Com a celebração dos 75 anos da NATO, a política mundial neste último ano continuou a servir-nos com mais um banquete de tensões. Vamos a meio de 2024 e podemos registar a continuação da guerra da Ucrânia, a crise de Taiwan, o conflito Israelo-palestiniano, ofensivas entre o Irão e Israel e a retirada de tropas americanas do Níger.
Simultaneamente, assistimos Europa, Ásia, Médio Oriente e África a efervescer, num culminar de conflitos que não são apenas coincidência, mas sim um claro exemplo daquilo que denominamos por “proxy wars” – guerras por procuração.
As guerras por procuração, caracterizam-se por guerras com elementos que, apesar de diretamente serem alheios ao conflito, patrocinam uma das partes, na procura de retirar do resultado destas ofensivas algum benefício. Este termo não é novo, sendo bons exemplos desta forma de conflito, a guerra no Vietname, ou até mesmo a nossa guerra colonial, ambas ocorridas no século passado.
Assim, no que se assemelha a uma viagem no tempo, voltamos hoje a reviver uma polarização do mundo naquilo que na minha opinião é uma nova versão da Guerra Fria. Na realidade as únicas diferenças que deteto nestes dois períodos são a alteração de uma das personagens principais e consequentemente a suas motivações.
Na sua primeira versão, o período que denominamos como Guerra Fria, decorreu entre 1947 e 1991, numa disputa ideológica pela hegemonia mundial EUA e a antiga URSS dividiram o mundo em dois blocos, de onde lideraram a disputa pelo poder. Assistimos a uma corrida ao armamento nuclear, à exploração espacial e ao expansionismo ideológico através das já referidas “proxy wars”. Não podendo considerar aos dias de hoje a Rússia – antiga URSS – uma potência, temos a sua substituição pela China, cujas motivações ao contrário da primeira, são exclusivamente económicas.
A verdade é uma, sem o apoio da China, Putin jamais teria prosseguido com a invasão à Ucrânia, bem como Israel sem o suporte dos EUA jamais teria tido um apoio tão consensual no início do conflito com a Palestina. De forma progressiva, à semelhança do que já aconteceu no passado, conseguimos acompanhar uma sequência de acontecimentos que culminam numa reorganização geopolítica. Passo a passo, mais uma vez vemos a Comunidade Internacional a dividir-se em dois polos com os seus atores a forjar novas alianças ou restabelecer as antigas.
Dois exemplos claros destes modus operandi são recentemente termos tido a oportunidade de acompanhar por um lado a Rússia a estabelecer acordos com velhos conhecidos, como é o caso do acordo de cooperação com São Tomé, ou por outro o roteiro de Zelensly pela Europa na procura de não deixar esquecer a causa ucraniana e de um reforço àquilo que é o apoio indireto dado pela Nato.
Confrontados com este novo cenário é normal perguntarmos qual é o papel da União Europeia. Com uma ONU obsoleta sem qualquer poder de exequibilidade, cabe aos restantes atores, como é o caso da União Europeia, o papel de mediar e gerir estes conflitos, de forma que esta nova era não ganhe o tão temido carácter expansionista da sua primeira versão.
Assim, para a segurança da própria União Europeia, considero necessária uma mudança de postura e estratégia com uma aposta real na pasta da defesa. Devemos entender que se queremos a paz temos de preparar-nos para a guerra. Por isso e considerando que por enquanto não existe um exército europeu que cumpra a agenda da União Europeia, temos de nos munir de outras armas.
Para fortalecer sua capacidade de defesa e garantir a paz e a segurança no continente é imprescindível que a União Europeia exija aos seus membros um maior investimento na defesa, cumprindo pelo menos com a meta de 2% do PIB exigida pela NATO. Neste seguimento é também importante que exista um incentivo à canalização dos recursos excedentes para a compra de novos equipamentos e modernização da tecnologia militar, bem como uma agenda que priorize o desenvolvimento de projetos de cooperação nesta área e o investimento na indústria de armamento.
É certo que a manutenção de uma postura passiva da parte da União Europeia, face a esta nova realidade, fará com que esta seja instrumentalizada para beneficiar interesses de terceiros, pelo que é imperativo para o futuro da Europa tomar medidas e agir hoje para não ter de reagir amanhã.