Enquanto entre a União Europeia e os Estados Unidos não acalmam as discussões sobre a construção do North Stream-2, segundo gasoduto que irá transportar gás russo para a Alemanha através do Báltico, enquanto a Polónia e a Ucrânia tentam encontrar alternativas aos fornecimentos de gás pelo vizinho do Leste, Moscovo arranja mercados alternativos na Ásia para os seus combustíveis.

“A torneira está aberta! (…) o gás entrou na China”, declarou solenemente o presidente da empresa estatal russa Gazprom, Alexei Miller, no momento da inauguração do gasoduto que passou a ligar a Sibéria ao “Império do Meio”.

Trata-se de uma obra gigantesca. Os russos tiveram de construir um tubo, a que deram o nome de “Força da Sibéria”, com um comprimento de cerca de 3000 km. Os chineses irão acrescentar mais 3370 km para que o gás siberiano chegue até Xangai.  O contrato com a China, avaliado em mais de 350 mil milhões de euros, foi assinado por um período-recorde de 30 anos e prevê o fornecimento anual de 38 mil milhões de metros cúbicos de gás.

Entretanto, Moscovo e Pequim já negoceiam a construção de um novo gasoduto “Força da Sibéria – 2”, que irá transportar combustível da Sibéria para a costa leste da China. Além disso, estes tubos poderão servir para levar o gás até outros países da Região Asiática do Pacífico, onde ele goza de uma procura cada vez maior.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Até agora os chineses importavam gás natural da Turcoménia através de um gasoduto que atravessa o Uzbequistão e o Cazaquistão, mas esses fornecimentos estão longe de cobrir as necessidades da indústria chinesa, que aposta cada vez mais neste combustível para substituir o carvão e, desse modo, combater a poluição.

Não se pense, porém, que a China passará a depender completamente do gás russo, pois continuará a importar grandes quantidades de gás condensado da Austrália, Qatar, Malásia e Indonésia.

E para a Rússia este projecto não parece ser muito rentável, visto que, segundo cálculos da própria “Gazprom”, ele só começará a pagar os investimentos feitos em 2048.

Segundo alguns analistas, esta obra visa prevenir problemas que poderão surgir no futuro. Para a Rússia é uma garantia de que terá para onde escoar o gás caso surjam problemas no flanco ocidental. A pressão de Washington, principalmente após a chegada de Donald Trump ao poder, sobre a União Europeia é cada vez maior no sentido de obrigar os países europeus a substituírem o gás russo pelo mesmo combustível norte-americano. Trump ameaça com sanções empresas que participam na construção do North-Stream-2, gasoduto paralelo ao North-Stream – 1, que transporta directamente gás russo para a Alemanha através do Mar Báltico. As autoridades da Polónia já anunciaram que não vão comprar gás à Rússia, substituindo-o por combustível vindo da Noruega através de um gasoduto e pelo gás condensado dos Estados Unidos. A Ucrânia pretende também renunciar aos fornecimentos russos neste campo, mas aqui o processo será mais complicado, pois através deste país passa um importante gasoduto da Rússia para a Europa. O contrato de transito de gás por este tubo termina a 31 de Dezembro do ano corrente e as partes ainda não chegaram a acordo sobre o seu prolongamento.

Com a entrada em funcionamento do “Força da Sibéria”, o Kremlin poderá fazer de conta que não está preocupado com o escoamento do seu gás.

Para a China, trata-se também de uma medida de prevenção face a problemas de caráter político-militar que poderão dificultar os fornecimentos de gás condensado por mar.

Seja como for, a construção do novo gasoduto vem reforçar as relações entre a China e a Rússia, mas continua a ser difícil imaginar que se volte a gritar a palavra de ordem proclamada por Estaline e Mao: “Russos e chineses, irmãos para sempre!” A não ser que Vladimir Putin queira desempenhar o papel de “irmão mais novo”.

P.S. A julgar pelo que se vê, lê e ouve, os problemas globais como o acima referido parecem não nos dizer respeito. É mais importante assistir à telenovela: “Livre e Joacine, história de um breve amor” ou à “Chegada de uma Dona Sebastiana ao Tejo”.