A existência é caracterizada por um processo não-linear. Como tal, não é de estranhar que a convivência social seja complexa e que se verifique uma tendência para a imitação e repetição. Neste contexto, que dizer do percurso dos políticos como governantes ou oposição? A passagem do tempo até pode exigir decisões diferentes. Contudo, estas dependerão da coerência para serem credíveis. Infelizmente, a regra e a conduta demonstram que os princípios são esmagados pelos interesses. Sobretudo pelos interesses partidários.
Eis o exemplo de dois chefes de governos socialistas. Mário Soares (IX governo), que teve de gerir uma das intervenções do FMI em Portugal, optou por não mentir ou enganar:
- “Quem vê, do estrangeiro, este esforço e a coragem com que estamos a aplicar as medidas impopulares aprecia e louva o esforço feito por este governo” (JN, 28 de abril de 1984);
- “O que sucede é que uma empresa quando entra em falência (…) deve pura e simplesmente falir. (…) Só uma concepção estatal e colectivista da sociedade é que atribui ao Estado essa responsabilidade” (JN, 28 de abril de 1984);
- “(…) política de austeridade, dura, mas necessária, para readquirirmos o controlo da situação financeira, reduzirmos os défices e nos pormos ao abrigo de humilhantes dependências exteriores, sem que o país caminharia, necessariamente para a bancarrota e o desastre” (RTP, 1 de junho de 1984);
Já António Costa, co-responsável pela vinda da Troika (parece que foi enganado por Sócrates), disse que cativações não eram austeridade. Porém, não há memória de um aumento da carga fiscal como o feito pelo XXI governo ao mesmo que tempo que, através das cativações, desinvestia na educação, na saúde, nos transportes, etc.
E agora, qual salvador da pátria, António Costa diz que vai acabar com a suborçamentação na saúde (cuja existência não reconheceu) e louva o excedente orçamental conseguido sem reduzir a despesa.
Como é que um socialista consegue um excedente orçamental? Aumenta os impostos. Quem é que paga o excedente orçamental? Os contribuintes e as suas famílias. E que faz um socialista com um excedente orçamental? Alimenta a grande família socialista. O favorecimento e nepotismo socialista ainda não acabou e passou a abranger empresas com sede em Juntas de Freguesias.
O orçamento de Estado para 2020 (OE 2020) é o exemplo perfeito da gestão socialista: apressada, fictícia e insensata. Mário Centeno afirmou que a carga fiscal não ia subir e que “nunca antes, em democracia, um Orçamento tinha sido feito em tão pouco tempo“. Nem com tantas gralhas, acrescento eu. Em menos de 12 horas, Centeno viu-se obrigado a rectificar o relatório do OE 2020. Ao fazê-lo, Centeno bateu um recorde porque nunca antes, em democracia, um governo tinha substituído um relatório do Orçamento em tão pouco tempo.
Que originou esta troca? A carga fiscal aumentou ainda mais do que o previsto na primeira versão. Ou seja, Centeno mentiu: a carga fiscal vai aumentar para 35,1% do PIB e a receita total do Estado para 43,8% do PIB (aguarda-se a todo o momento que João Galamba venha dizer que o aumento de impostos do OE 2020 é culpa do Passos Coelho).
Não digo que Mário Soares fosse perfeito. Nenhum ser humano o é. Mas, quando comparado com José Sócrates e António Costa, era um mero aprendiz. Porquê tanta mentira e tanto alheamento da realidade? Não é fácil compreender ou caracterizar o comportamento dos dois últimos primeiros-ministros socialistas. E competição entre ambos não falta. Ainda recentemente o homem do cofre voltou à carga.
Em psicologia, «projecção» é um termo utilizado para descrever um mecanismo de defesa pelo qual uma pessoa atribui a terceiros as suas próprias características e/ou motivações; por sua vez «mitomania» é um distúrbio de personalidade que caracteriza uma tendência compulsiva pela mentira sem sentir a necessidade de desfazer o engano.
Os membros do governo são constantemente apanhados na prática de comportamentos reprováveis que demonstram abuso de poder, dissimulação e engano e, sobretudo, desrespeito pelas normas. Infelizmente, este tipo de conduta tem uma consequência dual. Em primeiro lugar, ilude quem o pratica, que passa a considerar-se intocável. Em segundo lugar, transmite um exemplo negativo que será (e já é) replicado por alguns cidadãos.
Somos governados por um bando de mentirosos que se crê inimputável, que promete tudo gratuitamente, que não confia nos outros porque não é de confiança, que exige o que não pratica, que desconhece a legislação portuguesa e que está disposto a exceder os limites da ética, da lei, da liberdade e da privacidade individual para obter o que desejam.
Só com práticas transparentes e honestas e um rumo com ambição que se veja, será possível dar futuro a Portugal. Baseado em mentiras e falsas promessas, o OE 2020 demonstra o contrário.
Em boa hora a Iniciativa Liberal anunciou o voto contra. Em boa hora a iniciativa liberal recusou este Orçaminto que empobrece os portugueses enquanto alimenta um Estado sempre faminto.
PS – Mário Centeno não vê nenhum conflito de interesses em ir para o Banco de Portugal porque não há conflito para os interesses de Mário Centeno