Depois de mais de uma década de taxas de juro próximas de zero e negativas, o aumento das taxas oficiais do BCE já começou a ter efeitos nos custos das famílias e das empresas.

Entre setembro de 2021 e setembro de 2022, o indicador compósito do BCE relativo ao custo dos empréstimos para a compra da casa subiu de 1,3% para 2,44% na Zona Euro, e de 0,8% para 2,24% em Portugal. Para as empresas não financeiras, o custo dos empréstimos subiu de 1,49% para 2,41% na Zona Euro e de 2,17% para 3,6% em Portugal.

Mas o aumento do custo de financiamento não é o único desafio que se coloca às famílias e às empresas no próximo ano. A mudança muito rápida na orientação da política monetária, as dúvidas sobre a velocidade com a qual os bancos centrais irão aumentar as taxas diretoras e o valor que irão atingir são fonte de grande incerteza para os mercados financeiros, o que resulta num aumento da volatilidade e da instabilidade financeira. Este efeito é visível, por exemplo, nas taxas de juro da dívida soberana dos países mais endividados. As diferenças na política monetária entre diferentes regiões refletem-se também em variações nas taxas de câmbio, contribuindo para a desvalorização do euro face ao dólar.

Apesar desta incerteza, é certo que as economias europeias estão em geral atualmente mais bem preparadas para a enfrentar. Se a guerra aumentou o risco de recessão, o sistema financeiro está bastante mais sólido do que na última crise. Na Zona Euro, a dívida do setor privado só atingiu o nível de 2008 em 2019 (e em percentagem do PIB continua muito inferior). O setor financeiro, por sua vez, reforçou significativamente os seus rácios de capital desde a última crise financeira.

Para além do mais, a normalização das taxas de juro tem aspetos positivos. O seu primeiro objetivo é combater a inflação, que tem efeitos negativos perniciosos na economia, reduzindo os rendimentos reais e desincentivando a poupança. Adicionalmente, esta mudança de política vai permitir o regresso a um modelo de negócio tradicional das instituições de crédito, baseado na diferença das taxas de juro entre aforradores e devedores, e menos dependente das comissões. Por fim, as taxas de juro mais altas também obrigam a uma maior concorrência no acesso ao financiamento, o que poderá resultar numa maior concentração de fundos em projetos de investimento que tenham uma expetativa de rentabilidade acrescida.

Um regresso às taxas de juro positivas significa voltar ao velho normal, à situação anterior à crise financeira e de dívida de 2007-2012. As políticas que obrigaram o setor financeiro a reforçar o capital e a ser mais prudente na concessão de crédito desde então, bem como a estabilização da dívida do setor privado, deixaram a Europa mais bem preparada. Ainda assim, o período de transição tem custos de ajustamento e comporta riscos para a estabilidade financeira e económica.

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