A morte de Rui Nabeiro levantou uma onda de comoção nacional que terá apanhado muitos de surpresa. Estamos mais habituados a ver este tipo de manifestações com a morte de artistas ou jogadores de futebol. Num país que não está habituado a apreciar ricos e a celebrar o sucesso alheio, a morte de Nabeiro foi profundamente lamentada por quase todos, o que o torna, seguramente, no empresário português mais popular e respeitado dos últimos 50 anos.

Nabeiro merece tudo isso. A verdade é que, apesar de próximo do Partido Socialista, nunca foi um empresário do regime, nem precisava do Estado para nada. Se a máquina burocrática pública não o atrapalhasse ele provavelmente agradeceria, não precisava de mais nada. Se tivermos em conta o espírito empreendedor e coragem que sempre demonstrou nos negócios, a capacidade de liderança e a sua consciência social, Nabeiro será seguramente muito mais liberal que socialista.

A lógica empresarial e o racional económico e financeiro provavelmente ditariam que um grupo daquela dimensão teria de deixar uma pequena vila raiana no Alentejo se quisesse crescer, a deslocalização da fábrica para uma zona com melhores acessos e no litoral pareceria inevitável. Rui Nabeiro estava habituado a desafiar a lógica, e sabia perfeitamente que sair de Campo Maior significaria mais uma machadada numa região já de si desertificada e pobre, nas suas próprias palavras: “Não trabalho para mim, trabalho para todos e todos trabalham para mim. Quem semeia colhe.

Rui Nabeiro não estudou na Universidade Católica, ao contrário do seu neto, que lhe sucederá na liderança do grupo e partilha consigo o nome, o seu estilo de liderança não foi desenvolvido nos Estados Unidos da América, na Suíça ou em Inglaterra, mas em Campo Maior, ao lado dos trabalhadores, dos técnicos e dos gestores. Este estilo de liderança de proximidade e serviço ao outro, sejam eles os trabalhadores ou a comunidade, ensina-se hoje nas melhores universidades do mundo, mas Rui Nabeiro não precisou de sair da sua terra para perceber que tinha de retribuir o muito que aquela terra lhe deu.

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Não conheci Rui Nabeiro. O meu sogro, que tinha um café e era um dos principais clientes da Delta na região, conta-me que uma vez por ano a família Nabeiro tinha por hábito convidar os principais clientes para um fim-de-semana na herdade da família em Campo Maior, onde se passavam dois dias a comer e beber copiosamente e havia tempo para caçadas e tiro aos pratos, no final alguns ainda levavam garrafas de vinho para casa. Rui Nabeiro fazia questão de esperar os seus clientes à entrada da propriedade e cumprimentá-los um a um.

Nabeiro foi indiscutivelmente um rico diferente. Vivendo em Campo Maior não precisou dos salões de Lisboa para se afirmar socialmente, o reconhecimento dos seus era muito mais importante que a aprovação da elite da capital, fazer a diferença na sua terra dava-lhe mais prazer que a boa vida que a cidade grande podia proporcionar.

A forma emocionada e sincera como foi relembrado por aqueles que com ele privaram, sobretudo os seus trabalhadores, prova que aqueles palavras e lágrimas não eram de circunstância, aquelas pessoas sabem que devem muito ao homem que acabara de morrer, chorar a sua morte era a sua homenagem.

“O meu pai dizia: o Rui vai longe. E não fui perto”. E não foi Sr. Rui, o senhor foi muito longe. Obrigado.