Os governantes europeus estão reunidos. Têm muito para discutir, mas só uma coisa, segundo Angela Merkel, verdadeiramente importa: a imigração. Primeiro no norte da Europa, mas agora também no sul, a imigração está a provocar as maiores convulsões partidárias desde a Segunda Guerra Mundial. Foi aliás a imigração, e não a austeridade do Euro, ao contrário do que se esperava, que provocou a primeira cisão europeia, com um referendo inglês realizado sob a impressão da “crise dos refugiados” do ano anterior. Posto isto, a imigração é um tema ingrato. Por vezes, parece que levantar a mínima dúvida ao direito de toda a humanidade desembarcar na Europa é necessariamente um sinal de racismo ou xenofobia. No entanto, não é preciso ser racista ou xenófobo para ter dúvidas sobre as causas e as consequências do afluxo descontrolado de pessoas à Europa nos últimos anos.

A causa estrutural dessa circulação descontrolada de pessoas é obviamente o desnível de bem estar e de segurança entre regiões muito próximas, como acontece entre a Europa ocidental e a África e o Médio Oriente, ou entre os EUA, o México e outros países latino-americanos. Mas a causa imediata, como se viu em 2015, depois de Angela Merkel ter declarado a Alemanha aberta à migração do Médio Oriente, é outra: a percepção de que as fronteiras dos países ocidentais não estão defendidas e de que quem as conseguir atravessar ilegalmente terá acesso garantido a riquezas e confortos míticos. É isto, e não apenas a guerra, que explica que tanta gente corra tantos riscos através de desertos, rios, e mares. É isto, e não apenas a pobreza, que explica porque há um tão grande negócio à volta do tráfico de pessoas entre a Europa e a África. Enquanto as fronteiras não inspirarem respeito, não valerá a pena discutir políticas de migração, porque a ausência de fronteiras anula quaisquer políticas de migração.

Vamos entender-nos: o problema não é a circulação de pessoas ou a diversidade das populações. A Europa só tem a ganhar com a passagem ou a fixação de pessoas do resto do mundo. Uma sociedade não tem de ser composta de gente toda idêntica entre si, com as mesmas ideias e os mesmos gostos – a maior parte das sociedades europeias, aliás, foram, ao longo de grande parte da sua história, religiosa e culturalmente diversas. Não é isso que está em causa, mas a capacidade actual da Europa para assimilar ou integrar devidamente, sem alarmes ou conflitos sociais graves, o afluxo ilegal e descontrolado de massas de jovens pouco qualificados. É legítimo duvidar dessa capacidade. As economias europeias não têm o dinamismo suficiente, os seus Estados sociais não dispõem dos recursos necessários, e às suas culturas faltam a convicção necessária para proporcionar referências estáveis às novas comunidades. Por isso, a probabilidade de as massas de imigrantes ilegais transformarem a Europa é muito mais elevada do que a probabilidade de serem transformadas pela Europa.

A primeira consequência do descontrole fronteiriço pode ser assim, não uma diversidade saudável, porque enquadrada por princípios comuns, mas divisões e hostilidades susceptíveis de inspirar lapsos generalizados de humanitarismo. Há na Europa demasiadas organizações interessadas em usar os migrantes ilegais para contestar e repudiar tradições ocidentais, tal como há muitos movimentos tentados a explorar o caos migratório para provocar revoltas “nativistas” contra os sistemas políticos. É a esses, como se tem visto, que a crise das migrações melhor serve. Se não queremos ver nascer monstros, não devemos cultivar as suas sementes.

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