Causou alguma surpresa o anúncio de que o próximo Sínodo da Igreja católica versaria sobre a sinodalidade, ou seja, a corresponsabilidade de todos os fiéis na missão eclesial. Todos os católicos foram chamados a pronunciarem-se sobre este tema.

Nos anteriores sínodos, um tema pastoral era proposto a um representativo conjunto de bispos do mundo inteiro e depois o Papa, através de uma Exortação Apostólica pós-sinodal, propunha algumas conclusões desse trabalho colegial. O próximo Sínodo não ficará circunscrito à hierarquia da Igreja, mas será uma espécie de consulta popular, quase ao modo dos plebiscitos ou referendos. Neste sentido, é até mais abrangente do que um concílio ecuménico, em que só participam os bispos.

É muito positivo que todos os católicos sejam chamados a rezar, reflectir e dialogar sobre a Igreja da qual são membros activos porque, como ensina o Concílio Vaticano II, todos os cristãos estão chamados à santidade e ao apostolado na Igreja. Como noticiava a Ecclesia no passado dia 29, solenidade de São Pedro e São Paulo, o Papa Francisco referiu-se ao Sínodo 2021-2023 nestes termos: “Igreja em processo sinodal significa que todos participam, ninguém no lugar dos outros, ou acima dos outros. Não há cristãos de primeira ou de segunda classe. Todos são chamados.

Pede-se a todos os fiéis que renovem o seu compromisso baptismal, mas não que redefinam a doutrina católica, nem que reinventem a sua moral, como pretendem os que, a este propósito, exigem, por exemplo, a admissão de mulheres ao sacerdócio, o celibato opcional para os padres, ou a aceitação de uniões não susceptíveis da bênção matrimonial.

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São João Paulo II, em declarações já reafirmadas pelo Papa Francisco, decidiu, definitivamente, a impossibilidade do sacerdócio feminino na Igreja católica, por razões de ordem teológica, vigentes há já dois mil anos. Como diziam os antigos: ‘Roma locuta, causa finita’, ou seja, o Papa decidiu, a questão está arrumada!

Quanto à possível ordenação sacerdotal de homens casados, não há nenhum impedimento de ordem doutrinal, mas é uma proposta retrógrada. Com efeito, a Igreja fez essa experiência ao longo do primeiro milénio da sua história, tendo depois concluído a conveniência do celibato que, seguindo o exemplo de Jesus, desde sempre exigiu aos bispos e religiosos.

De facto, a questão do celibato opcional dos padres não faz sentido, não só porque o celibato nada tem a ver com os casos de pedofilia do clero, porque é na família que mais ocorrem abusos de menores, mas sobretudo porque o presbiterado já é opcional e, portanto, também o respectivo celibato: todos os sacerdotes católicos o são por opção. Pergunta-se: se se aceitasse esta proposta, que aconteceria a quem, tendo optado pelo celibato, depois, sendo padre, quisesse casar? Se o pudesse fazer, não faria sentido que, previamente, se tivesse obrigado a um regime que, depois, não teria de observar. Se o não pudesse fazer, então é o que já existe na Igreja! Portanto, bem vistas as coisas, esta pseudorreforma anacrónica não reformaria coisa nenhuma!

Quanto às uniões não susceptíveis da bênção sacramental, sempre foi da doutrina e da prática da Igreja o acolhimento de todas as pessoas, independentemente das suas tendências ou situações de facto. Por isso, a celebração eucarística conclui-se com a bênção para todos os que nela participaram, independentemente do seu estado de graça ou de pecado. Outra coisa seria abençoar aquelas uniões que são contrárias à doutrina católica: o fiel que tal pretendesse estaria a ser incoerente e a pedir ao ministro da Igreja que fosse farisaico, reconhecendo como matrimonial uma união que o não é.

Como esclareceu o Papa Francisco, “a palavra ‘sinodalidade’ não designa um método mais ou menos democrático e muito menos ‘populista’ de ser Igreja. Isso são desvios. A sinodalidade não é uma moda organizacional, ou um projecto de reinvenção humana do povo de Deus. A sinodalidade é a dimensão dinâmica, a dimensão histórica da comunhão eclesial fundada na comunhão trinitária que, ao apreciar o ‘sensus fidei’ de todo o santo e fiel povo de Deus, a colegialidade apostólica e a unidade com o sucessor de Pedro, deve incentivar a conversão e a reforma da Igreja em todos os seus níveis.

Francisco alertou para o perigo das “discussões estéreis” e do “clericalismo, que é uma perversão”, propondo uma “cultura do cuidado”, marcada pela “compaixão pelos frágeis e a luta contra toda a forma de degradação”. A Igreja não tem por missão legitimar os caprichos, ou as modas, até porque, para isso, já existe o mundo. A crucifixão de Jesus Cristo foi sufragada pela multidão, consultada por Pôncio Pilatos, que o queria indultar. A Igreja não pode ceder aos emergentes populismos; não lhe compete ser popular, mas oferecer, a quem os quiser, os meios necessários para a salvação eterna.

Quando Jesus acolheu a adúltera surpreendida em flagrante delito, não justificou o seu pecado, mas corrigiu-a: “Vai e de agora em diante não tornes a pecar” (Jo 8, 11). Igualmente, não aprovou as sucessivas uniões da samaritana que, diga-se de passagem, despachava maridos a grande velocidade, nem considerou matrimonial a sua ligação com o parceiro com quem então vivia: “Disseste bem: ‘não tenho marido’, pois tiveste cinco e o que tens agora não é teu marido” (Jo 4, 18).

Há dois mil anos, em Cesareia de Filipe, “Jesus fez a seguinte pergunta aos seus discípulos: ‘Quem dizem os homens que é o Filho do homem?’”. Curiosamente, todas as respostas a esta sondagem à opinião pública foram amáveis – “uns dizem que é João Baptista; outros que é Elias; e outros que é Jeremias ou algum dos profetas” – mas todas erradas, porque a resposta verdadeira – “tu és o Messias, o Filho de Deus vivo!” – não é a que vem do mundo, mas de Deus – “não foi a carne e o sangue que te revelaram, mas meu Pai que está nos céus” – através de Pedro (Mt 16, 13-17). Se o primeiro Papa foi, então, o autêntico interlocutor desta revelação, também agora é sobretudo ao seu sucessor, a quem foi dada a missão de confirmar os seus irmãos na fé (Lc 22, 32), que Deus se revela. A infalibilidade pontifícia, em questões de fé e de moral, é garantia da indefectibilidade eclesial (Mt 16, 18).

Quando Jesus expôs, em termos inequívocos, a verdade sobre a sua presença real na eucaristia, “muitos dos seus discípulos voltaram para trás e já não andavam com ele” (Jo 6, 66 – curioso número …). Talvez também agora a doutrina católica, em relação ao matrimónio e ao sacerdócio, seja pedra de escândalo para os falsos discípulos de Jesus. Mas os verdadeiros seguidores de Cristo fazem sua a resposta de Pedro, quando o Mestre perguntou aos apóstolos se também eles o queriam deixar: “A quem iremos nós, Senhor? Só tu tens palavras de vida eterna!” (Jo 6, 68).