Certamente que não é o aparecimento de umas Forças Armadas Europeias fortes na fronteira que levou Vladimir Putin a apoiar a iniciativa de Emmanuel Macron nesse sentido, mas o desejo de enfraquecer a Aliança Atlântica e os laços militares entre a União Europeia e os Estados Unidos.

“Em princípio, a Europa é uma formação económica potente, uma forte união económica e, em geral, é perfeitamente natural que eles (União Europeia) queiram ser independentes, auto-suficientes, soberanos na esfera da defesa e da segurança”, declarou o Presidente russo durante a sua passagem por Paris, onde participou nas cerimónias do fim da I Guerra Mundial, acrescentando que. “em geral, se trata de um processo positivo do ponto de vista do reforço da multipolaridade do mundo”.

À primeira vista pode parecer estranho que o dirigente de um país que se considera um “castelo cercado e acossado por inimigos” defenda o aparecimento de umas forças armadas fortes ao longo das suas fronteiras ocidentais, ou seja, daquelas que os militares russos consideram as mais sensíveis. A julgarmos pelo poderio económico, pelo número da população de ambos os lados e pelo desenvolvimento tecnológico, a Rússia teria de concorrer, se os membros da União Europeia tivessem os mesmos anseios e planos militaristas dos russos, com um adversário bem mais forte e poderosa do que ela.

Então o que leva Putin a apoiar uma iniciativa tão perigosa (do ponto de vista do Kremlin) para o seu país?

Ele fá-lo por várias razões. Tendo em conta as actuais atitudes negativas de Donald Trump face à NATO e as difíceis relações entre Washington e Bruxelas, Moscovo espera que a ideia lançada por Emmanuel Macron conduza ao enfraquecimento das relações no campo da segurança e da defesa entre os Estados Unidos e a União Europeia e, por conseguinte, à redução da capacidade de intervenção e ao definhamento da Aliança Atlântica.

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Outra das razões prende-se com o facto de Vladimir Putin ter conseguido minar a União Europeia com políticos por ele apoiados ou até mesmo comprados. (Verdade seja dita que, por vezes, o autocrata russo não precisa de se mexer para provocar graves e profundas divisões na UE, aproveitando apenas a ascensão de populismos no seio do Velho Continente e as divergências crescentes na UE.)

Este factor transforma já a criação de umas Forças Armadas Europeias num processo quase utópico tais são as divergências existentes entre os numerosos estados-membros. Não obstante tratar-se de um objectivo nobre e positivo que poderia dar um novo impulso à integração europeia e constituir mais um passo para a federalização da União Europeia.

Além de mais, o dirigente russo sabe que a maioria dos membros da União Europeia não quer gastar meios financeiros na criação de umas Forças Armadas paralelas às da NATO. Isto a não ser que deixem de financiar a Aliança Atlântica, o que seria um erro trágico para os europeus e mais uma vitória, desta vez grandiosa, da política externa russa.

É preciso ter em conta que a ideia de afastar a Europa dos Estados Unidos não é nova na Rússia. Ela foi fomentada pela União Soviética logo a partir do momento em que terminou a Segunda Guerra Mundial e foi criada a Organização do Tratado do Atlântico Norte. Essa foi, durante muito tempo, uma das reivindicações dos partidos comunistas da Europa Ocidental. Os “eurocomunistas” desistiram mais tarde dessa ideia mas, no caso do Partido Comunista Português, continua a fazer parte do seu programa político.