Muitas vezes, os factos dizem quase tudo. Vejamos a lista de quem apoiou o Syriza no exercício de chantagem política, que o governo grego chamou “referendo”:
– Em Espanha, o Podemos.
– Em França, as extrema-esquerdas e a Frente Nacional da família Le Pen.
– Em Itália, a Liga do Norte.
– Na Alemanha, a extrema-esquerda, De Linke
– No Reino Unido, o Ukip.

E quem esteve contra o Syriza?
– Em Espanha, o PP, o Ciudadanos e a maioria do PSOE.
– Em França, o Partido Socialista, os Republicanos (a antiga UMP) e o UDF.
– Em Itália, o Partido Democrático e o centro-direita.
– Na Alemanha, a CDU e o SPD.
– Na Holanda, os Liberais, os Trabalhistas e os Democrata-Cristãos.
– No Reino Unido, os Conservadores, os Trabalhistas e os Liberais.

Como foi em Portugal?
– A coligação esteve obviamente contra o Syriza.
– O PCP, o Bloco de Esquerda, os vários dissidentes do Bloco, muitos dirigentes do PS, Pacheco Pereira, Freitas do Amaral e outros defensores dos privilégios da elite oligárquica estiveram ao lado do Syriza. O PS é o caso mais notável. Excluindo Jaime Gama, António Vitorino, Luís Amado, Francisco Assis e antigos membros da direção de Seguro, o resto ou esteve ao lado do Syriza ou adoptou uma posição de neutralidade, como o líder do partido, António Costa. Esperemos que seja coerente com a sua posição de neutralidade entre o PP e o PSOE em Espanha e em França entre Hollande e Sarkozy.

Ou seja, e desculpem a insistência, no momento mais marcante da vida do Euro, naqueles momentos da História em que não se pode errar, muitos membros da direção do PS, ilustres dirigentes do partido, com responsabilidades no passado, estão ao lado do governo mais revolucionário que alguma vez existiu na União Europeia. Um governo anti-europeu, anti-mercado, marxista, inspirado no regime chavista da Venezuela e aliado da extrema-direita. E estão do lado da Frente Nacional, do Ukip, da Liga do Norte e das extremas-esquerdas europeias. Contra os seus partidos irmãos europeus, como por exemplo os socialistas franceses e o SPD alemão. Em relação à Grécia, o governo português está mais próximo dos socialistas franceses, alemães e italianos do que o PS. Extraordinário.

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Se António Costa fosse um líder forte e corajoso, teria simplesmente dito. ”O PS não hesita: entre um governo radical grego e os parceiros europeus, estamos claramente ao lado dos nossos parceiros. Com esta política, o governo grego está a levar o país para o desastre. Achamos que o governo português faz bem em defender o interesse nacional e queira que a Grécia nos pague o dinheiro que emprestámos numa altura muito difícil para o nosso país. Posso garantir aos portugueses que com o PS no governo, não acontecerá nada de semelhante ao que se passa na Grécia.” Por que razão Costa não diz o óbvio? Por que sabe que o seu partido está dividido, sabe igualmente que não tem a força suficiente para disciplinar o PS e acredita que só reforçará o seu poder se chegar ao governo. Uma ilusão perigosa.

O que vai fazer então o governo que tantos socialistas portugueses defendem? Antes de mais, já conseguiu uma proeza inédita: fechar os bancos durante duas semanas e levá-los à falência se o BCE deixar de os apoiar financeiramente. Agora tem duas opções. Ou aceita um terceiro programa de apoio da União Europeia e do FMI, com mais austeridade do que o segundo programa e do que foi proposto antes do “referendo”, ou a Grécia será suspensa da zona Euro no Domingo à noite. Um governo que prometeu o fim da austeridade vai agravar a austeridade. Um governo que prometeu que manteria o país no Euro, arrisca-se a ser suspenso e a imprimir moeda local. Um governo que prometeu resolver a crise em “48 horas”, ainda não resolveu nada, cinco dias depois do “referendo.” Um governo que acabou de apresentar um programa de austeridade contra o qual fez campanha na semana passada. Numa semana, Tsipras vota Não e na seguinte vota Sim. Eis o governo que muitos socialistas portugueses apoiam.

Acho que será muito difícil haver um acordo. Tsipras sabe que um programa de austeridade levará fatalmente à divisão do Syriza. Até agora, entre um acordo com os credores europeus e a unidade do Syriza, escolheu sempre a última. Pode mudar agora, mas mesmo que assine um acordo, dificilmente será capaz de o cumprir. E será uma questão de tempo até a crise regressar. O problema de fundo é a natureza revolucionária do Syriza.

Durante o meu Doutoramento, tive colegas gregos que ocupam hoje posições de destaque no Syriza. São amigos do novo ministro das Finanças grego. Sei como eles pensam e no que acreditam. São profundamente anti-capitalistas, contra a economia de mercado, contra o Euro e contra a União Europeia. Olham para a democracia liberal ocidental como um regime assente na ditadura da burguesia. E acreditam que a sua função é libertar os povos europeus dessa ditadura.

O Syriza não é composto por um grupo de rapazes irresponsáveis e semi-libertários, mas sim por revolucionários profissionais. A maioria quer tirar a Grécia do Euro e criar um regime socialista. Uma espécie de Venezuela no Mediterrâneo, mas sem petróleo. Pretendem, no entanto, convencer os gregos que a Europa será a culpada por uma eventual saída do Euro. Aliás o Syria é muito mais um movimento de massas do que um partido político. Com instintos totalitários e sem respeito pelas instituições democráticas e pela liberdade. Como se viu com a violação grosseira da democracia a que chamaram “referendo” e com os ataques à liberdade dos jornalistas que defenderam o Sim.

Os governos europeus já perceberam que estão a lidar com um movimento revolucionário e anti-democrático. Sobretudo os países que vieram de um passado comunista. Muitos socialistas portugueses podem acreditar nas “virtudes” do Syriza, mas quem viveu sob a miséria e a ditadura socialista durante décadas, como os países Bálticos, a Eslováquia e a Eslovénia – um dia, alguém contará o papel destes países durante a crise da Grécia -, e Merkel, não se deixa enganar. Eles conhecem os movimentos revolucionários. E experimentaram a tragédia que se irá abater sobre os gregos.