O ensino superior português tem qualidade reconhecida internacionalmente, universidades, politécnicos e escolas não integradas só podem ministrar cursos acreditados pela A3ES, ela própria acreditada e reconhecida por organizações internacionais, pelo que o assunto nem merece discussão.

É verdade que a possibilidade de se fazer sempre melhor e se subir nos rankings é um facto, faz parte das ideias matriciais dos processos de gestão da qualidade, mas isto não nos pode inibir de defender nacional e internacionalmente a qualidade do nosso ensino superior e a possibilidade de o transformar num “produto de exportação” com significativo impacto no PIB do país.

Há instituições que já o vêm fazendo, e com sucesso assinalável, mas é um campo ainda quase inexplorado em termos de massificação e que constitui uma das mais importantes possibilidades para impulsionar o desenvolvimento de todas as nossas instituições de ensino superior, não só das maiores, normalmente nos grandes centros, mas também das mais descentralizadas e interiores, onde a captação de estudantes nacionais é cada vez mais difícil, à medida que o seu número diminui.

Com duas ou três exceções, e excluindo os estudantes Erasmus que não entram nesta categoria, promove-se sobretudo a vinda de estudantes dos PALOP, por razões linguísticas, mas, com a exceção do Brasil, o poder económico dos estudantes dos outros países lusófonos é muito limitado.

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Em muitos casos ocupam vagas não preenchidas por portugueses, em cursos financiados pelo erário público em instituições estatais, pelo que são os contribuintes portugueses a pagar, o que é discutível, assim como tratar-se de um processo que distorce a concorrência e prejudica gravemente as universidades, politécnicos e escolas independentes privadas.

Olhar para o ensino superior nesta perspetiva implica, de imediato, duas coisas: pensar em oferecer cursos em inglês, goste-se ou não é atualmente língua de estudo e trabalho em todo o mundo para todos os que se relacionam internacionalmente, mesmo nos países que rejeitam a cultura “ocidental, e promover uma política de vistos que crie uma “via verde” para os estudantes que sejam aceites nas instituições nacionais.

Ora a política de vistos para estudantes é altamente restritiva, burocratizada e desrespeitadora dos interesses dos estudantes e das instituições de ensino que oferecem cursos internacionais e profundamente discriminatória para os que são oriundos de certos países, o mais emblemático dos quais é a Índia.

Recordemos que o nosso atual primeiro-ministro tem raízes familiares na Índia, mas nem isso tem funcionado como elemento positivo no estabelecimento de um fluxo de estudantes indianos para Portugal, pois obter um visto em Delhi é um processo absolutamente kafkiano e, naturalmente, demorado.

E porquê referenciar em particular a Índia? Porque é conhecida a capacidade intelectual de muitos indianos e a disponibilidade económica de famílias que não podem mandar estudar os filhos para Inglaterra ou para a Austrália, para dar apenas dois exemplos bem conhecidos, mas que podem procurar em Portugal ensino superior de alto nível a preços muito inferiores aos que se praticam naqueles países.

Acresce que Portugal tem uma indelével relação histórica com a Índia, desde 1498, quando Vasco da Gama aportou a Calecute, e continuamos a ter uma forte presença cultural nas zonas que dominámos até ao século XX, particularmente em Goa.

Finalmente, a Índia tem uma população em forte crescimento, será muito brevemente o país mais populoso do mundo, e nós estamos a perder população e estudantes nativos pois, como é amplamente reconhecido, a taxa da natalidade é tão baixa que não permite repor as gerações e, se não quisermos caminhar para a miséria generalizada dos velhos portugueses, temos de nos abrir decididamente à imigração para que haja quem sustente a Segurança Social.

Obviamente, que a Índia é apenas um exemplo que consideramos elucidativo pela dimensão daquele país e ligação histórica com Portugal, mas o processo de captação de estudantes internacionais deve ser aberto a todo o mundo, com a enorme vantagem de inverter o atual ciclo de perda de massa crítica portuguesa formada nas nossas escolas e que emigra, passando-se a uma fase oposta, estudantes que vêm para cá estudar contribuindo para aumentar o PIB do país, podendo muitos por cá ficar concorrendo para o desenvolvimento de Portugal e da Europa.

Este processo deve estar intimamente associado a um outro que lhe é complementar, a captação de imigrantes qualificados através de políticas ativas de estímulo à contratação internacional.

Se nos distanciarmos do debate político quotidiano, pobre e falho de estratégia, e olharmos para o mundo e o futuro é imperativo para o desenvolvimento do país e para inverter o empobrecimento e a perda de população que se captem capitais e investidores internacionais e que se contratem trabalhadores e quadros qualificados que, em conjunto com os portugueses, contribuam para a modernização e evolução do quadro produtivo e da sociedade.

A captação de estudantes internacionais é um dos elos da cadeia que pode catapultar o país para uma nova fase de desenvolvimento e prosperidade, pois aumenta o retorno económico e o PIB e contribui para a fixação de novos “portugueses”; por outro lado, estimula a fixação de imigrantes qualificados, indispensáveis para alavancar os setores mais modernos e dinâmicos da economia portuguesa.

A má notícia é que, sem uma nova política de vistos para estudantes ou, pelo menos, sem uma revisão positiva do processo de concessão será impossível ajustar a oferta e a procura no timing certo, prejudicando estudantes, instituições e a economia do país. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o Ministério da Economia e o Ministério dos Negócios Estrangeiros têm de se entender e estabelecer uma “via verde” de vistos para estudantes que nos permita mudar a realidade em muito poucos anos.

A boa notícia é que as instituições estão cada vez mais abertas e interessadas em se abrirem a este processo, apostarem em formações em inglês ou noutras línguas e contribuírem para a criação de um novos cluster que pode vir a valer tanto ou mais que alguns dos setores tradicionais de exportação.