“Quando as colinas de Los Angeles estão queimando
As palmeiras são velas nos ventos assassinos
Tantas vidas estão na brisa
Até as estrelas estão desconfortáveis
E Los Angeles está queimando.”
Bad Religion, 2004: “Los Angeles está em Chamas”.
A história dos atuais incêndios em Los Angeles começa há 8 mil anos, desde que há pessoas para a contar: “Oito mil anos atrás, os povos Tongva e Tataviam, que moravam no que hoje chamamos de Bacia de Los Angeles e nos vales de San Fernando e San Gabriel, fizeram exatamente o que muitos de nós temos feito nos últimos dias: eles inalaram o ar seco de uma tarde de outono varrida pelo vento e observaram as encostas acima deles queimarem.” (Tim Rutten, 2008)
Sopra por ali o chamado “vento de Santa Ana”, na definição do National Weather Service “ventos fortes, quentes e carregados de poeira que descem para a costa do Pacífico ao redor de Los Angeles, vindos de regiões desérticas do interior”, ao qual estão associados terríveis episódios com incêndios mortíferos e destruidores, como foram os de 2024, 2020, 2017, 2014, 2008, 2007, 1993, 1982, 1961 ou o grande incêndio de 1889…
Como por cá, em que alguns dos mais sérios episódios de incêndios se dão com ventos de leste, levando a provérbios como “ de Espanha nem bom vento nem bom casamento”, por lá estes ventos são bem conhecidos… e possivelmente por origem espanhola (já que tal palavra não existe entre os ameríndios), vistos mesmo como obra do Diabo – Santa Ana, de Santa Anas, de Satanas… – e por isso mesmo Santa Ana, por alturas de 1902 ainda teve um comité para esclarecer que o nome estava incorreto e não devia tal coisa diabólica ser associada ao nome da cidade (Robert Fovell, 2008).
Lembram-se do par de dias terrível que tivemos em Setembro? As coisas são semelhantes: dias excecionais em que tudo – do churrasco ao comboio, da linha elétrica à beata – pega fogo, e que rapidamente se torna incontrolável se tiver, como qualquer fogo, combustível para arder, e destruidor, se pelo percurso se cruzar connosco, nossas casas, animais, infraestruturas…
Desgraçadamente, lá como cá, estes dois pontos essenciais têm sido imensamente descurados, resultando num espaço florestal que, transformado num barril de pólvora, permite os incêndios crescerem até se transformarem em verdadeiros monstros imparáveis, e depois um território desordenado que permite ao fogo saltar das florestas para os espaços urbanos… Temos por exemplo a New Leaf Climate e a Forest Business Alliance num relatório recente a lamentar os baixos níveis de gestão de combustível, afirmando que ao ritmo atual será necessário praticamente um século para atingir as metas de redução de combustíveis.
Isto – gestão de combustíveis – diz-nos a ciência e a técnica que é a forma de lidarmos com a problemática dos incêndios florestais. Todavia, se mitos e desculpas – incendiários, dispositivos de combate, interesses e negócios, etc. – já eram fortes entraves, vem-se juntando nos últimos anos a causa de todos os males: as Alterações Climáticas. Olhando a tv’s e jornais, tudo isto é novo, tudo isto é clima, nada disto tem solução que não a descarbonização. Como diria Abraham Maslow, “para quem só tem um martelo, todo o problema é um prego”.
Curiosamente, as previsões da climatologia até apontam (os nossos “especialistas” não as leram?) para que as Alterações Climáticas venham a enfraquecer a frequência e intensidade dos ventos de Santa Ana.
Não obstante, mesmo que o contrário se passasse, a solução não seria diferente: é a gestão de combustível que pode aumentar o nosso controlo sobre incêndios, não o carro elétrico do vizinho… Pelo que, para a problemática dos incêndios, são tão diabólicos os ventos como são as opiniões que trocam o conhecimento cientifico e técnico sobre o assunto pelo ativismo climático no aproveitamento de desgraças.