Se há um ano alguém dissesse que Marcelo Rebelo de Sousa acabaria por atingir o atual baixo nível de popularidade, poucos acreditariam. Se esse alguém adiantasse também que a isso se somaria Luís Montenegro no cargo de primeiro-ministro e que, mais do que isso, seria o político mais bem avaliado pelos portugueses, não deveria faltar quem apelidasse o orador de alucinado. Acontece que a vida política é, efetivamente, surpreendente. Muda muito em meia dúzia de piscares de olhos.

1 Marcelo Rebelo de Sousa

Recentemente, uma sondagem do CESOP (Universidade Católica), para a RTP, Antena 1 e Público, revelou que, pela primeira vez, este Presidente da República teve classificação negativa: mesmo tendo 60% dos inquiridos dado positiva, 9,4 foi a nota média, numa escala de 0 a 20 (ficando a grande distância do recorde de 16,3, em novembro do primeiro ano do seu primeiro mandato). Embora tenha sido a estreia de uma negativa para Marcelo num estudo daquela instituição, a verdade é que, já em novembro e dezembro do ano passado, respetivamente, as notícias dos barómetros da Intercampus (para CM/CMTV/Negócios) e da Aximage (para JN/DN/TSF) anunciavam que o chefe de Estado era apreciado negativamente pelos portugueses “pela primeira vez”.

O que dizer da sua presidência? Marcelo tem-na desempenhado com um estilo singular, contrastante com os seus antecessores — desde logo aquele a que imediatamente sucedeu. Associamos à atual primeira figura do Estado uma certa disrupção no estilo. Acontece que, quando o carisma mais inovador se rotiniza, a certa altura, deixa de ser inovador e, mais, corre o risco de deixar de ser carisma. Sim, todos sabemos que, por definição, o que é de mais pode cansar. E 10 anos (ainda não completos) já são dose por si só, e isso compreende-se. Não me refiro tanto aos afetos e às selfies, a que as pessoas aderem (e eu próprio aderiria), embora uns e outras, uma vez naturalizados, percam a perceção social de êxtase. Agora, aparecer tantos anos a todo o instante a falar sobre tudo e mais alguma coisa — desde azeitonas e tremoços (não sei se aconteceu, mas é bem capaz de ter acontecido) ao Orçamento do Estado —, ora com o melhor fato e gravata, ora em tronco nu na praia, mesmo que no início fosse espantoso, acaba por se revelar um exagero. Será isto a institucionalização da banalidade ou a banalização da instituição?

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Assim, i) a reiteração dos elementos inicialmente admirados na opinião pública fá-los deixar de surpreender e, por assim dizer, encantar. Quando isso se junta ao ii) surgimento de episódios vistos como reprováveis, então a dimensão de reconhecimento do visado vai decrescendo. Esta segunda via é, provavelmente, a que tem maior impacto na redução da popularidade nas sondagens, com o caso das gémeas, declarações sobre o anterior e o atual primeiros-ministros e a posição sobre reparações às ex-colónias. Além disso, para uns é tido como o direitista que apaparicou o Governo socialista; para outros, como o dissolvente irresponsável. (A bem dizer, não dá para agradar a gregos e a troianos.)

2 Luís Montenegro

Dias antes do empossamento do Governo, escrevi, neste jornal, que Luís Montenegro, apesar da complexidade e da indefinição da situação político-partidária que o esperava, teria margem para conquistar capital político traduzido em reconhecimento dos portugueses se conseguisse desenvencilhar-se dela. Aquele “se” conferia lugar, desde logo, a uma oração condicional. E esta minha consideração partia da premissa de que, quando uma sociedade se depara com um qualquer contexto de dificuldade e incerteza (como são o presente ambiente político e a atual urgência societal em várias áreas), tende a valorizar a figura que der provas de realização consideradas relevantes.

Nos últimos dias, verifica-se que o primeiro-ministro tem dado sinais de desenvoltura, e a já referida sondagem do CESOP dá indícios de que ela tem sido reconhecida pelos portugueses. De facto, Montenegro é, por esta altura, o líder partidário com melhor avaliação: 75% dos inquiridos atribuem uma classificação positiva ao governante, que tem uma média de 11,3 numa escala de 0 a 20.

Apesar de, pelo menos até ao dia 8 de maio, o PS ter tido a proeminência de aprovação de propostas em detrimento do Governo e das bancadas do PSD/CDS — cenário que deixava a AD em maus lençóis na sua própria afirmação política e do qual possivelmente não estará livre —, a verdade é que desde aí o Executivo tem mostrado atividade em vários dossiês.

Assim, o destaque do primeiro-ministro advém de uma sequência de iniciativas, bem como de ir “sabendo vender essas medidas, que é uma coisa a que o PSD parecia totalmente alheio noutras encarnações”, nas palavras de José Manuel Fernandes, que considera que “agora há aqui uma preocupação com o embrulho, que também é importante em política” (E o vencedor é…, Rádio Observador, 24.05.2024). Nota-se também um moderado doseamento da comunicação pública de Montenegro. E constata-se, ainda, tarimba nas suas intervenções na Assembleia da República, como, aliás, Marcelo previu no famoso jantar com jornalistas estrangeiros.