Na passada 4.ª feira, foi tornado público um manifesto pela reforma do sistema eleitoral português, que conta com a assinatura de várias personalidades dos mais diversos quadrantes. A reforma do sistema eleitoral português deve ser encarada como uma das grandes prioridades políticas da atualidade, com o objetivo de promover uma maior proximidade entre eleitores e eleitos, reduzir o desperdício de votos e fortalecer a democracia.

Os últimos dias têm sido marcados por uma relevante determinação em potenciar a vitalidade das instituições democráticas em Portugal. Ao passo que, primeiramente, um grupo de 50 jovens manifestou a necessidade de reformar a justiça em Portugal, surge agora um novo movimento de redobrada importância, sustentado num projeto coeso e estruturado de forma a auscultar especialistas e sociedade civil com o objetivo de atingir um modelo consensual de reforma do sistema eleitoral português. Enquanto jovem e cidadão ativo, não poderia deixar de me congratular com o objeto deste projeto, que congrega a participação cívica e a cidadania política enquanto forças motrizes da fortificação da democracia em Portugal.

Tal como a nossa democracia, o sistema eleitoral português enfrenta desafios. As transformações digitais e sociais, acompanhadas por movimentos de êxodo rural e de litoralização da população, colocam a descoberto as disparidades na magnitude dos círculos eleitorais. Tal faz com que os círculos do interior elejam menos deputados, deixando os respetivos eleitores limitados a um mero voto útil, à semelhança do que ocorre no círculo de Portalegre, por exemplo. Aliás, nos círculos do Alentejo, as últimas eleições legislativas ditaram um total de 64.643 votos desperdiçados, ou seja, 1 em cada 3,51, aproximadamente. Trata-se, pois, de uma questão de injustiça eleitoral comparativamente a situações como as de Lisboa e Porto. Se queremos captar o interesse e reforçar a participação cidadã – e dos jovens, particularmente – nas vidas política e democrática do nosso país, enquanto asseguramos o desenvolvimento do interior do país, é essencial que efetivemos uma igualdade de oportunidades, seja em matéria de empregabilidade, educação ou acesso a serviços, mas também na forma como contabilizamos a participação eleitoral.

Outra das grandes limitações do atual sistema eleitoral em Portugal prende-se com o facto de existir uma reduzida liberdade de escolhas dos eleitores. Apesar de ter existido uma grande redução da taxa de analfabetismo desde 1976, entre outras transformações socioeconómicas, o sistema eleitoral português apenas sofreu escassas modificações, à semelhança do que ocorreu em outras instituições da democracia. Contudo, com o aumento da instrução e do acesso à informação, é natural que, hoje, os jovens e a população em geral procurem de forma acrescida debater, influenciar e questionar a atuação política, sendo essencial conferir um maior poder aos eleitores. A capacidade de votar não só em plataformas políticas, mas também em candidatos, deverá ser um caminho a percorrer, à semelhança do que já ocorre em diversos países da União Europeia.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Vivemos tempos cruciais para a nossa democracia e a proximidade entre atores políticos e cidadãos é fundamental para ultrapassar os desafios emergentes, como populismos e extremismos, permitindo corresponder de forma mais efetiva às necessidades das populações. Votar em candidatos, por exemplo, é votar em figuras políticas concretas e da confiança de cada cidadão; é potenciar um maior critério na escolha dos mesmos por parte dos diretórios partidários; é incentivar à participação democrática e reduzir a abstenção; é renovar a democracia!

Há muito que uma reforma do sistema eleitoral português se tem como inadiável aos olhos de muitos e evitável aos olhos de tantos outros. Muitos dirão que os objetivos patentes numa reforma deste tipo, como o incremento na proximidade da ação política e na qualidade da democracia, poderão ser alcançáveis através de alterações na conduta diária dos partidos políticos. No entanto, é natural que nem sempre os mesmos queiram ver o paradigma eleitoral alterado, quer pelo intuito em manterem o número de mandatos receando perder espaço para novos ou mais pequenos partidos, mas também pelo receio, por parte dos pequenos partidos, de alterações que possam favorecer os partidos políticos de maior dimensão.

No entanto, este é o tempo de agir! Chegou a hora de 1) uma maior justiça eleitoral, 2) o aumento da qualidade da democracia e da participação democrática, bem como 3) uma maior proximidade entre eleitores e eleitos serem priorizados face ao orgulho de uns e às pretensões de outros. Nos 50 anos da Revolução de Abril, apenas a mobilização cidadã, una e massificada, poderá permitir a continuidade da vitalidade da democracia em Portugal, potenciando a construção de consensos políticos e fazendo com que não existam eleitores de primeira e de segunda.