Retomando o tema da minha crónica da passada segunda-feira, volto ao encontro de Praga que teve lugar a 7-9 de Outubro. O anfitrião foi o Forum 2000, uma instituição fundada por Vaclav Havel em 1996.
Não seria possível resumir aqui os debates que ocorreram em mais de 50 painéis, muitos em simultâneo. Mas talvez valha a pena recordar alguns aspectos das reuniões de trabalho que decorreram na terça-feira — e que sobretudo reuniram muitos dos que, no ano passado, subscreveram em Praga o apelo para uma “International Coalition for Democratic Renewal”.
Tratou-se em grande medida de um reencontro de pessoas e instituições que nas décadas de 1980 e 1990 deram corpo à expansão da democracia com base na aliança euro-americana. Alguns estão mais à direita, outros mais à esquerda, mas todos comungam da defesa da democracia liberal ocidental e da aliança euro-atlântica. E todos estão preocupados com os sinais de erosão da democracia e com os sinais de retoma da ofensiva por parte dos seus inimigos.
As chamadas “Chatham House Rules”, que acordámos aplicar, permitem-me citar argumentos que foram apresentados, mas não os autores específicos de cada um desses argumentos. São regras de civilidade muito antigas que resistem imperturbáveis à vulgaridade da era das redes sociais. E mais uma vez resultaram em pleno. Permitiram uma discussão séria entre pontos de vista diferentes, por vezes bastante diferentes. Mas nunca alguém levantou a voz, nem alguém insultou alguém.
Um dos pontos em debate foi inevitavelmente o chamado “populismo”. Alguns dos participantes argumentaram que a “International Coalition for Democratic Renewal” devia centrar a sua actividade no combate ao populismo. Curiosamente, este ponto de vista foi recebido com reserva por boa parte dos participantes. O que deu lugar a um debate de rara elevação.
Basicamente, os argumentos contrários alertaram para a necessidade de não identificar a causa comum da “International Coalition for Democratic Renewal” com causas específicas do debate no interior de cada democracia. Ainda que nalgumas democracias existam realmente forças populistas anti-democráticas que devem ser denunciadas, a causa global da democracia não deve ser confundida com debates internos a cada democracia. (O tema do “Brexit”, por exemplo, foi consensualmente evitado e deixado ao cuidado da ancestral democracia britânica — com os votos comuns de que acordo civilizado seja encontrado entre o Reino Unido e a União Europeia).
Em contrapartida, foi sublinhada a importância de denunciar os inimigos externos às democracias — com particular ênfase para a Rússia e, sobretudo, a China. E foi sublinhada a importância simbólica do próximo ano de 2019: o 70º aniversário da fundação da NATO e o 30º aniversário da queda do Muro de Berlim.
Este foi um tema particularmente feliz para os portugueses presentes na reunião. Tivemos o prazer de informar que a celebração dos 70 anos da NATO e dos 30 anos da queda do Muro de Berlim tinha já sido aprovada como tema central do próximo Estoril Political Forum — a 27ª edição, que terá lugar a 24-26 de Junho de 2019.
A notícia foi saudada por inúmeros participantes, muitos dos quais já estiveram várias vezes no Estoril Political Forum — onde aliás decorreu este ano a primeira reunião do “Trans-Atlantic Working Group” (que reuniu pela segunda vez em Praga, na manhã de terça-feira) da “International Coalition for Democratic Renewal”.
Alguns confessaram não fazer a menor ideia sobre a situação política em Portugal. Mas todos elogiaram a percepção global sobre o perfil da democracia portuguesa: fundadora da 3ª Vaga de democratização mundial em Abril de 1974/Novembro de 1975, simultaneamente europeísta e atlantista, e, ainda por cima, com dois recentes prestigiados detentores de cargos internacionais — de que nem todos sabiam os nomes, mas de que todos sabiam os cargos de ex-presidente da Comissão Europeia e de secretário-geral da ONU.
Em suma, foi ostensivamente consensual a escolha do Estoril para um próximo reencontro dos que procuram reforçar o “centro vital” das democracias euro-atlânticas.