A Mentira – indigência intelectual, ridículo jornalístico e desprezo da deontologia

Janeiro de 2001. George W. Bush acabara de ser eleito, e, antes da tomada de posse, declarara a sua intenção de manter boas relações com «the grecians». Foi uma festa no comentário do New York Times e da opinião «progressista» portuguesa. Depois de Reagan, «um cowboy», «um actor de segunda categoria» – a quem muito se deveu a ruína do império soviético (et pour cause) –, aí estava outro republicano, outro bruto. «Grecians»… francamente! Nem sabe que os gregos são «greeks»!

Depois, alguém explicou que «grecians» é a palavra inglesa para «helénicos», ou seja, o termo não só não brota da ignorância, como é antes uma expressão erudita. Bastava consultar a melhor tradução de Plutarco. Os opinadores cultos meteram a viola no saco. (Era mais um caso clássico de l`emmerdeur emmerdé.)

Foi outro bruto e ignorante, Donald Trump quem cunhou a expressão fake news, mais que notícias falsas, notícias falsárias, o conjunto de falsidades, deturpações e omissões com que certos órgãos de informação tentam tramar os que contrariam a sua cartilha – ou a cartilha dos que servem –, e promover os da sua cor e simpatia – ou da cor e simpatia dos que servem. Quando os factos desmentem as falsidades, calam os factos (veja-se a este propósito a ausência de notícias sobre a situação económica dos EUA). Quando são acusados de mentir e omitir, gritam que criticar os media põe em risco a democracia.

O percurso dos media portugueses ao longo dos últimos anos caracteriza-se pela consistência: consistência no enviesamento pró progressismo estatista, pró politicamente correcto, pró conformista e pró conformador; e consistência na perda de audiências.

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É do domínio da indigência intelectual (e da parcialidade mais despudorada, é claro) a forma como os media portugueses distribuem epítetos de fascista, xenófobo, racista, extremista, ultra, etc., que resultam, afinal, de informações falsas, acusações sem fundamento, citações fora de contexto, absoluta ignorância conceptual, ou da mais medular má-fé. Bolsonaro é fascista; Trump é fascista; Angela Merkel é nazi… Como certa vez Alexandre Franco de Sá titulou certeiramente neste jornal, «fascismo é quando a esquerda quiser». E os media portugueses estão lá para concordar com a esquerda, estender-lhe o microfone, dar-lhe tempo de antena, e transcrever acriticamente as proclamações.

A mais recente manifestação do supremo ridículo jornalístico (e do enviesamento mais obtuso, evidentemente) foi a forma como a maior parte de jornais, revistas, rádios e televisões portugueses cobriram a campanha do candidato brasileiro Jair Bolsonaro, e como acompanharam a sua eleição democrática como novo presidente do Brasil, com mais de 55% de votos. Era como se o Brasil estivesse em perigo, e como se fossem eles, os «jornalistas» portugueses, os seus salvadores.

Depois dos epítetos contra Bolsonaro, depois de instarem os 200 milhões de brasileiros a votarem no PT e manterem o mesmo rumo de empobrecimento, crise económica, insegurança, desemprego, e corrupção, eis que, perante a vitória expressiva de Bolsonaro, os media portugueses entram em modo de choro, ranger de dentes e rasgar de vestes.

O Expresso já proclamara que «votamos contra» (votaram, a sério?!) em «defesa da liberdade e da democracia».

No Público, Rui Tavares afligia-se com a «vaga fascizante» e Manuel Carvalho chorava «um dia negro para a democracia».

A Sic, depois de reunir um painel de quatro comentadores, dos quais três eram adeptos de Haddad, sonhava, pela voz do moderador, com um impeachment do presidente acabado de eleger, e com a «resistência à alteração democrática» acabada de acontecer. Ainda na Sic, Francisco Assis classificava o novo presidente de «brigão» e a sua eleição de «tragédia». [Lembrou-me Álvaro de Campos: Coitado do Francisco Assis, tão isolado na vida depois de criticar Costa, tão deprimido de sensações agora que a geringonça sobreviveu. Coitado dele que num gesto largo, iliberal e progressista foi salvar o Brasil, para ver se alguém se importa com ele.]

Na TVi, Judite de Sousa, perplexa perante tudo como lhe é habitual, consolava-se com a invocação de uns «sectores importantes contra Bolsonaro».

Só Daniel Oliveira, no Expresso, marginalmente, e o Diário de Notícias, marginalmente também, confessavam involuntariamente a fonte das suas penas.

Oliveira caucionava que «os media tradicionais estão em risco». Coisa que, bem-aventuradamente, estão.

