Este artigo é dirigido aos leitores que se consideram de direita e que não sentem qualquer problema nem complexos com isso. Leitores que entendem a vida política nas democracias pluralistas ocidentais como uma competição entre as esquerdas e as direitas. É assim em Espanha, em França, na Alemanha, em Itália, em Inglaterra, na Irlanda, na Bélgica, na Holanda, na Dinamarca, na Suécia, na Grécia, enfim, em todos os países da União Europeia. Por que raio não haveria de ser também assim em Portugal? Depois de mais de três décadas de integração europeia, não somos assim tão diferentes dos outros países europeus.
Tal como nos outros países europeus, também em Portugal, há eleitores que, nas questões dos valores e da família, são mais conservadores e outros são mais progressistas. Os primeiros são de direita e os segundos são de esquerda. Na economia, uns eleitores privilegiam a iniciativa privada e a sociedade civil, e outros são mais favoráveis à intervenção do Estado e ao investimento público. De novo, os primeiros são de direita, e os segundos são de esquerda. Nas políticas sociais, há eleitores que defendem a coexistência de escolas públicas e privadas, hospitais públicos e privados e a liberdade de escolha dos cidadãos. Outros consideram que o serviço nacional de saúde e a educação universal devem ser sobretudo públicos. Os primeiros estão mais à direita, e os segundos mais à esquerda. É fácil e simples. Vivemos em sociedades pluralistas, por isso os eleitores têm preferências e valores diferentes e defendem opções públicas distintas. Mas até agora só falei de nós, os eleitores. Nós somos normais e europeus, uns de direita e outros de esquerda.
Quando chegamos aos partidos políticos, Portugal já não é tão normal nem muito Europeu. Sobretudo o PSD. Eis um partido que é um enigma envolto num mistério. Um partido onde muitos dirigentes não conseguem assumir que são de direita, pelo menos em público. Um amigo meu diz que sempre que um político do PSD tem necessidade de afirmar em público que não é de direita, é porque é mesmo de direita. Mas esse meu amigo é um cínico. Vamos assim levar a sério os políticos do PSD que dizem que não são de direita.
Os envergonhados sociais-democratas incorrem em dois erros frequentes quando olham para a política nacional. Em primeiro lugar, estão convencidos que a maioria dos portugueses são naturalmente de esquerda (o que desde logo é um sinal de que são de direita). Uma convicção absurda. O PSD já teve duas maiorias absolutas. O PS só teve uma. Os portugueses já elegerem dois Presidentes da República do espaço da direita, Cavaco e Marcelo, tantos como os socialistas, Soares e Sampaio. Além disso, o PSD e o CDS juntos conquistaram mais três maiorias absolutas. Perguntem aos comunistas e aos bloquistas se isto é um país de esquerda.
Talvez seja verdade que para a maioria dos portugueses há critérios mais importantes na hora de votar do que a divisão entre a esquerda e a direita. Mas isso não significa que a maioria dos portugueses seja de esquerda. Quer dizer que há muitos portugueses que umas vezes votam na esquerda e outras na direita, como de resto em todos os países europeus. O PSD é grande e vencedor quando é capaz de mobilizar a direita e ir buscar votos à esquerda. Foi isso que Sá Carneiro e Cavaco mostraram.
A recusa da validade da distinção entre a esquerda e a direita constitui o segundo erro dos ‘esquerdistas’ do PSD. Claramente, não entendem o que aconteceu em 2015 com a formação de uma frente de esquerda. A oposição à direita é o que une o PS, o PCP e o Bloco. E estão sempre a atacar a direita para justificar a sua aliança perante os seus respectivos eleitorados. Vejamos assim o delírio em que se encontra o actual PSD de Rui Rio e Paulo Rangel. São atacados pelas esquerdas por serem de direita, recusam ser de direita, mas querem os votos dos eleitores de direita.
Para terminar, vamos falar da relação entre os políticos do PSD que não são de direita e nós, eleitores de direita. O voto pode ser entendido como um contrato entre os eleitores e os políticos que os representam. Sem esse contrato ou seja, sem a eleição, os políticos não têm poder. Os deputados, nacionais e europeus, e os ministros do PSD ocupam esses cargos unicamente porque houve quem votasse neles. A maioria desses eleitores considera-se de direita e seguramente não se revê nas políticas das esquerdas. O que recebem em troca dos seus votos? Sinais de embaraço e de vergonha. Paulo Rangel sabe muito bem que a grande maioria dos seus eleitores é de direita; graças a eles é deputado europeu há uma década. Em democracia, as preferências dos eleitores são muito mais importantes do que as referências ideológicas ou os jogos tácticos dos políticos. Por respeito aos seus eleitores, Rangel nunca deveria dizer que não é de direita. E o mesmo se aplica a Rui Rio e a qualquer outro dirigente do PSD.
Poderíamos perguntar por que razão os dirigentes esquerdistas, ou vá lá centristas, do PSD não temem perder os votos dos eleitores de direita? Porque sabem que entre o PS e o PSD, os eleitores de direita escolhem os sociais-democratas. Ou seja, o voto de direita é tratado como um voto adquirido, pelo qual não é necessário lutar. Talvez seja a hora de mudar. Por isso, ainda bem que a oferta aos eleitores de direita está a aumentar. Em política a simplicidade é uma grande virtude. Rangel e Rio não são de direita. Então os eleitores de direita não devem votar neles. Votem no CDS, na Aliança ou na Iniciativa Liberal. Entreguem Rangel e Rio aos eleitores de esquerda. Para ver o que lhes acontece.