Em Portugal continuamos a ter gato por lebre no que toca à transformação digital do governo e das empresas. Podia melhorar e sermos um exemplo a nível mundial. Acontece por falta de estratégia, ou estratégias erradas, que podiam aproveitar uma revolução industrial que não é de evolução linear, como as anteriores, mas exponencial e que afetará todos os sectores.
Em 2018, dei 2,2 voltas ao mundo em avião. Evitei viajar na TAP. A razão é porque não está orientada à satisfação do consumidor e porque há opção.
Em 2017, através da aplicação da TAP, comprei um bilhete de ida e volta para Madrid com partida de Lisboa. Como depois não pude ir na data em que queria, fui comprar um bilhete só de ida para a data que me convinha, e tencionava aproveitar o bilhete de regresso que já tinha pago. Qual não foi o meu espanto quando me apercebi que, não entendo embarcado na data inicial, perdia o bilhete de regresso.
Não vamos discutir a razoabilidade desta regra que não é exclusiva nem é da responsabilidade da TAP, mas é importante frisar que não lhes custava nada na altura da compra do segundo bilhete de ida, terem-me avisado antes de finalizar a compra. Tenho a certeza que o gestor da minha agência de viagens o faria.
Reclamei com a TAP e a resposta foi, resumidamente: “as regras são o que são e nós nada podemos fazer”. Mas a verdade é que as aplicações podem, e devem ser programadas, com regras de negócio que protegem o consumidor. De outra forma um canal digital não ganha a confiança de um cliente.
A TAP, como a maioria das empresas aéreas, que há tão pouco tempo conseguiram ser inovadoras e deixar de ter intermediários para vender bilhetes, parece não estar a aproveitar esta vantagem correndo o risco de a perder de novo para as agências de viagens e as plataformas online.
Também outras marcas nacionais podem fazer mais para acelerar na sua transformação, basta ler os últimos comentários na app store, sobre a aplicação do Pingo Doce:
“Acho que a aplicação seria ainda mais útil se pudesse ser usada em vez do cartão Poupa Mais. Porque não? Torná-la-ia mais versátil e toda a experiência mais prática!”
“Permitir que a app substitua o cartão na caixa, seria uma mais valia. Quanto ao saldo de combustível, deveria indicar quanto está a caducar no final do mês atual e quanto pode transitar para o mês seguinte.
Enquanto estamos a assistir a uma mudança na forma de comprar produtos ou serviços, parece que as organizações não têm como prioridade e urgência, resolver as dores dos seus consumidores, mas sim as dores dos seus sistemas e regras.
Esta situação só mudará de uma vez por todas, quando as marcas, públicas ou privadas, entenderem que ganham maior eficiência, mais lucro ou menos custos.
O que seria ideal?
Ter um assistente do lado de lá, que soubesse todos os nossos gostos e antecipasse as nossas necessidades. O que hoje, é possível com as soluções tecnológicas de Omnicanal, ao dispor das empresas.
Que as empresas deixem o velhinho cartão de fidelização ou vale e fidelizassem clientes através de sistemas orientados às nossas necessidades e na nossa forma de utilizar os telemóveis.
Que as empresas não desperdiçassem o conhecimento que têm, permitindo que as plataformas digitais globais substituam na parte ou na totalidade a sua relação com o cliente.
Que as entidades que detém conhecimento sobre todos nós (big data) melhorem o seu serviço, por exemplo:
TAP.
- Ofereça um serviço, colocando-nos como prioridade, com muitas ou poucas milhas. Não nos enviem sms para ir conhecer o avião NEO; não tenho por hábito escolher um destino ou uma viagem, com base no avião em que voo.
- Ofereçam um serviço tipo Uber à nossa espera no destino sincronizado com o horário do nosso voo.
- Sirvam de plataforma digital e possa usar a aplicação deles junto dos seus parceiros no nosso dia-a-dia.
- E já agora que nos ofereçam um sistema de subscrição, em que pagássemos mensalmente um valor fixo para usufruir de viagens ou de milhas para comprar itinerários ou outros serviços.
Pingo Doce e outros retalhistas.
- Idem com os sms de produtos que não temos o menor interesse. Mesmo com descontos de 99%, ou até grátis, há artigos que não fazem correr para o supermercado.
- Não nos façam usar cartões físicos, que não nos cabem mais na carteira, ou talões que os perdemos.
Governo.
- Vivermos num país com melhor governo digital do mundo até 2025. Um exemplo de governo, onde o estado oferece mecanismos de interacção com o cidadão ágeis, eficientes, transparentes, que nos poupam tempo e dinheiro. Sugestões mais especificas serão tratadas em artigo posterior.
- Vivermos num país que antecipam os impactos negativos da revolução digital, por exemplo sabendo que a minha profissão pode vir a deixar de existir e me propõe formações e alternativas para mudar de carreira antes de ficar no desemprego.
- Vivermos num país que vai repensar a educação dos nossos cidadãos tendo em conta as alterações, oportunidades e ameaças que esta nova era nos proporciona.
- Um mundo digital pode ajudar um país geograficamente pequeno a ser enorme, quem sabe se conseguimos viver cá e com qualidade de vida mais de 15.000.000 de portugueses em 2050.
- Vivermos num país que que fomenta o empreendedorismo e a inovação e é um exemplo numa época em que a inclusão digital, a democratização da informação, a criação de novos modelos de negócio e de soluções colaborativas vão eliminar as fronteiras tradicionais entre países.
Como se faz?
Há vários caminhos, partilhando regras básicas: os donos do negócio, dos serviços, e os donos da tecnologia têm de estar de mão dada com os demais departamentos para construir o futuro em vez de lutar para preservar o passado.
Sendo conscientes que ao entregar parte do negócio a uma plataforma de distribuição, perdemos valor enquanto eles ganham, até eventualmente não precisarem mais de nós.
Devemos utilizar estas plataformas de distribuição sempre que isso não signifique comprometer o futuro, penhorando, a troco de resultados imediatos, um dos bens mais preciosos das empresas: os clientes – no caso do estado, os cidadãos.
Só se consegue com liderança usando as tecnologias que temos ao nosso dispor hoje em vez de fugir delas, fazendo uma análise correta do que é o digital e colocando a experiência do cliente ou cidadão como prioridade.