A minha primeira e muito enfática sugestão de livros para este Natal é a Biografia de Professor Mário Pinto, por Joana Reis (Coleção Biografias Intemporais Timeline, Universidade Católica Editora, com apoio da Fundação Amélia de Mello). O livro será lançado nesta próxima quinta-feira, 15 de Dezembro, na Universidade Católica em Lisboa, com a presença do Presidente da República.
Não é possível resumir aqui em poucas palavras a vida multifacetada de Mário Pinto e as inúmeras dimensões da sua dedicação à causa da liberdade — desde a defesa do Bispo do Porto, ainda sob o antigo regime, à participação activa na famosa Ala Liberal, fundador do PPD e deputado na Assembleia Constituinte de 1975, empenhado defensor da UGT e empenhado fundador da Universidade Católica. [Se me é permitida uma nota pessoal, tenho gosto em recordar o apreço e admiração dos socialistas democráticos Mário Soares e Maria Barroso pelo popular-democrata Mário Pinto].
Um dos aspectos mais marcantes da vida civil, intelectual e política de Mário Pinto tem sido sem dúvida a defesa do princípio da subsidiariedade do Estado face à sociedade civil — em particular a defesa da liberdade de educação. Por feliz coincidência, Mário Pinto proferiu recentemente (em 25 de Outubro) a 22ª Palestra Anual Alexis de Tocqueville do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica (de que foi co-fundador em 1996) precisamente sobre o tema “O princípio da subsidiariedade do Estado — Na comemoração da sua expressa inscrição na Constituição Portuguesa (na revisão de 1992)”. O texto integral será publicado ainda este mês na revista Nova Cidadania 78. E a Alexis de Tocqueville voltarei mais à frente.
Outra feliz coincidência reside na recente publicação, em Setembro, de um livro sobre outro grande defensor da subsidiariedade e da liberdade de educação: António de Sousa Franco e a Liberdade de Educação, obra coordenada por Jorge Cotovio, com prefácio de António Guterres, editado pela Fundação Secretariado Nacional da Educação Cristã. Entre os vários testemunhos incluídos no livro encontra-se naturalmente um de Mário Pinto, além de Jorge Miranda, Eduardo Marçal Grilo e Guilherme d’Oliveira Martins (entre outros).
O tema da subsidariedade está também enfaticamente presente em dois livros recentes de Manuel Braga da Cruz: A globalização, Portugal e a Europa bem como A Democracia e o Estado em Portugal (ambos publicados pela Universidade Católica Editora). “Temos um estado demasiado extenso e centralizado”, argumenta o autor, “que minimiza a importância da sociedade civil.”
Mais surpreendente ainda poderá ser o facto de o princípio da subsidiariedade ser explícita e enfaticamente citado por dois livros recentes de autores norte-americanos: Mathew Continetti em The Right: The hundred year war for American Conservatism (Basic Books) e Francis Fukuyama em Liberalismo e seus descontentes(D. Quixote). Já referi aqui cada um deles com algum detalhe, mas vale a pena recordar que Continetti e Fukuyama estão igualmente preocupados com a polarização da vida política nas democracias ocidentais, em particular nos EUA. Continetti trata sobretudo da polarização na chamada direita, Fukuyama na chamada esquerda.
É importante recordar que os dois autores sublinham a existência de pelo menos duas direitas e de pelo menos duas esquerdas: uma direita contra-revolucionária e uma esquerda revolucionária, por contraste com uma direita demo-liberal não-contra-revolucionária e com uma esquerda demo-liberal não-revolucionária. Os dois autores sublinham que um dos aspectos cruciais que distinguiu a democracia americana desde a sua fundação em 1776 (com a triste excepção da guerra civil de 1861-65) foi a comum aceitação dos princípios constitucionais pelos partidos rivais (tendencialmente dois, um mais à direita, outro mais à esquerda) — princípios constitucionais que ambos reverenciavam como uma espécie de regras gerais de boa conduta (alguns diriam, inspirados por Churchill e Popper, de Gentlemanship).
Isto será relativamente conhecido (embora hoje tenda a ser esquecido por vulgares tribalismos populistas rivais). Mas pareceu-me particularmente interessante que Continetti e Fukuyama citassem explicitamente o princípio da subsidiariedade (uma expressão sobretudo citada na Doutrina Social da Igreja Católica) como um elemento crucial dos princípios constitucionais da democracia americana. Argumentam eles, citando precisamente Alexis de Tocqueville, que o princípio da subsidiariedade do Estado, perante o pluralismo espontâneo e descentralizado da sociedade civil, constituiu desde o início um elemento fundacional do pluralismo tranquilo da democracia americana — por contraste com o “eterno conflito entre Antigo Regime e Revolução” que Tocqueville lamentou na herança da revolução francesa de 1789.
Em suma: votos de Feliz Natal e de boas leituras. (Conto estar de volta a 9 de Janeiro).