Apesar do tom convencional da comunicação social portuguesa, há sinais que fazem crer que a Rússia está a levar a melhor na guerra contra a Ucrânia e não é impossível que esta venha a terminar em breve com a vitória desse ditador sem ideologia propriamente dita que é Putin, o qual mistura a grandeza atribuída à Rússia de outrora com os restos soviéticos das bandeiras com a foice e o martelo agitadas sempre que é assinalada a vitória numa batalha.
Nos “media” portugueses e não só, muitos intervenientes também já dizem o mesmo ou parecido, lamentando o resultado expectável desde o início com menor ou maior convicção, para não falar de aprovação, conforme sucede com alguns opinadores nacionais que têm estado a torcer pela Rússia… sem excluir apoiantes do governo PS que juram o contrário mas sempre intervieram no sentido de a guerra acabar de vez! Isto sem esquecer a página inteira de Sousa Tavares no «Expresso» da semana passada onde o autor exibe a sua antipatia pelos Estados Unidos e a NATO.
Era isso que a Rússia pretendia ao ameaçar com o nuclear desde o primeiro minuto da guerra: provocar o pânico! Obviamente, por muito que os Estados Unidos, a Inglaterra e alguns membros da NATO desejem resgatar a Ucrânia do ataque russo, Putin e a sua equipa tinham razão ao pensar que os «países capitalistas» não iriam tão longe… É muito provável que os países ocidentais tomem novas medidas contra alguns dos membros do antigo bloco soviético mas não se vê o que poderá a NATO fazer contra a ameaça nuclear… É isso que dão a entender muitos comentadores nacionais, enquanto os jornais têm remetido a guerra para as páginas interiores.
Em compensação, Teresa de Sousa, que tem escrito as melhores páginas em Português sobre a guerra, publicou há dias um artigo centrado na política da UE frente à invasão russa, mostrando como será difícil uma política de guerra para a qual a UE não foi feita.. A própria promessa da entrada sem data da Ucrânia e da Moldávia na União revela ter pouco peso no imediato. Simultaneamente, a autora mostra como a abertura à entrada sucessiva de países incapazes de se integrarem plenamente na UE sem entrarem em crise, acabou por ultrapassar as suas finalidades.
A guerra não era e continua a não ser a finalidade da UE, como se viu desde o início, quando se confirmou a entrega de interesses económicos alemães decisivos à Rússia. Merkel descartou totalmente as dimensões políticas nacionais e internacionais daquilo que fez e é em vão que Van der Leiden procura agora colmatá-las sem o conseguir. A Rússia de Putin é mais parecida com a de Staline do que com um país desenvolvido e democrático.
Com efeito, são os próprios investigadores de origem russa quem tem confirmado o facto de a esmagadora maioria da população russa nunca ter vivido num país democrático antes, durante e depois do «comunismo»… Por atrasado que seja, até Portugal conheceu alguma liberdade política desde meados do século XIX e uma parte do século XX até agora. A Rússia não! Daí os regimes ditatoriais e os novos problemas internacionais. Conforme Putin calculou, a ameaça nuclear fez o resto enquanto a «opinião pública» russa se cala quando não se regozija a mando do ditador.
Se assim é, os Estados Unidos e a Inglaterra estão objectivamente impedidos de bloquear a Rússia enquanto esta continua implacavelmente a arrasar a Ucrânia e os países limítrofes, como aliás a China já fez e ameaça continuar. O que poderão fazer os países ocidentais se a Rússia, a China e o resto das ditaduras formarem um bloco nuclear contra a NATO? O desafio de Putin é total e o mínimo com que se contentará será todo o Leste da Ucrânia.
Neste sentido, o que podem fazer os apoiantes da Ucrânia contra os «falsos pacifistas» que o PCP e os seus símiles fingem ser? A tendência habitual da Inglaterra e dos Estados Unidos era a de colonizar e, ao mesmo tempo, ir paulatinamente desenvolvendo os modos de produção e consumo das próprias colónias consoante convinham aos colonos, até elas se tornarem mais ou menos independentes, como a China e a Índia… Com o desmantelamento dos acordos monetários de Bretton Woods em 1971 e o recuo da «globalização», os novos termos-de-troca internacionais fomentaram o crescimento de parte dos países como a China e não só, abrindo o caminho a um relativo regresso à auto-suficência, o que implicou certo tipo de fechamento associado à presente crise económica coincidente com a pandemia e agora a guerra… Daí a actual situação, especialmente em países longínquos da fronteira russa, como Portugal, Grécia, Itália e não só, onde a «opinião pública» está minada pelas crises locais e pende cada vez mais para a pretensa «paz».