Se é exacto que António Costa já sabia que Guterres estava destinado a voos mais altos do que a espinhosa presidência da República Portuguesa e que já havia dado a entender ao antigo Reitor da Universidade de Lisboa, Sampaio da Nóvoa, que a candidatura presidencial deste último seria apoiada pelo PS, esquecendo-se porém de informar a direcção do partido; se tudo isso é exacto, é difícil imaginar pior gestão política para o partido e para o candidato. Enquanto isso, Guterres foi à romaria de Évora, o que também não deve ter ajudado às campanhas socialistas…

Neste momento, entre os candidatos que se declararam e aqueles de quem se fala à boca cheia, à esquerda como à direita aliás, o eleitorado já conta mais de uma dezena nomes, mas tudo o que se pode dizer acerca das actuais candidaturas presidenciais é isto: os que querem não são queridos e os queridos não querem… Como já aqui foi mencionado: «De um cenário – vigente há alguns meses atrás – em que a eleição do candidato apoiado pelo PS se apresentava como muito provável, passamos para uma situação em que tudo está em aberto». E não só ao nível das presidenciais, mas também das eleições legislativas, para as quais já só falta cerca de meio ano e estão hoje mais abertas do que nunca, sobretudo depois do estrondoso desaire do PS na Madeira.

Como pano de fundo, junta-se a exasperante situação da Grécia desde que o Syriza e os seus parceiros tomaram conta do poder. Qualquer abertura que pudesse vir daí para a badalada «reestruturação da dívida», com que sonhavam os economistas do PS e do enxame de mini-Podemos que zumbem à volta dele, a «reestruturação» não só não se materializou como está mais afastada do que nunca. Próxima está, sim, a saída da Grécia da zona euro, que esperemos não se alargue ao seu afastamento da UE de forma a evitar uma deriva geo-estratégica anti-europeia.

Repito pela enésima vez: a Grécia não é Portugal, infelizmente para ela. Talvez o PCP o fizesse, mas não é nosso PS que iria pedir «batatinhas» aos russos se ganhasse as legislativas, coisa que já esteve mais perto… O PS socrático já foi à Venezuela e a Angola, e viu-se no que deu! O que ninguém percebe é como a Grécia, com muito mais tempo do que nós e a Irlanda, muito mais dinheiro emprestado e com um perdão da dívida pelo meio, não conseguiu um ajustamento mínimo das suas contas que lhe permita hoje ir buscar dinheiro aos mercados a juro negativo? Como é que a Grécia terá perdido 25% ou mais do PIB quando Portugal perdeu 5% ou 6% durante o resgate? Mais: como é que a Grécia já tinha, finalmente, a economia a crescer no fim do ano passado e o Syriza veio deitar tudo abaixo em três meses?

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O sombrio cenário grego não deixará de pesar sobre as «chances» da chamada «esquerda democrática» em Portugal e o desapontamento das oposições sente-se ao longe. Ficaram sem modelo, desde o PS histórico até ao extenso catálogo de arrependidos da «direita» que se associaram à brigada do ressentimento contra o actual PSD e a quem a comunicação social deu abrigo em tudo quanto é jornal e programa televisivo. Já há vários embriões de partidinhos inteiramente fabricados na mídia e na internet, assim como candidatos a candidatos…

Porém, essa mesma comunicação social, conhecida hoje por antecipar cada vez mais doentiamente a realidade, sobretudo se lhe cheira a esturro, não irá largar o «osso» das eleições, sejam as presidenciais como as legislativas, fabricando e demolindo candidaturas umas após outras. O resultado dessa catadupa de notícias, onde se misturam o verdadeiro e o falso, o provável e o boato, é uma desvalorização crescente da vida política e dos seus agentes. É isso que está a acontecer cada dia que passa com a presidência da República, que foi transformada em mera passagem de modelos, em especial modelos televisivos: «Apareces logo existes»!

É significativo, aliás, que tendo os partidos da coligação governamental, que continuam a ser o bloco político mais importante do país real, recusado dizer uma única palavra sobre as eleições presidenciais, as quais dependerão certamente mais do resultado das legislativas do que da cara dos candidatos, a eterna comunicação social já atribuiu ao PSD pelo menos três candidaturas (Santana, Marcelo, Rio), nenhuma das quais representa, que se saiba, o partido liderado por Passos Coelho, o qual tem mantido perante estas provocações mediáticas um silêncio de ouro. É caso para acreditar que falará melhor quem falar por último.

E é por estas e por outras que, apesar de isso não ter a mais remota hipótese de ver a luz do dia, sugeri no meu último comentário uma reforma política e eleitoral no sentido, não de acabar com os partidos, mas sim de dar de novo as cartas políticas, redistribuindo os cargos e conferindo poderes e contra-poderes por forma a democratizar a democracia, e a assegurar aquilo a que os velhos teóricos chamavam o limiar das maiorias (presidencial, parlamentar, senatorial, governamental, regional e local), as quais nunca devem ter poder de mais!

Rectificação: Por erro, escrevi que o novo PR a eleger em 2016 não poderia dissolver a AR nos primeiros 6 meses do seu mandato; segundo a Constituição, isso só acontece nos últimos 6 meses. É a AR (a eleger em data a marcar entre 15 de Setembro e 15 de Outubro próximos) que não pode ser dissolvida constitucionalmente nos primeiros 6 meses da sua eleição.