E o DN cogitava lamentosamente que o novo presidente brasileiro prometera interromper «o flirt com o comunismo e o socialismo», além de respeitar a Bíblia, a Constituição e a propriedade privada. Coisa que, afortunadamente, ele interromperá, e com respeito disso que tanto dói.

Pouco interessa. O que interessa é que os media portugueses continuarão a salvar o socialismo e o marxismo cultural em Portugal e no Mundo inteiro, como vanguardas heroicas em cujo papel se imaginam. «O ridículo mata», é verdade, mas os media portugueses não se importam, querem senti-lo na pele.

A Censura – a dúvida sobre a autoria das fake news e algumas propostas «democráticas» para calar quem não pensa como eu

Eis uma citação de que vamos rir imediatamente a seguir: «Elegem a mentira como arma política e valorizam mais a percepção que têm do Mundo do que os factos.»

Esta frase é um excerto de uma notícia do Expresso online de 28 de Outubro. Mas quê, estará o Expresso a fazer autocrítica?! Estará o Expresso a criticar a parcialidade dos media portugueses e as falsas notícias oriundas da pequena bolha ideológica em que sobrevivem?! Não. A notícia do Expresso é uma crítica à campanha de Bolsonaro e de outros como ele.

É muito curioso constatar como a esquerda política e jornalística se sentiu ferida com o conceito e a acusação de fake news, brandida com inteira justeza por Trump contra os factoides, as campanhas difamatórias e as falsidades de New York Times, CNN e MSNBC (que ele estenderia aos media portugueses, se os conhecesse e importassem) . É mais curioso ainda verificar como essa esquerda tenta apropriar-se da ideia de fake news para a brandir contra quem a atacou.

A tentativa de virar o bico ao prego não será muito convincente, mas a ideia de fake news tem, quando adotada pela esquerda política e jornalística, um elemento pequeno e sinistro (passe a alusão italiana), que com Trump e outros «desalinhados» não tem.

Trump pode criticar violentamente (e com justeza) NYT, CNN e MSNBC, como Bolsonaro pode criticar violentamente (e com justeza) Globo e Folha de São Paulo. Podem até recusar subsidiá-los, como Bolsonaro faz. Mas não pretendem fechá-los como «medida de defesa da democracia». Já a esquerda política e jornalística sim, quer calar as vozes que a critiquem ou contrariem, nos media e nas redes sociais. A esquerda política e jornalística quer a censura em nome da «democracia».

Veio, primeiro, a Visão, a alertar contra as «redes sociais», acusadas de divulgarem factos, versões e opiniões não autorizadas.

Expresso e Público fizeram-se eco do ataque aos meios que facultam essa informação que eles recusam dar. E as televisões juntaram-se ao coro, pedindo entraves, encerramentos, limites, proibições.

Com clareza cristalina, David Dinis resumiu o que os main stream media desejam: censurar, proibir, calar. Dinis, que dirigiu o Observador, e depois, muito mais adequadamente, o Público, quer calar tudo o que seja «a antítese daquilo em que acredito». Ou, mais claramente, quer calar tudo o que não considera «justificável», nem «aceitável», nem «defensável pela razão», mesmo que 50 milhões de eleitores considerem, ao contrário, que é justificável, aceitável, defensável, razoável, além de necessário e salutar. Em Dinis teríamos, portanto – e tal como Dinis diz de Bolsonaro –, um «evidente candidato a ditador».

O Parlamento português, como os media tradicionais portugueses, parece ter vontade de colocar na agenda o combate às redes sociais. É através das redes sociais, em Portugal, que vimos a saber notícias e desmentidos, factos, dados, protagonistas, que os media tradicionais ignoram ou calam, e que o poder político abomina. As redes sociais são, portanto, um problema.

Com irreprimida candura, Edite Estrela, presidente da Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, explica mais cruamente porquê. Porque «há uma nova forma de condicionar a opinião pública à revelia daquilo que é a mensagem política e o jornalismo».

Compreenderam bem: quando a parcialidade, a desinformação, a omissão, a intoxicação, a mentira da «mensagem política» e do «jornalismo» são desmascarados, devem ser calados e ostracizados aqueles ou aquilo que os desmascara.

O Subsídio – a concorrência como mal e o assistencialismo como remédio

Basta uma alusão, ainda que ligeira, à hipótese, ainda que distante, de concorrência para lançar o Dr. Balsemão, fundador de um grupo de comunicação que é hoje o maior abono de família dos governos socialistas, em sobressalto e agonias. A concorrência, adverte ele, ameaça empresas e empregos. A entrada de novos concorrentes no domínio da televisão, assegura ele, é irresponsável num mercado publicitário restrito.

