Exmo. Senhor Bastonário, Exma. Senhora Directora,

Dirijo-me a vós, enquanto autoridades máximas (do ponto de vista técnico, e não político) de saúde do nosso País.

Tenho tido conhecimento da vossa preocupação com o vírus SARS CoV-2 e a sua doença, a Covid-19. Tenho seguido atentamente a miríade de recomendações que têm emitido e proferido. E não encontro resposta para algumas perguntas que tenho.

O que faço?

Quando, no Inverno que se avizinha, eu tiver doentes sem o dito vírus SARS CoV-2, mas mesmo assim com necessidade de uma cama de internamento, e não houver nenhuma disponível (o que já começa a acontecer e ainda agora começou o Outono), faço o quê?

E como encaro as camas vagas e sem ninguém nas enfermarias exclusivas para os doentes com um teste positivo para o vírus SARS CoV-2, enquanto este meu doente se encontra em condições desumanas numa maca qualquer, num corredor qualquer, num Serviço de Urgência, dias a fio?

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O que faço?

E se, em vez de uma vaga e de cuidados dignos numa enfermaria, este meu doente, que tem um teste negativo para o SARS CoV-2, tiver necessidade de um ventilador e de uma cama de cuidados intensivos e não houver nenhuma, nem no meu hospital nem nos outros (como já tem acontecido) e houver múltiplos ventiladores e camas livres, limpinhos, disponíveis, com médicos e enfermeiros à espera, mas apenas para os doentes com um teste positivo para esse vírus?

O que faço?

Deixo morrer o doente, por a sua doença não ser causada pelo vírus que dá direito a ter uma porta aberta no nosso SNS?

Ou admito o doente negativo para o SARS CoV-2 numa cama vazia e disponível, mas exclusiva para os doentes da Covid-19, desrespeitando todas as vossas recomendações e as normas do meu hospital, acarretando sozinho essa responsabilidade?

Sento-me no chão, braços a envolver as pernas encolhidas, a chorar com força por viver numa época e num País em que a anormalidade é a nova normalidade, e em que as autoridades de Saúde e a minha Ordem são dirigidas por pessoas incapazes de verem para além do seu próprio medo e ansiedade?

O que faço?

Desisto de me preocupar, coloco vendas nos olhos para não ver, e sigo em frente como se nada fosse?

Grato pela vossa atenção, aguardo uma resposta célere, com os meus melhores cumprimentos,