A 46.ª visita apostólica do Papa Francisco foi ao Grão-Ducado do Luxemburgo e à Bélgica e não poderia ter terminado de melhor maneira, pois foi muito esclarecedora a conferência de imprensa dada pelo Santo Padre, a bordo do avião de regresso a Roma.

Sobre a dolorosa temática do aborto, as palavras do Papa Francisco foram especialmente claras e oportunas: “Não nos esqueçamos de dizer o seguinte: o aborto é um homicídio. A ciência diz-nos que, um mês após a concepção, já todos os órgãos estão formados. Mata-se um ser humano!”

Francisco recordou a especial culpa dos médicos que praticam este tipo de actos. A sua responsabilidade moral é acrescida: sabem, sem dúvida, que estão a exterminar uma vida humana inocente e neles não concorrem as circunstâncias atenuantes que, por vezes, diminuem a culpa da mulher grávida, quando se encontra numa situação desesperada. Francisco, referindo-se a estes médicos, usou uma expressão muito severa: “Os médicos que se prestam a isso são – permitam-me a palavra – sicários. São uns sicários. E isto é indiscutível. Mata-se uma vida humana.” Para o Papa, esta questão é um princípio irrenunciável. Como disse aos jornalistas presentes no avião, “não se discute. Peço desculpa, mas é a verdade!”

Em relação aos direitos da mulher, Francisco foi, mais uma vez, muito claro: “Relativamente às mulheres, elas têm direito à vida: à sua vida, à vida dos seus filhos.” Sublinhou também que, “o que caracteriza as mulheres, o que é feminino, não é determinado por consensos, nem ideologias”.

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A este propósito, o Papa defendeu “a dignidade da mulher”, até porque a Igreja é feminina: “relativamente às mulheres, falo sempre da sua dignidade e disse uma coisa que não posso dizer dos homens: a Igreja é mulher, é a esposa de Jesus”. Mas rejeitou, com igual firmeza, as tentativas de masculinizar a mulher na Igreja, ou seja, de lhe conferir um estatuto idêntico ao do homem, ignorando o que é a especificidade feminina, que também na Igreja deve ser reconhecida e respeitada: “Masculinizar a Igreja, masculinizar a mulher não é humano, não é cristão. O feminino tem a sua própria força. Aliás, a mulher – digo-o sempre – é mais importante do que o homem, porque a Igreja é mulher, a Igreja é a esposa de Jesus.”

Muitas das propostas de promoção da mulher, nomeadamente através da sua equiparação ao homem, esquecem não apenas que, reconhecida a sua igual natureza e dignidade, há que distinguir o que é específico de cada sexo: a condições naturais diferentes, devem também corresponder diferentes missões eclesiais.

Como recordou o Santo Padre, o “ministério mariano é superior ao petrino”. De facto, a Maria foram concedidas prerrogativas que não foram dadas a Pedro: só ela foi concebida imaculada, ou seja, sem pecado original; e Nossa Senhora subiu ao Céu em corpo e alma, como proclama o dogma da sua assunção, graça que não foi concedida a nenhum Papa. A Virgem de Nazaré foi constituída ‘mãe’ de todos os cristãos quando, junto à Cruz, recebeu como filho o apóstolo João; e Pedro, como os demais Santos Padres, representam a paternidade de Deus, de que participam todos os restantes sacerdotes que, por isso, recebem o nome de pai, ou padre (père, father, etc.).

Para o Papa Francisco, citando Hans Urs von Balthasar, “a mística da mulher é maior do que o ministério. Há um grande teólogo que fez estudos sobre isso: é maior o ministério petrino ou o ministério mariano? O ministério mariano é maior porque é um ministério de unidade que envolve, o outro é um ministério de orientação, de guia. A maternidade da Igreja é uma maternidade de mulher. O ministério é um ministério muito mais pequeno, conferido para acompanhar os fiéis, mas sempre dentro da maternidade”.

O Papa Francisco rejeitou qualquer tentativa de, na Igreja, se masculinizar a mulher, equiparando-a ao varão: “Um feminismo exagerado, ou seja, em que as mulheres são ‘machistas’, não funciona. Uma coisa é o machismo, que está errado, outra coisa é o feminismo, que também está errado. O que importa é a Igreja mulher, que é maior do que o ministério sacerdotal.” A mulher é essencial à vida da Igreja enquanto mulher que é, com a mesma natureza e dignidade dos homens, mas também com competências específicas, que a tornam apta para certas missões, e inábil para outros ministérios, como são os conferidos pelo Sacramento da Ordem. Assim acontece também, por exemplo, nas práticas desportivas, onde mulheres e homens competem separadamente.

Há dois mil anos, não faltavam religiões que admitiam sacerdotisas, mas Jesus apenas ordenou sacerdotes os seus apóstolos. As santas mulheres, na paixão e morte de Cristo, deram um exemplo de lealdade, que contrasta com a generalizada infidelidade dos doze, um dos quais foi o traidor e outro o que o negou por três vezes. Contudo, não foram elas as escolhidas para o representarem sacramentalmente, ou seja, para agirem “in persona Christi”. Durante dois mil anos, assim se entendeu e praticou em toda a Cristandade, pois só em meados do século XX algumas confissões cristãs cederam à tentação do politicamente correcto. As Igrejas católica e ortodoxa permanecem firmes na doutrina e tradição evangélicas, de que é fiel depositário o Papa Francisco.

Como era de esperar, nem todos gostaram do que ouviram, mas é decerto chocante que uma instituição, que se denomina ‘católica’, tenha feito seus esses protestos. Com efeito, um comunicado, assinado por professores e alunos da Universidade ‘Católica’ de Lovaina, “deplora as posições conservadoras expressas pelo Papa Francisco sobre o papel da mulher na sociedade”. Ora, como o Papa explicou na conferência de imprensa aérea, “este comunicado foi feito no momento em que eu estava a falar. Foi pré-fabricado, o que não eticamente aceitável”. Em declarações à imprensa, uma aluna de 22 anos, Valentina Hendrix, disse que ela e algumas das suas colegas tinham ficado chocadas, porque a mensagem do Papa reduzia as mulheres “à missão de ter filhos, ser mães e esposas, tudo do que nos queremos emancipar.”

Agora, como há dois mil anos, o discurso cristão provoca aplausos e adesões, protestos e rejeições. Há mulheres que se querem emancipar da sua condição feminina, que é a da mais perfeita criatura humana, Maria, virgem e mãe.  Talvez esperassem que o Papa estimulasse essa sua alienação, mas o Vigário de Cristo na terra não tem outra missão que não seja a de dar testemunho da verdade (cf. Jo 19, 35).