No Portugal corporativo e corporativista, a concorrência não é tida na conta de factor dinamizador da inovação, da indústria, da comercialização, da qualidade do serviço e da satisfação de utentes e consumidores.

No Portugal corporativo e corporativista, a concorrência é uma ameaça ao estatuto e aos lugares dos que estão.

No Portugal corporativo e corporativista, a Impresa e a Media Capital já gozam do seu subsídio: a proibição administrativa da entrada de novos protagonistas no mercado.

A censura e o silenciamento de quem os combata seria, para os demais media descredibilizados e decadentes, o equivalente dessa proibição. Mas não os contentaria, porque ainda pedem um pequeno complemento: subsídios, propriamente. Foi Bárbara Reis, enquanto directora do Público, quem primeiro sugeriu a ideia que logo encontrou seguidores: subsídios à comunicação social em nome da cultura e do combate à iliteracia; subsídios aos órgãos de informação incapazes de atrair audiência em nome da defesa da «democracia»; subsídios estatais em nome da «independência»; o assistencialismo em nome da «liberdade».

O enviesamento e o ridículo compõem-se, assim, de um perigoso apetite de estatização da informação.

… e sempre a abulia do centro e direita que aspiram ao amor da esquerda

Já o escrevi e repito: se Marques Mendes fosse chamado a comentar a governação de Estaline diria que, do lado positivo, se sente uma grande clareza de decisões, o que é bom para a administração da coisa pública, porque são únicas e unívocas. Para se pronunciar sobre os efeitos para a economia, parecer-lhe-ia demasiado cedo. Já do lado menos bom, diria que se nota a existência de alguns presos e uns poucos milhões de mortos.

Por razões de pensamento ou talvez de pragmatismo o Dr. Marques Mendes fez da equidistância uma fé. Assunção Cristas que poderia ter-se abstido sobre o eventual sentido do seu voto no Brasil invocando o respeito pelas escolhas democráticas de um país soberano, preferiu pronunciar-se: nem Bolsonaro, nem Haddad, assim os colocando, portanto, em pé igual. João Miguel Tavares, Adolfo Mesquita Nunes e muitos outros de direita e centro-direita tiveram os mesmos pruridos, recusando-se a compreender a escolha da maioria do eleitorado brasileiro (ou norte-americano, ou italiano, ou húngaro, ou polaco, ou colombiano, ou inglês).

O centro-direita e a direita portugueses só têm respostas vagas ou pusilânimes para as preocupações com terrorismo, imigração, insegurança, estagnação ou retrocesso económico, ascensão social, liberdade de expressão (contra o politicamente correcto) e económica (contra a servidão do Estado), justiça, responsabilidade, representatividade, herança cultural e tradições, valores morais, nação e interesse nacional. E enquanto continuarem a tratar estes temas com indiferença, platitudes, ou hipérboles, continuarão a ceder terreno e armas ao que chamam «populismo», nem assim conseguindo essa aprovação da esquerda a que tantos parecem aspirar.

Não compreendem, recusam compreender como Jaime Nogueira Pinto compreendeu, que os Bolsonaros são «arauto(s) da revolta popular»; que os eleitorados cansados, revoltados e sem representação, estão dispostos a correr riscos; e que, mesmo que não saibam rigorosamente para onde vão, respondem aos apelos de prudência e conformação: «Só sei que não vou por aí.»

P.S. Para que possa diversificar as suas missões persecutórias, sugiro à matilha portuguesa da correcção política dois novos e apetitosos alvos:

– Jacob Rees-Mogg, membro da Câmara dos Comuns por North East Somerset. Rees-Mogg é conservador, Brexitiano, e tem o humor acerado e o repentismo de um Churchill. Convirá atacá-lo desde já, pois é uma estrela em ascensão. É difícil acusá-lo de ignorância, porque tem uma formação sólida por Eton; ou de estupidez, por ser demasiado evidente a sua inteligência. Mas podem sempre rotulá-lo de elitista, pois usa o inglês shakespeariano da upper class, ou de especulador, pois em vez de estar encostado ao Estado tem meios independentes de fortuna.

– Jordan Peterson, professor de Psicologia e psicólogo clínico. Visto manifestar um nojo inflexível ao controlo estatal do comportamento e da linguagem, convém acusá-lo de machismo, homofobia e outros epítetos disponíveis por aí. Convém fazê-lo escondido e de longe, pois já destruiu em debates públicos as presunções de diversos caluniadores. E, tal como no caso de Rees-Mogg, convém prosseguir na batalha contra a liberdade de expressão nas redes sociais, onde Rees-Mogg e Peterson têm generosa presença.