Nem Passos Coelho se reinventou, nem a equipa se refrescou, nem os maiores críticos apareceram no congresso, nem os que geraram expectativas as cumpriram ou ultrapassaram. Foi uma missa laranja, numa celebração cabisbaixa. Quem andou a falar com congressistas percebeu que muita gente já não espera grandes novidades de Pedro Passos Coelho. Acham que é fim de ciclo, mas pelo sim pelo não esperam para ver, porque a capacidade de resiliência do líder é grande e a situação política é tão volátil que ele pode regressar ao poder ou pelo menos ir a eleições, isso não se sabe.

O próprio afastou a possibilidade de voltar depressa ao Governo. Diz que o partido tem tempo. Nesse sentido, foi um congresso anestésico. Uma pílula para as dores dos mais magoados com a nova situação política e um tranquilizante para os mais ansiosos.

Passos Coelho pode ter afastado a pressão, mas em Espinho não levou ao partido nem ao país nada de novo. Não se percebe daqui como o PSD se pode diferenciar do que fez nas últimas legislativas. Parece que não aprendeu a lição. Não houve uma única palavra do líder para aquilo que é hoje essencial para o centro-direita. O PSD até pode ganhar eleições em breve, e nem isso é certo se for sozinho, mas nunca terá maioria absoluta sem o CDS. Sem maioria absoluta, agora o que manda é a configuração do Parlamento e a capacidade de entendimento à esquerda. E isso Passos não domina, nem conseguirá alterar, porque com ele o PS de António Costa nunca se entenderá.

Passos Coelho não deu um único sinal sobre como é que o PSD pode sobreviver neste novo mundo. Manteve as ideias que trazia da campanha. Não apresentou uma única linha de força mobilizadora (a reforma da Segurança Social é um apelo antigo e a reforma do sistema político já constava no programa eleitoral). Não basta falar de desigualdades para se tornar mais social-democrata. Nem é suficiente para ter maioria esta manutenção do discurso auto-justificativo do realismo político e económico para explicar a austeridade do passado e a contenção no futuro. Mesmo onde tem razão e tenta fazer pedagogia não chega para virar o jogo.

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Não apresentou uma equipa de combate. Não promoveu à direcção gente com sangue na guelra para a luta política. Os que existem estão no grupo parlamentar, mas não foram promovidos. Quando se diz que Passos Coelho está isolado é isto: tudo mudou à esquerda; à direita o CDS é uma nova realidade cujos impactos no PSD ainda não se percebem; o Presidente da República é outro, da mesma casa laranja mas o mais distante possível do líder do PSD; resta Passos Coelho, com o mesmo tom, a mesma estratégia, a mesma resiliência, a mesma frieza, a mesma teimosia. Em tempo de afectos na política (José Eduardo Martins pediu uma palavra de afecto para os pensionistas e Marcelo ganhou assim), Passos não teve uma única frase mais emocional.

A queda da geringonça, que podia ser a sorte de Passos Coelho, também pode ser o seu azar. Ir a eleições e ter o mesmo resultado eleitoral e parlamentar seria a sua morte política. Esperar e pedir mais tempo, como fez no congresso, também pode fazê-lo perder o partido se mantiver o rumo. Se tiver um mau resultado nas autárquicas — considerando que vai continuar a perder Lisboa e Porto — está condenado. Estar nos sapatos de Pedro Passos Coelho não é fácil. Mas ele também não gosta de contribuir para facilitar a sua própria vida.

Em Espinho também podiam ter aparecido as promessas do futuro. Foram pífias. Salvou-se Paulo Rangel, que fez um discurso inteligente. Em vez de se mostrar crítico do líder, fez um discurso à líder, ou pelo menos no tom que o líder devia fazer. Deu o exemplo: “Olhem que isto é assim que se faz, estão a ver?” Proporcionou uma performance, com uma ligeira dose de populismo com a proposta de tirar o dr. , eng. ou arq. dos documentos oficiais. E é preciso ver que, desde 1985, todos aqueles que se candidataram à liderança do PSD foram líderes: só Paulo Rangel e José Pedro Aguiar-Branco estão fora.

Ao manter-se longe do partido, Rui Rio dificultou mais ainda o que poderia ser um caminho firme. Não se conquista assim o respeito dos militantes e dirigentes. Cavaco, por exemplo, foi apupado no congresso um ano antes de ser eleito. O partido não gosta destas atitudes e a soberba não lhe ficou bem. José Eduardo Martins, que era suposto aparecer como o grande crítico da direcção e enorme esperança para o futuro, também ficou abaixo das expectativas que ele próprio criou. O mesmo para Pedro Duarte. O único que marcou muito bem o terreno foi Pedro Santana Lopes, que sabe muito. Tanto calo: “Keep cool”, disse ele. E agora ninguém avançará para a câmara de Lisboa enquanto ele não desfizer o tabu. Todavia, apesar do anestésico, não parece que o PSD continue lá muito “cool”. O povo laranja sai de Espinho mais nervoso.

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