Desde que José Mourinho venceu a Taça UEFA e a Champions pelo Porto que não se via um treinador português anunciar-se ao mundo do futebol com tanto estrondo como agora Pedro Pinto, líder parlamentar do Chega. Pedro Pinto é o treinador-adjunto da equipa de sub-13 do Futebol Clube do Crato e os seus métodos disruptivos já são comparados à revolução teórica que Mourinho trouxe no início do século.

Durante a Crato Evolution Cup, torneio realizado há duas semanas, numa altura em que a sua equipa perdia por 8 a zero com o Belenenses, Pedro Pinto ordenou aos seus jogadores que simulassem lesões, para atrasar o jogo. O treinador-adjunto cratino queria impedir que o adversário marcasse os 7 golos a mais que necessitava para prosseguir em prova. Isto é que é um líder. Eu, que tenho dificuldade em mandar o meu filho para a cama, admiro um homem que consegue que 11 crianças se deitem quando ainda nem sequer é noite. Treinadores banais pedem aos seus atletas que cumpram um plano de jogo, Pinto diz aos seus atletas para abordarem o jogo num plano. O horizontal. Não é fácil, alcançar este nível de disciplina.

Um técnico menos exigente teria dito aos miúdos para irem à luta e tentarem marcar um golo de honra, mas Pedro Pinto sabe que isso não os iria satisfazer. Num primeiro momento, até podiam saborear a sensação de terem lutado até ao fim e, apesar da derrota, alcançarem um objectivo. Mas esse sentimento passa depressa. Ao contrário da lembrança de ver crianças a chorarem por serem eliminados porque os adversários recusaram jogar cobardemente. Essa é a memória a acarinhar. Aposto que, daqui a 30 anos, estes seus pupilos ainda se vão reunir todos os anos para festejar o feito. É nestas situações que se forjam as amizades para a vida.

Além disso, o mister Pinto também chutou por duas vezes bolas para dentro do terreno de jogo, para interromper ataques prometedores das crianças do Belenenses. Pedro Pinto ficou sem as duas bolas, mas valeu a pena. Acaba de inventar um novo estilo: o futebol batotal. Faz sentido a competição chamar-se “Evolution Cup”, porque proporciona um agradável convívio entre primatas em diferentes estágios da evolução.

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Como todos os génios, Pinto não se limita a copiar os métodos de quem veio antes. Ele inspira-se no trabalho de Mourinho e acrescenta o seu toque de fantasia. Mourinho faz tudo para ganhar, Pedro Pinto faz tudo para ser goleado por poucos. Mourinho é desagradável para os árbitros, Pedro Pinto atira um chapéu à cara de um gaiato de 18 anos que está a apitar jogos de infantis. Mourinho espeta o dedo no olho do adjunto do Barcelona, Pedro Pinto recrimina-se por nunca ter pensado nisso e vai tomar boa nota para o futuro. Mourinho é um treinador com mercado, Pedro Pinto berra como se tivesse num mercado. Mourinho apresentou-se como Special One, Pedro Pinto é o Special Bun, pois está sempre com o ar de quem se prepara para embocar dois ou três hambúrgueres.

Ao contrário dos seus jogadores, que se atiram para o chão em vez enfrentarem os adversários, Pedro Pinto remete-se à defesa. “Sou obrigado a lamentar a forma vil como se está a tentar manchar o meu bom-nome, arrastando o meu partido para esta falsidade quando, no episódio em apreço, me encontrava a assistir a um jogo de futebol enquanto pai e não enquanto representante do Chega”, disse ao Expresso. Julgo que Pinto fez bem em separar as águas. Uma coisa é o seu trabalho partidário, outra é a actividade enquanto treinador do filho. Convém não as confundir. Até porque são contraditórias: durante a semana, Pedro Pinto defende a qualidade dos trabalhadores portugueses face à invasão de estrangeiros preguiçosos que vêm ocupar os seus lugares; ao fim-de-semana instrui os seus jogadores a desistirem e a ficarem deitados em vez de trabalhar, como madraços. Em que é que ficamos? Que tipo de nacionalismo é este que faz a raça portuguesa parecer tão fraca? Espero que o Conselho de Jurisdição do Chega se debruce sobre o tema.

Parabéns ao FC Crato, que está a inovar. Quando a maior parte dos clubes apostam na formação para se destacarem, o FC Crato aposta na falta de formação. Para já, os resultados são encorajadores: até esta semana, arrisco-me a dizer que, fora do Alto Alentejo, ninguém tinha ouvido falar no FC Crato. Pedro Pinto deu visibilidade ao clube. Não se via uma cena tão caricata de um gordo patusco a ficar sem chapéu desde que, na Canção de Lisboa, um elefante roubou o palhinhas ao Vasco Santana. Felizmente, chapéus há muitos, o que significa que podemos esperar mais bonés na cara de árbitros da Associação de Futebol de Portalegre.

Fala-se muito da suposta agressão, mas Pedro Pinto ficou em muito pior estado do que o árbitro. O árbitro levou com um chapéu nas ventas, mas Pinto, uma bisarma de 140 kg, ficou com a careca descoberta ao sol alentejano numa tarde de Junho. Podia ter apanhado uma insolação e caído redondo ao chão como os seus jogadores. Seria a sua primeira acção do dia sem batotice.