É um erro assumir que os políticos e governantes que marcaram gerações não tinham uma visão do futuro que gostariam alcançar e que se limitaram a seguir os eventos do dia-a-dia. Adaptaram-se, não haja dúvidas, ou seriam trucidados pelos acontecimentos. Mas fizeram-no com algo superior em vista. De Gaulle afastou-se da Quarta República porque a considerava disfuncional e não quis a sua imagem política agastada com o que entendia ser um fracasso anunciado. Churchill colocou-se à margem da narrativa que, no seu país, prevaleceu nos anos 30. Thatcher observou e analisou os erros dos governos conservadores de Macmillan e de Heath (principalmente deste último) para abraçar novas soluções para problemas que também eram novos. Entre nós, Mário Soares desejou ser a charneira do sistema que ligasse direita e esquerda, mas não deixou de ter (e de referir) uma visão para o país: liberto da ditadura de extrema-direita, livre da opressão da extrema-esquerda, inserido na comunidade europeia, uma democracia ocidental e moderna.
Que Portugal vamos ter em 2050? É uma pergunta cuja resposta implica saber como será o mundo daqui a 25 anos. É uma pergunta à qual não conseguimos responder porque parte de pressupostos que não controlamos. Mas que não nos impede que coloquemos a questão de outra forma: que Portugal gostaríamos que existisse em 2050? É uma pergunta legítima e necessária. Legítima porque se trata do nosso país, do legado que pretendemos deixar aos que vão ser portugueses na segunda metade deste século. Necessária, porque se apenas pensarmos antecipadamente somos capazes agir de modo consequente.
É importante que façamos esta análise no momento que entramos no último ano do primeiro quartel do século pois, nestes últimos 25 anos, não fizemos mais que correr atrás do prejuízo. O projecto saído do 25 de Abril (e consolidado com o 25 de Novembro), de uma democracia ocidental e uma economia inserida na Europa ficou-se pelos anos 90. Consumou-se nessa altura e desde então nada surgiu que o substituísse. Esta falta de visão foi fatal até para Passos Coelho, um primeiro-ministro que esteve à altura das dificuldades que o país enfrentou e foi capaz de levar por diante o mais difícil programa de recuperação económica que Portugal enfrentou nos últimos 50 anos. Mas Passos não tinha (ou se tinha não foi capaz de a transmitir) uma visão para o futuro. Talvez por isso, não conseguiu a necessária maioria absoluta para que continuasse no governo. Mas essa visão de longo prazo é também determinante para que um governo não fique enredado nas narrativas populistas de partidos que acabam por marcar a agenda política.
Como vemos Portugal daqui a 25 anos? Um país inserido na comunidade de estados ocidentais, uma democracia capaz de alternar governos sem violência, um estado que seja um garante da ordem pública e saiba interagir com os diversos sectores da sociedade, com vista à prossecução dos serviços públicos. Uma economia capitalizada e aberta a investimentos de valor acrescentado que criem empregos que paguem salários altos. Um Portugal próximo dos países que falam português e que faça pontes entre estes e os EUA e a Europa. Com o fim da hegemonia ocidental, o mundo volta a ser o que era antes da globalização iniciada pelos portugueses e o centro das riquezas regressou ao Oriente, o local onde todos querem estar, onde todos precisamos estar se não quisermos ficar para trás na inovação tecnológica, no acesso às fontes de conhecimento e no desenvolvimento das novas ideias.
Seria errado pensar que Portugal não pode ter uma palavra a dizer nesta mudança estrutural dos equilíbrio internacional, a maior desde a chegada de Vasco da Gama à Índia. Pensar o que pode vir a ser Portugal daqui a 25 anos não é uma perda de tempo. É uma antecipação de desafios e a construção de um fio condutor a que nos poderemos agarrar de cada vez que os imprevistos nos fizerem tremer mais que o normal.