A edição de fim-de-semana do Financial Times de há oito dias contém um debate sobre Inteligência Artificial, edição genética, tecnologia e processamento da informação. Os participantes foram Kazuo Ishiguro e Venki Ramakrishnan. O primeiro foi Prémio Nobel da Literatura em 2017 e o segundo da Química em 2009. Por sinal, o último livro de Ishiguro, ‘Klara and the Sun’ (que não li) consiste numa distopia em que Klara, uma máquina humanóide, é amiga de uma adolescente gravemente doente.

A troca de ideias entre os dois é interessante pois não é habitual que se discutam desafios que ainda não sabemos como se vão apresentar. Ambos levantam questões éticas que contêm a agravante de, quando tal suceder, o mais certo é que nos encontremos numa situação de não retorno, da qual poderemos não conseguir fazer marcha-atrás.

A Inteligência Artificial pode ser extremamente benéfica na medicina e na ciência, mas também perigosa porque construída através da informação que lhe dermos. A questão é clara pois o que as máquinas vão pensar terá por base o que nós pensamos e fazemos agora. As opiniões que temos presentemente serão o combustível que lhes dará força. Se tivermos em conta que o que era assente como correcto e verdadeiro há 100 anos já não é mais; se aceitarmos que a adaptação da nossa forma de pensar aos novos desafios e às novas realidades faz parte do desenvolvimento humano, como será quando a inteligência artificial, nas mãos da qual colocarmos várias e diversas áreas das nossas vidas, não tiver essa capacidade? A escravatura é hoje fortemente condenável (embora ainda se pratique em certos países) quando até há poucos séculos era perfeitamente aceite. É só um exemplo. A pergunta que Kazuo Ishiguro e Venki Ramakrishnan deixam é a seguinte: será que com a Inteligência Artificial os nossos filhos e netos conseguirão questionar o que hoje consideramos indiscutível?

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