A realização de ensaios clínicos é um motor de geração de valor tanto para o País quanto para o sistema de saúde, contribuindo para melhorar a qualidade dos cuidados de saúde. Em Portugal, estamos a trilhar o caminho certo?

Segundo dados recolhidos pela APIFARMA junto das suas associadas, os ensaios clínicos trouxeram para Portugal um investimento direto de mais de 230 milhões de euros, entre 2019 e 2022. Sendo números interessantes, não deixam de estar aquém do potencial do País.

Como pode, afinal, Portugal receber mais ensaios clínicos? A primeira resposta passa por perceber que trabalhar em ensaios clínicos não é um part-time. Não é algo que a maior parte dos profissionais de saúde tenha capacidade para fazer, além das muitas tarefas que já tem no seu dia a dia associadas à prática clínica. Para ser competitivo, é necessário ter recursos, ter capacidade para fazer cumprir os tempos de revisão e a assinatura dos contratos, ter certificação de técnicos, entre muitas outras questões. Pensar ciência, escrever protocolos, realizar candidaturas e obter financiamento são processos muito morosos e sempre com a possibilidade de serem infrutíferos, exigindo uma equipa dedicada.

E essa equipa dedicada só existe em centros exclusivamente vocacionados para a investigação clínica. Portugal precisa de mais centros, sem dúvida, mas já tem alguns de grande qualidade, reconhecidos, sobretudo, no estrangeiro. Aqui, está à vista uma melhoria clara: a cooperação. É necessário estabelecer sinergias entre os profissionais de saúde dos centros de saúde e hospitais, onde são observados números elevados de doentes, e os centros de investigação clínica dedicados, de forma a podermos, em conjunto, cumprir os prazos, apresentar números maiores de recrutamento e atingi-los. Só assim será possível colocar Portugal no mapa dos ensaios clínicos, com benefício inequívoco para os utentes, comunidade científica e o País.

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Sabemos que a indústria farmacêutica é a grande dinamizadora de ensaios clínicos a nível mundial e é altamente provável que assim continue. No entanto, seria essencial que se assistisse a um crescimento também dos ensaios clínicos da iniciativa do investigador, pensados por académicos, com objetivo de avaliar a prática clínica real, estudando novas indicações para uma molécula já aprovada e extraindo informação clínica fundamental para responder a respostas concretas que se colocam aos clínicos diariamente, muitas vezes não respondidas pelos estudos da indústria, que são mais dirigidos.

Os ensaios clínicos são conduzidos para testar a eficácia e segurança de novos tratamentos, mais eficazes e inovadores, com geração de conhecimento científico valioso e benéfico para a saúde da população em geral. Desta forma, o conhecimento baseado na evidência decorrente dos ensaios clínicos permite aos médicos e profissionais de saúde tomarem as melhores decisões para um doente em particular. Através deste trabalho, podemos ter acesso a medicamentos inovadores ainda não disponíveis comercialmente, com maior benefício no caso de doenças raras ou potencialmente fatais, cujos tratamentos experimentais ainda não estão disponíveis de outra forma.

A realização de ensaios clínicos envolve uma série de atividades, como recrutamento de doentes, avaliação clínica, monitorização e análise de dados, atividades que geram empregos e estimulam a economia local. Ensaios clínicos de alta qualidade poderão, inclusive, atrair investimento estrangeiro, de empresas farmacêuticas e de biotecnologia, bem como gerar empregos no setor de saúde, sendo um estímulo à economia. E, claro, e mais importante do que tudo, contribuir para mudar a vida de muitos doentes.