros muito baixos. Mais importante, os lucros não resultam apenas da subida dos juros; também são o resultado da boa gestão dos bancos portugueses. A Caixa tem uma equipa de gestão com uma qualidade fora de comum para o banco público (longe vão os tempos de Vara e de Santos Ferreira). O Santander Portugal é um banco com uma gestão de excelência, tal como o BPI. Apesar de uma estrutura acionista complicada, o BCP também está muito bem gerido. E até o Novo Banco, contando com a ajuda do Estado (e dos outros bancos), está a recuperar de um modo positivo.

Comparem os bancos portugueses com alguns dos bancos italianos, suíços, franceses e alemães. Em Portugal, não há um Credit Suisse, nem um Monte di Pasche, nem alguns dos bancos dos Lander alemães. Em Portugal, já se devia ter aprendido que a economia beneficia de bancos sólidos e bem geridos.

Além disso, não compete aos bancos fazerem política social. Isso compete ao governo. Por que razão ninguém pede ao governo para distribuir alguns dos lucros do Estado com a subida da inflação? Podem usar esse dinheiro para ajudar as famílias com mais dificuldades. Os bancos ajudam a sociedade com os impostos que pagam. Tendo lucros maiores, pagam mais impostos. Ninguém acusa os bancos portugueses de fugirem aos impostos. Ou seja, são cidadãos corporativos exemplares. A obrigação dos bancos de pagarem um contributo especial por causa do aumento dos lucros seria um imposto extraordinário, e injusto, a caminho da nacionalização. Os bancos portugueses precisam de continuaram a serem geridos de um modo competente, de dar lucros para atrair investimento externo de qualidade.

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2 Vamos agora até França, onde as manifestações contra o aumento da idade da reforma também mostram uma coligação nacional socialista entre as extremas esquerdas e a extrema direita. O caso francês é verdadeiramente espantoso. É um dos países da União Europeia com a idade de reforma mais baixa (62 anos). Macron pretende aumentar para os 64 anos, ficando ainda atrás da Alemanha (66 anos e, a partir de 2031, 67 anos, após uma reforma de um governo de esquerda).

Mas há outras diferenças muito importantes entre a Alemanha e a França. A despesa pública em França é 58% do PIB, e cresce todos os anos desde 2011. Na Alemanha, é cerca de 49% do PIB. Em França, a divida pública é de 113% do PIB. Na Alemanha, é de 66% do PIB. Com esta dívida pública brutal, em 2021, a França pagou em juros cerca de 335 mil milhões de euros. É uma quantia chocante.

Quem beneficia dos juros da dívida francesa? Os investidores, muitos deles os chamados ‘hedge funds’, tão atacados e detestados pelas esquerdas. Mas os hedge funds estão apenas a lucrar porque a despesa pública e a dívida pública francesas são muito altas. Quem se endivida todos os anos, precisa de pedir emprestado aos investidores financeiros. Ora, em grande medida, a França endivida-se porque os franceses recusam trabalhar mais anos.

Na realidade, os sindicatos franceses são aliados de muitos especuladores financeiros. A resistência às reformas em França significa mais lucros em Wall Street e na City.