Num espaço de tempo relativamente curto, o Presidente da República já avançou e já recuou perante a crise larvar que está a minar Portugal há mais de cinco anos. Desde o «golpe eleitoral» de 2015 que o país está em situação crítica, dependendo de uma aliança nunca anunciada e falsa quanto à unidade de objectivos dos membros de uma «geringonça» meramente oportunista, que apenas tem em mira o acesso aos poderes e recursos estatais. Face ao «golpe» assestado pelo PS vai fazer seis anos, cresce o inquietante afastamento dos cidadãos perante a participação nas sucessivas eleições que temos tido desde então.
Paira, pois, sobre o país uma descrença completa na capacidade do actual sistema partidário produzir soluções positivas para a generalidade dos problemas que o país tem acumulado desde o início do século XXI e que está espelhado, presentemente, na maior dívida pública das últimas décadas! A pandemia, obviamente, não pode ter deixado de agravar a crise e não é a badalada «bazuca», nem tão pouco o regresso dos turistas ou a especulação imobiliária, que vão tirar o país do atoleiro em que o PS e os seus comparsas nos meteram e continuarão a meter enquanto a «geringonça» eleitoral se mantiver. Princípios são coisa que não existe e o único fito do trio é manter-se no poleiro.
Entretanto, o Presidente da República deu vários sinais de visível preocupação com a continuação da crise. Os resultados do chamado semi-presidencialismo, como já sucedera nos dois mandatos de Cavaco Silva, estão à vista: hoje, residem na ocupação tentacular do aparelho de Estado por parte do PS (108 deputados) ao qual basta a co-optação do BE (19) ou do PCP (10) para fazer o que quiser. Em contrapartida, Jorge Sampaio deixou Santana Lopes enterrar-se como era de prever, esperou que o PS substituísse Ferro Rodrigues e em 2005 entregou o poder a Sócrates… com os resultados conhecemos!
No momento presente, o PR há-de estar a pensar que tem tempo e que terá de aguardar a altura ideal para intervir a sério. Esse cálculo é duvidoso. Quanto às autárquicas, não trarão qualquer novidade partidária nem tão pouco qualquer mobilização significativa do eleitorado. Se o clientelismo é a palavra de ordem dominante, imaginemos o que será nas autarquias. Tudo ficará, portanto, na mesma ou pior até 2023 quando o PS for de novo a votos. Não se sabe o que acontecerá até lá mas coisa boa não será. Na realidade, a força do PS reside na fraqueza do resto do parlamento, cujos partidos estão sem opções.
Dito isto, a questão é muito menos ideológica do que possa parecer. Com efeito, não só o leque dos partidos ficou estilhaçado com a emergência do «geringoncismo» como o único partido com votação significativa há dois anos – o PSD – não sobreviveu às manobras sucessivas do PS devido à manifesta incapacidade de Rui Rio para divergir ou para convergir com o PS!
É evidente que o PS não tem qualquer interesse em partilhar os recursos do Estado com o PSD. Prefere açambarcar todos os recursos públicos disponíveis a fim de alimentar o duplo crescimento do partido: os profissionais da política e os eleitores dependentes do Estado: funcionários, reformados e subsidiados. O PS deixou há muito de ser um partido ideológico, se é que o foi, mas neste momento açambarcou todas as alavancas do poder, desde o banco da escola à banca do dinheiro!
Ora, é perante este monopólio do poder oriundo do tempo de Sócrates que se encontra o líder do PSD. O que aconteceu é que o suposto líder da oposição não tem feito outra coisa, como já sucedera na Câmara do Porto, senão exibir a sua falta de adequação ao cargo… Neste ambiente de luta parlamentar em que o PS manda, o BE grita, o PCP goza, o CHEGA berra e o CDS sumiu, o PR dificilmente pode acreditar que a crise em que o país e o tal «sistema semi-presidencial» se encontram não rebentará, como rebentou o delírio socratista que entregou o país à «troika»!
A falta de comparência política do PSD arrisca agravar-se nas próximas autárquicas. Ora, na ausência de uma alternativa partidária, o PR poderá ver-se obrigado a intervir mais depressa do que pensa, sob pena de o aumento dos juros da dívida e da confusão que será a «bazuca» levarem o país a mais uma bancarrota por disfarçada que seja. A presidência europeia do PS não conseguiu esconder a falta de sintonia entre Portugal e a maioria da UE. A crise está portanto para durar. O PR pouco tempo terá para encarar uma intervenção a sério, sob pena de sermos arrastados para nova bancarrota. Não será mais do que o PR italiano fez ao chamar ao poder o antigo presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi!