É preciso que a economia cresça para os salários crescerem, mas o crescimento dos salários faz também crescer a economia.”

A frase é de António Costa. Se é verdade que o crescimento da economia fará aumentar os salários, ter mais dinheiro dinheiro na carteira também fará crescer a economia. Não há dúvida que somos pobres e grande parte dos portugueses tem um rendimento baixo para fazer fazer às suas despesas mensais. Entre pagar casa, vestir, calçar, alimentar a família e conseguir uma vida com alguma folga financeira, todos temos a consciência de quanto deveríamos de facto auferir.

O consumo é feito de acordo com o rendimento, e hoje sabemos que há cortes nos orçamentos familiares que não permitem ser-se verdadeiramente digno.

A nossa economia, fraca na produção em valor acrescentado, não está a criar emprego de forma sustentada e as nossas empresas, na sua maioria pequenas empresas, estão de alguma forma impedidas de pagar salários de forma conveniente.

Porém, o estado sabe que o peso dos impostos nas famílias é exagerado e não os quer reduzir.

Se há uma grande parte da população activa que não paga IRS pelo facto de auferir um baixo valor de salário, há uma outra que paga imposto em excesso.

No entanto, ninguém poderá afirmar que nem todos pagam impostos. A verdade é que entre impostos diretos (IRS) e indiretos (IVA, ISP, IUC…) todos nós pagamos para a alimentar as funções do estado.

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O pagamento de impostos, mormente em sede IRS, por ele ter na sua génese a progressividade, indica-nos que quanto mais elevado for o rendimento mais valor de imposto deve ser pago. Isto significa que a capacidade contributiva de cada um vai sendo maior tendo em conta um maior rendimento.

A questão essencial na problemática do IRS reside no facto de se saber, à luz de uma determinada realidade social e financeira, o que é ou não considerado valor possível de pagar este imposto.

A nossa Constituição não faz referência a valores, só nós diz, no número 1. do Artigo 104, que o imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar.

Já na Lei Geral Tributária poderemos perceber, pelo disposto no número 1. do Artigo 4. (Pressupostos dos tributos), que os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, relevada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património.

Tomemos como exemplo um casal recém-casado, sendo os dois titulares de rendimento de trabalho dependente e sem filhos a cargo.

Supondo que este jovem casal aufere, cada um deles, um rendimento de 1.200,00€ mensalmente, de acordo com a tabela de retenção em vigor cada um dos cônjuges vê desaparecer no seu recibo de salário cerca 168,00€, sendo a taxa de retenção na fonte a aplicar de 14%. Isto significa, que no orçamento deste jovem casal, 336,00€ vão directamente para os cofres do estado em forma de empréstimo forçado.

A pergunta que deve ser feita a quem tem a tutela em matéria de impostos é só uma: quem aufere um rendimento de 1200,00€ é alguém que vive com a dignidade necessária para pagar todos os meses em IRS 168,00€?

A realidade que se vive hoje dá-nos com clareza a verdadeira resposta.

Como atrás referi, a questão essencial deste tema prende-se com saber, com um

elevado grau de certeza sócio-económica, até que valores se pode despender de uma determinada quantia a favor do estado sem comprometer em absoluto alguma dignidade.

No entanto, o que se sente é que não há qualquer sensibilidade na política fiscal para se perceber que até um determinado valor de rendimento, de acordo com o custo de vida, não se pode emprestar dinheiro ao estado, não se colocando se se deve ou não, mas sim pensar se se pode ou não.

Se hoje assistimos a uma grande dificuldade em fazer face às despesas, nomeadamente com os custos do crédito à habitação, onde cada vez mais jovens casais optam pela dação em pagamento, temos um estado que teima em não libertar as pessoas das amarras asfixiantes dos altos impostos praticados sobre o trabalho dependente.

Acordar todos os dias, de segunda a sexta-feira, a saber que todos os meses (neste mero exemplo prático) 338,00€ são para emprestar ao estado é indigno. Este valor, certamente ajudaria em muito ao pagamento da prestação da casa ao banco.

Havendo alguma abertura para se rever o IRS no próximo Orçamento do Estado, é aconselhável pensar-se que há limites que não devem ser ultrapassados. É urgente entender, como diria António Costa, que “o crescimento dos salários faz também crescer a economia”, e se de facto a afirmação é verdadeira, então que se desagrave o imposto sobre o trabalho, para garantir mais folga financeira às famílias.

Nada está a ser feito nesta matéria de forma robusta.

O IRS deve ser alvo de uma profunda reforma, devendo este imposto estar alinhado anualmente com a realidade financeira do país e com verdadeira capacidade contributiva de cada cidadão como é emanado constitucionalmente.

Fugir de forma permanente a esta questão, sem se perceber até onde se pode pagar IRS, é continuar a não perceber nada de impostos e de como eles podem ajudar as famílias de forma a que se consiga uma maior dignidade. Este deveria ser o desafio para o próximo Orçamento do Estado.

Hoje, os escalões de IRS remetem-nos para uma realidade que não é conforme com o princípio da capacidade contributiva, porque estamos a pagar impostos sem ter capacidade financeira para os pagar. As contas são infelizmente fáceis de fazer. Urge perceber isto. É urgente entender a realidade que o país enfrenta e com ela perceber o impacto dos impostos nas famílias.

Temos porém uma certeza: há rendimentos que a vida real nos indica que são baixos e que pagam uma carga fiscal elevada. Que esta realidade sirva para se perceber onde está o erro.

Continua-se, em cada Orçamento do Estado, a tratar os portugueses como números e taxas, porque a única coisa que querem de nós é votos e dinheiro.

Tudo o mais não interessa para coisa alguma, na medida em que o tempo passa e fica cada vez mais claro que só servimos para pagar impostos. A dignidade, essa que se lixe.