Os casos de Tiago Cunha e Miguel Alves, tão sobejamente conhecidos da opinião pública que me escuso aqui de entrar em pormenores, revelam que o PS já não está preocupado com a imagem. Aquilo que a outro partido causaria um justo embaraço ou repulsa, o PS trata como mais um caso entre tantos. Já não causa estranheza ou admiração chegar a um cargo de confiança política sem CV que se veja, auferindo um salário com que muitos podem apenas sonhar ou entrar no governo sendo arguido num caso de prevaricação, tentando passar um atestado de estupidez a todos com os argumentos mais ridículos de que alguém se pode lembrar (“existe um preconceito com Caminha” referiu Miguel Alves). Este é o “novo normal socialista”.

Com a acusação que pesa sobre o anterior primeiro-ministro socialista José Sócrates, o PS tremeu e duvidou de si mesmo, o poder parecia uma miragem depois da bancarrota e com a sua principal figura a braços com a justiça, num processo sem fim à vista. A chegada ao poder de António Costa através do acordo de incidência parlamentar com o BE e PCP e a actual maioria absoluta deram ao PS a ideia de que na verdade podem fazer tudo: distribuir lugares, ignorar a justiça e usar o Estado como se fosse o seu quintal que nunca isso os prejudicará nas urnas. E o pior é que provavelmente tem razão. Estes casos não embaraçam o PS, antes pelo contrário, ajudam a passar a ideia de controlo e poder que intimida quem lhes faça frente. É absolutamente dramático que o cartão do PS seja hoje quase condição obrigatória para qualquer jovem de 21 anos ganhar mais de 3000 euros limpos por mês, algo que deveria estar ao alcance dos melhores dessa idade fosse em empresas privadas ou mesmo no Estado, porém a realidade é que não está. Não existem muitos recém-licenciados a ganhar esses valores porque a carga fiscal asfixiante que temos assim não o permite. O PS habituou-se a esta ideia de ser o livre-trânsito para a ascensão social. Hoje a mobilidade social não está nas escolas, está no largo do Rato.

O que se espera dos partidos da oposição é que, ao mesmo tempo que denunciam a captura do Estado pelo PS, apresentem as suas propostas para o futuro do país e como nos poderemos livrar desta camisa de forças imposta pela maioria socialista, a próxima revisão constitucional será uma excelente oportunidade para isso.

Aos partidos do espaço não socialista pede-se audácia nas propostas. É urgente acabar com a visão socialista da sociedade, latente na Constituição actual, e perceber de uma vez por todas que os sectores social e privado podem e devem ser encarados como parceiros na prestação de serviços nas áreas da saúde, educação e justiça, entre outras, permitindo desta força um acesso verdadeiramente universal a esses serviços, podendo o prestador ser público ou não, o que interessa é que as pessoas tenham o serviço que precisam a tempo e horas a um preço que o país possa pagar.

Os partidos do espaço não socialista também estão agora, mais do que nunca, obrigados a dar o exemplo no campo da ética e da meritocracia. Não é possível apontar o dedo e fazer o mesmo, os lugares não podem continuar a ser distribuídos pelos mais leais ou por aqueles que levantam menos problemas, independentemente do CV que apresentam. Se o centro-direita quer voltar ao poder tem que fazer diferente. O país está a ver.

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