A net em geral, e as redes sociais e os media online em particular, vivem carregados de haters, odiadores militantes que zelam uns pelos outros com fervor e se ligam com paixão e devoção, para criarem comunidades onde alimentam a sua aversão a tudo e todos.
Nunca como agora estes haters tiveram tanto protagonismo e tanta montra. Fanáticos por luzes e palcos, vibram com celebridades, desmaiam de prazer quando sentem que também lhes atribuem notoriedade e vivem em bicos de pés e à cotovelada a tentarem chegar-se cada vez mais à frente. Existem na sombra, mas aspiram à ribalta.
Muitos destes haters gastam diariamente horas infinitas a ler tudo o que escrevem as pessoas que odeiam. Não lhes escapa uma linha porque sabem que também não lhes pode escapar a oportunidade de terem o seu próprio instante de fama. E têm. Há haters tão profissionais que já têm uma identidade na praça e começam a ser conhecidos pelo nome próprio. Seja real ou inventado.
Um bom hater dos media sabe que tem que ir aos treinos todos os dias e ser um craque para passar a ser nomeado. Começa pelas provas de endurance que o obrigam a ler de A a Z tudo o que é publicado para, depois, estacionar no perímetro dos que têm mais partilhas, mais comentários e mais foco, de forma a poder parasitar estes seus eleitos. É chato ter que ler todos os escritos de gente desprezível aos seus olhos, mas afinal o que é isso comparado com a recompensa da glória de existir? Os outros, que têm menos views ou menos partilhas, não lhes interessam, claro, e a esses demitem-nos liminarmente. Percebe-se o desperdício que seria terem que os ler e seguir, pois nem o melhor hater do mundo consegue estar aos pés de todos os seus ídolos ao mesmo tempo, e há que estabelecer prioridades.
É interessante ver como agem e como se posicionam no mercado estes queridos haters de estimação, sempre presentes, nunca ausentes. Se a sua militância fosse medida com a mesma afinação com que se medem a assiduidade e a performance dos profissionais nas empresas, seriam followers para rebentar todas as escalas. São sempre os primeiros a chegar e os últimos a partir.
O tempo de reacção para um hater digno do nome também não é nada despiciendo. Muito pelo contrário! Senão vejamos um teste ácido: sempre que o cronista desapreciado é publicado fora das horas de expediente, às 5 ou 6 da manhã, por exemplo, o hater tem que estar na parada, desperto e ágil para ser o primeiro a correr e ler, mas acima de tudo, para ser o primeiro a chegar e postar o seu comentariozinho. Se por acaso adormeceu na forma perde a oportunidade de pôr o seu nome em primeiro lugar, e todos sabemos como o podium é vital para este pessoal que gosta de abocanhar presas para lhes tentar passar o fel que corre nas suas próprias veias.
Antes da existência massiva de fanáticos cujo lema de vida parece ser ‘odeio-te mas não passo sem ti’, qualquer pessoa com vida própria diria que não perdia um segundo a ler, a ver ou a seguir pessoas de quem não gosta nem valoriza. Ou pior, pessoas que verdadeiramente desconsidera. Hoje em dia as legiões de haters mostram que odiar, ofender, ultrajar e execrar publicamente é um desporto muito apreciado em todo o mundo.
De tal maneira que foi criado um Hatebook, com manual de instruções e acesso restrito apenas àqueles que vivem apostados em mal dizer, mal querer e mal amar. Esta rede serve especialmente para gente que adora detestar, humilhar, apoucar e destruir. Parece impossível, mas é verdade. Os criadores da rede social que dá pelo nome de Hatebook estabeleceram uma série de princípios e valores (!) que assentam na identificação dos utilizadores e do seu hatefield. “Criamos o Hatebook para facilitar a partilha de informação com os teus amigos e os odiadores à tua volta”. Apresentam um menu extenso escrito em letras miudinhas e remetem os que têm dúvidas para um Dr. Evil que aparece com cara de diabo dos pobres. Uma espécie de caricatura pelintra de um suposto Mestre do Mal.
Se não for uma brincadeira de carnaval é, no mínimo, mais uma realidade fatal para as multidões de grandes solitários que navegam na net sem outras âncoras para além das que lhes permitem existir à custa de terceiros. Poor thing.