De 2012 a 2015, a Associação 25 de Abril recusou-se a ir à Assembleia da República nas celebrações do Dia da Liberdade, por discordar da política de Passos Coelho. Foi uma manifestação da solidez da Democracia. É bom indício quando há Capitães de Abril descontentes com o Governo e a única atitude que tomam é a de não comparecerem num evento. Em vez de golpe, birra.

Desta feita, a polemiquinha foi outra e, em lugar de faltarem, quiseram impedir outros de lá estar: a Iniciativa Liberal foi barrada de participar no desfile da Av. da Liberdade pela Comissão Promotora das Comemorações Populares, que agrega os partidos de esquerda, as intersindicais e organizações como a Associação 25 de Abril.

Ora, tal como de 2012 a 2015, isto é prova de que a Democracia portuguesa está bem robusta. Comunistas e amigos proibirem pessoas de celebrarem em conjunto a Liberdade e a Democracia conquistadas em 1974? Isso não é grave. Grave seria comunistas e amigos obrigarem pessoas a celebrarem a “Liberdade” e a “Democracia” que gostavam de ter instituído em 1974. Pior do que comunistas com mau perder, seria termos aqui comunistas com bom ganhar.

Era sinal de que vivíamos numa daquelas democracias avançadas onde os cidadãos são forçados a participar em desfiles de homenagem ao regime. Como as paradas chinesas e soviéticas em que toda a gente tem de estar presente a gritar “vivas!” ao Grande Líder. E a abanar bandeirinhas (previamente aprovadas pelo Partido, claro) em coreografias sincronizadas, que são de facto espectaculares quando assistidas, através da televisão, no conforto do lar convenientemente situado numa democracia ocidental.

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Tratam-se de celebrações em que desatam todos a bater palmas e depois ninguém tem coragem de ser o primeiro a parar, não vá um compatriota mais zeloso denunciá-lo por dissidência. São aplausos intermináveis, que fazem um algazarra tal, que os pássaros, desorientados, caem do céu. E as pessoas não se conseguem proteger, porque as mãos estão em chaga de tantas palmas e magoa menos levar com as aves nas fuças do que nas mãos. Portugal podia ser isto: gente nos Restauradores a apanhar com pombos em cima.

Aborrecido era viver num país em que fossemos coagidos a participar em desfiles. Tal como está, é óptimo. Ninguém obriga ninguém a nada, festeja-se como se quer e com quem se quer. Os meninos da Comissão Promotora não deixam a IL entrar no desfile? Não faz mal, a IL faz o seu. É difícil desfiliar a IL do desfile.

Ao contrário do que pode parecer, a Avenida da Liberdade não pertence à Comissão Promotora. Embora, se formos justos, o paralelismo entre as duas é tão evidente que quase se confundem. E não é por causa da “Liberdade” no nome. É porque, como se vê pelas lojas e restaurantes de luxo da Avenida, são ambas muito elitistas.

Ao fim deste tempo todo, continua a haver quem queira ensinar a festejar correctamente o 25 de Abril. Porque isto de comemorar não é à balda. Não confundamos o festejo da liberdade com libertinagem!

Digamos que é o equivalente ao obstetra insistir em organizar a festa de aniversário do bebé que fez nascer. Bebé que, entretanto, tem 47 anos. Sendo que, em rigor, nem se trata bem do obstetra. É um ajudante do obstetra. Aliás, tecnicamente, não se pode considerar ajudante, é um amigo. Quer dizer, passados tantos anos, já é o filho do amigo do obstetra. Ou seja, temos o filho do amigo do obstetra do 25 de Abril a decidir quem é que pode festejar – e de que forma – o aniversário da Revolução. E a exigir ser ele a apagar as velas.

É um bocadinho estranha, esta vontade de mandar nas celebrações do 25 de Abril. E paradoxal: para quem tem tanta comichão com a propriedade, não há dúvida que adoram ser donos de uma data.