O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, promete fazer em seis anos o que não conseguiu fazer em 18, utilizando praticamente os mesmos quadros que o acompanham já há longos anos.

O dirigente russo voltou a confiar a direcção do Governo a Dmitri Medvedev, que já anda nesta dança de cadeiras há dez anos, quando, em 2008, foi eleito Presidente da Rússia, para que Vladimir Putin pudesse ocupar descansadamente o lugar de primeiro-ministro e, depois, trocarem de lugares em 2012.

Ainda não se conhecendo quem irá ocupar os cargos de ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros, que são nomeados por Putin e não por Medvedev, já é possível constatar que as caras no Governo são praticamente as mesmas, tendo apenas algumas mudado de lugar. Isto mostra claramente que Vladimir Putin não decidiu arriscar com apostas nos “jovens tecnocratas”, como alguns esperavam, mas apoiar-se na fidelidade de Medvedev e dos seus obedientes ministros.

Porém, é difícil compreender como é que a “velha guarda” irá cumprir o ambicioso programa apresentado pelo líder russo: “Sobre os objectivos nacionais e as tarefas estratégicas do desenvolvimento da Federação da Rússia até 2024”.  Putin não explica como será possível, em apenas seis anos, “a entrada da Federação da Rússia no número das cinco mais poderosas economias do mundo, a garantia dos ritmos de crescimento acima dos mundiais, ao mesmo tempo que se manterá a estabilidade macroeconómica, nomeadamente a inflação a um nível não superior a 4%”.

Segundo o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento, o ritmo do crescimento da economia da Rússia em 2018 e 2019 continuará igual ao de 2017: cerca de 1,5%. Quanto ao crescimento da economia mundial, o FMI aponta para 3,9% nesses mesmos dois anos.

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No mesmo programa, Putin apresenta perspectivas que vão além do seu actual mandato, como “o aumento da esperança de vida até 78 anos (até 80 anos em 2030)”, o que leva alguns a pensar que o dirigente russo parece não fazer contas de entregar o poder a outros tão cedo.

Talvez grande parte deste programa possa ser realizado se o preço do petróleo aumentar muito nos mercados mundiais, se a Rússia não estiver sujeita a um forte regime de sanções, mergulhada na corrupção e envolvida numa política externa cada vez mais acima das suas possibilidades económicas. Mas este cenário parece ser irrealista.

Ao crescente envolvimento dos militares russos na Síria e na Ucrânia junta-se a crise entre os Estados Unidos e o Irão, onde Moscovo pretende ter uma palavra a dizer. A desestabilização no Afeganistão obriga também o Kremlin a reforçar a sua presença na Ásia Central.

Entre os nomes que se falam para substituir Serguei Lavrov no cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia está Anton Vaino, actual dirigente da Administração Presidencial. De origem estónia, o seu pai, Karl Vaino, foi um dos últimos dirigentes do Partido Comunista da Estónia, quando esta se encontrava ainda ocupada pela União Soviética. É conhecido pela sua fidelidade total a Putin e deverá dar continuidade à linha dura do Kremlin no palco internacional.

No plano interno, não se pode subestimar o papel da oposição extra-parlamentar no xadrez político. As manifestações de 5 de Maio mostraram que ela ainda não é muito numerosa, mas revelaram também que a sua geografia aumenta consideravelmente e a juventude é um participante cada vez mais activo.  O exemplo da Arménia, onde manifestantes da oposição conseguiram pôr fim à continuação no poder do antigo Presidente Serguei Sergissian, desta vez no cargo de primeiro-ministro, é estimulante para a oposição russa.

Quanto aos partidos Comunista e Rússia Justa, que votaram contra a nomeação de Medvedev para primeiro-ministro, eles não deverão criar problemas substanciais a Putin, a não ser que uma crise do sistema atice a luta no interior das elites russas.

O discurso do Presidente russo na parada militar de 9 de Maio, dia em que na Rússia se comemora a vitória do Exército Vermelho sobre o nazismo alemão em 1945, não deixa margem para dúvidas que, pelo menos nas palavras, Putin continua a rever a história a favor do nacionalismo e do anti-ocidentalismo.

A 9 de Maio de 2005 ele declarou: “Nós nunca dividimos a Vitória em nossa e dos outros. Iremos recordar sempre a ajuda dos aliados: dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha, da França, de outros Estados da coligação anti-hitleriana, dos antifascistas alemães e italianos. Hoje, prestamos tributo à coragem dos europeus que ofereceram resistência ao nazismo”.

Agora, 9 de Maio de 2018, afirmou o seguinte: “Iremos sempre ter orgulho que o povo soviético não tremeu, não tremeu perante um inimigo cruel, quando alguns Estados preferiram a vergonha da capitulação, o compromisso hipócrita ou a cooperação directa com os nazis”.

Certamente que, no seu último discurso, Vladimir Putin não tinha em vista o Pacto Molotov-Ribbentrop, assinado em 1939, quando se referiu ao “compromisso hipócrita ou a cooperação directa com os nazis”. As críticas foram dirigidas na direcção da Grã-Bretanha, França, etc.