Há uns anos, passei uma semana de férias no Hampshire. (Sim, evidente, rumei para lá para uma peregrinação austeniana pelas redondezas.) Enquanto por lá cirandava reparei que várias escolas privadas, internas e externas, das cercanias faziam publicidade nas revistas locais que ia encontrando. Não eram anúncios vazios, com imagens catitas das instalações e uns modelos escolhidos a dedo vestidos com os uniformes representando os alunos felizes, nada disso. Eram anúncios circunspectos, elegantes, informativos, sem imagens, contidos (à inglesa).

Dentre a informação, tornávamo-nos conhecedores das médias dos seus alunos nos vários níveis de testes de avaliação, a percentagem que seguia para que tipo de universidade (Oxbridge, red bricks, etc.), os tipos de cursos para que entravam as maiores porções de alunos. Apesar de na altura só ter um filho que nem em idade escolar estava, lembro-me de ter ficado maravilhada com tanta transparência e informação. Que melhor ajuda para uma mãe ou um pai escolherem, podendo, a escola ou colégio para a sua prole que todos estes dados?

Não se trata apenas das escolas que têm melhores médias, mas que escolas são boas a preparar para as áreas científicas, quais para as artes, quais para as humanidades, possibilitando escolher a escola mais adequada às competências e perspetivas de futuro de cada criança e adolescente. Tenho para mim que, na maioria das circunstâncias, mais informação é melhor que menos.

Por isto é sempre muito divertido o vendaval anual a cada publicação dos rankings. Os achaques sucedem-se nas contas das redes sociais das personalidades políticas e mediáticas de esquerda, os ataques de nervos são fulminantes, os amuos prolongados. O improvável ministro da educação reconhece-se não aficionado dos rankings. À esquerda não se dão bem com os rankings das escolas, é ponto assente.

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Não espanta que numa época de ódios ideológicos exacerbados os rankings gerem tanto espalhafato. Afinal pelo ar do tempo interessa mais esmagar o adversário político que reconhecer que este até pode proferir algum ponto válido no meio de muita confusão; valorizam-se mais ganhos políticos que a prossecução do bem-comum; histericamente recusam-se propostas válidas e sensatas, e até reconhecer problemas de facto existentes e prementes, apenas porque não são apresentadas no nosso lado político. Se a direita aplaude os rankings, só podem ser demoníacos, asseveram os aficionados da geringonça. Vice-versa noutros assuntos.

À esquerda – que gosta sempre de brincar ao estado omnisciente que decide o melhor para nós – não se gosta que os rankings escancarem as fragilidades de muitas escolas nem que os cidadãos cujos filhos são obrigados a frequentá-las percebam que lhes estão a dar pior serviço pelos mesmos impostos. Menos ainda tolera que, pelos rankings, se reclame maior autonomia para as escolas e maior liberdade de escolha para as famílias e alunos.

À direita também há a deriva da linha dura pedagógica (é como quem diz), que em nome do rigor e da exigência se convenceu que no ensino de crianças e adolescentes tudo deve ser mensurado. A direita, que devia ser individualista, também tem quem apaixonadamente defenda a padronização do ensino, como se todos os alunos fossem uns autómatos que quando não respondem a papel químico são uns casos perdidos que mais valia deixarem de estudar cedo e irem para as obras ou parecido. Isto tudo no meio de retenções, muitas retenções. Como se as crianças não fossem os tais seres únicos e irrepetíveis com potencialidades que um sistema demasiado quantificado extermina.

É uma pena que no meio de tanto azedume ideológico se perca a real utilidade dos rankings: a de dar informação às famílias. Diria eu que transparência, escrutínio e ajuda à decisão das famílias são obrigações do prestador e regulador da educação. Alguém duvida que os rankings põem pressão em governo e autarcas para atender a problemas das escolas do fim da lista? Deveríamos até, nós, pais, ter mais informação sistematizada sobre cada escola. Tipo de formação do corpo docente, anos de ensino, universidades e cursos para que seguem os alunos, rácios de professores e auxiliares por aluno, um longo etc..

Estes dados dão toda a informação sobre uma escola? Claro que não. Estejam descansados: as famílias percebem que não é o mesmo ensinar uma criança com pais funcionais e altamente escolarizados, livros a rodos em casa, dinheiro para enriquecedoras atividades extracurriculares ou lúdicas, com vocabulário rico adquirido desde o berço – ou ensinar uma criança vinda de uma família disfuncional, pobre, filha de pais com educação incipiente.

Por outro lado, e por muito que custe à esquerda, também entendem que o ensino público não anula as diferenças sociológicas de base. Em todo o caso, há escola que se diferenciam positivamente face a outras com alunos semelhantes, o que levanta interrogações. Sobretudo, para grande sangrar de corações de esquerda, e ao contrário da vox populi de antes da publicação dos rankings (tenho idade para me recordar), não há o fator mágico redentor do público arrasar em qualidade o privado. Este mito foi definitivamente destruído e à esquerda ainda não fizeram luto por tal crença falecida.

Regresso às escolas inglesas. Churchill, quando fez o exame para Harrow, deixou-o em branco, como conta em My Early Life. O aluno medíocre de então tornou-se o homem decisivo que resistiu às tentativas de negociar um acordo de paz com Hitler quando a situação britânica era desesperada e, assim, determinou a segunda metade do século XX. O episódio está retratado no filme Darkest Hour, baseado nos imperdíveis livros de John Lukacs Five Days in London e The Duel.

Parece-me, não obstante a utilidade dos rankings, que se perdeu esta capacidade de ver os alunos para além de meia dúzia de categorias e medições. Atualmente o mau aluno Churchill seria relegado para a prateleira dos falhados. Os rankings são importantes, mas q.b..