À hora a que escrevo este texto, a petição pública lançada na passada sexta-feira para apoiar a queixa-crime contra André Ventura, Pedro Pinto e Ricardo Reis, já tem mais de 120 mil assinaturas. Embora não concorde com tentativas de limitar a liberdade de expressão, por mais desprezíveis que sejam as declarações que se pretendem censurar, tenho de concordar com os peticionários quando dizem que as afirmações dos membros do Chega  “incitam a práticas criminais”. Pelo menos, quando as oiço, sinto-me impelido a cometer um crime que está tipificado no número 1 do artigo 152.º do Código Penal, onde se estabelece que “Quem, tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direcção ou educação, ou como subordinado por relação de trabalho, pessoa menor, incapaz, ou diminuída por razão de idade, doença, deficiência física ou psíquica e lhe infligir maus-tratos físicos ou psíquicos ou a tratar cruelmente; (…) é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos”. É que quando ouvi o Pedro Pinto dizer “se calhar, se [os agentes] disparassem mais a matar, o país estava mais na ordem”, o meu primeiro instinto foi dar um calduço ao meu filho e mandá-lo de castigo para a cama sem sobremesa. É o tipo de palermice que ele costuma dizer para nos irritar. Só depois é que percebi que não tinha sido o miúdo, mas sim um deputado na televisão. Obviamente, não lhe retirei o castigo. Mais cedo ou mais tarde iria fazer uma asneira para o merecer, de maneira que ficou logo dado.

É curioso constatar como os deputados do Chega, na sua alarvice, são muito parecidos com crianças impertinentes. O mesmo egoísmo selvagem, mesma sujidade atrás das orelhas, a mesma capacidade de estragar um jantar. A questão é que, apesar disso, não são crianças, nem nossos filhos. Não os podendo educar, há que conviver com a sua má criação, por mais que isso arrelie. O objectivo deles é serem tão chocantes quanto possível, para obrigar as pessoas a reagirem intempestivamente, dando-lhes oportunidade de depois se vitimizarem. Foi o que aconteceu agora, com esta queixa-crime. Que não só não vai dar em nada, como é capaz de prejudicar. Calar o Chega não é boa ideia. É bom que digam de viva voz o que pensam, para perceber o que seria o país governado por eles.

O Chega tem um problema. Já repararam como a maior parte dos seus deputados permanecem anónimos? Tirando patear adversários ou aplaudir o chefe, não se lhes ouve nenhuma intervenção. Há quem ache que são mantidos na sombra por falta de qualidade política, pouca preparação ou simplesmente burrice. Mas isso quereria dizer que os outros, os que falam, não possuem os mesmas atributos. Quem já os viu sabe que não pode ser por isso. O que falta aos 40 deputados que nunca se ouvem, que sobra àqueles que costumam falar, é a capacidade de dizerem coisas repugnantes. O Chega tem dificuldade de recrutar gente desagradável, porque felizmente não há assim tanta em Portugal. A maioria do grupo parlamentar é composto por gente normal, com algumas ideias políticas pouco recomendáveis e incapacidade para escolher companhias, mas gente normal. Os outros dez competem entre si para ver quem diz a chavasquice mais javarda. Parece um jogo de Chenga, em que cada deputado arrisca ir mais longe em grosseria do que o anterior, tirar mais uma peça de decência, até o dia em que o partido desmorona.

Mas Pedro Pinto tem um papel especial no Chega. Vê-se que André Ventura deposita nele grandes esperanças. É provável que, no seu delírio messiânico, até já lhe tenha dito: “Tu és Pedro, e sobre este calhau edificarei o meu culto de personalidade”. Tem muita confiança nele. Daí o protagonismo excessivo de Pinto, que vai a todas porque parece ser o único que consegue ser rasca a falar sobre vários temas da actualidade. Pedro Pinto tem uma falta de formação eclética, o que lhe permite tanto ser repelente sobre imigração, como sobre agricultura, SNS ou habitação. É um homúnculo do Renascimento. Um políprimata, digamos. Desta vez, na ânsia de ser provocador, precipitou-se e até falou contra os seus próprios interesses. Se, como ele diz, a polícia atirar a matar mais vezes, Pedro Pinto corre risco de vida. Numa operação STOP, quando o agente o mandar sair do carro, pode surgir uma situação de conflito. Primeiro, Pinto tem de abrir o cinto de segurança. Como está debaixo do rabo, isso vai demorar. Depois, tem de se içar para fora do carro sem se untar previamente com margarina. O tempo a passar e a paciência do PSP a esgotar-se. Enfim, pode ser chato. Pedro Pinto falou de mais. Bem diz o povo que pela boca morre o indivíduo que não lhe fazia mal nenhum se comesse mais vezes peixe.

O Chega desconfia que metade dos portugueses são potenciais criminosos. Na parte que me toca, tem razão. O crime de maus-tratos a crianças não é o único a que estas declarações incitam. Também provoca a vontade de fugir aos impostos, porque é dinheiro que vai servir para lhes pagar os salários. E é preferível pegar nos descontos e depositar directamente numa retrete.

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