Bem podem evocar a natureza específica da política açoriana, para evitar leituras nacionais dos resultados das eleições regionais, mas só há uma conclusão: a AD e Montenegro ganharam. O resto são desculpas. Se o PS tivesse ganho, as mesmas pessoas que sublinharam a natureza local das eleições açorianas, estariam a falar da importância nacional da vitória socialista. Aliás, as mesmas pessoas que fizeram apenas leituras açorianas dos resultados do último domingo, tinham feito leituras nacionais dos acontecimentos na Madeira na semana anterior. É impressionante como as pessoas nem sequer se apercebem das suas contradições.
A um mês das eleições legislativas qualquer acontecimento político relevante conta, ora umas eleições contam ainda mais. A AD conseguiu uma vitória que dará mais confiança e até uma dinâmica de vitória para as semanas que faltam para as eleições de 10 de Março. Como líder do PS, Pedro Nuno Santos sofreu uma derrota no seu primeiro teste eleitoral. Nada disto significa que o resultado das eleições legislativas esteja decidido. Nada disso, ainda muita coisa pode acontecer, e as eleições serão disputadas até ao fim. Mas, depois das eleições nos Açores, tenho duas certezas. A AD está melhor, e o PS está pior.
Mas as eleições nos Açores também foram uma vitória para Montenegro. Foi muito criticado pela sua decisão de ir aos Açores na noite eleitoral. Eu próprio achei que era um erro, e agora reconheço que eu estava errado. Pode agora dizer-se que Montenegro teve sorte, mas – recuperando o grande mestre da política moderna, Maquíavel – a fortuna faz parte da política. E a verdade é que Montenegro não vacilou perante as críticas que recebeu. Manteve uma decisão que foi muito atacada.
Com a ida aos Açores, Montenegro não permitiu que o líder do PSD açoriano abandonasse a disciplina partidária de não fazer alianças com o Chega. E aqui falo contra mim próprio que fui e sou contra linhas vermelhas entre a AD e o Chega. Mas foi a estratégia decidida por Montenegro e pela AD, e em campanha eleitoral a disciplina política é fundamental.
A estratégia da AD também começou a criar problemas ao PS e ao Chega. Como é óbvio não se podem juntar os dois nos Açores contra um governo minoritário da AD. Se o fizessem, a AD ainda teria maioria absoluta no dia 10 de Março. E vão ter o mesmo problema após as eleições legislativas se a AD ganhar num parlamento de direita. O Chega nunca votará a favor de uma moção de rejeição do PS contra um governo minoritário da AD. E o PS ficará dividido se PNS apresentar uma moção de rejeição.
As eleições dos Açores mostraram duas coisas muito importantes para o futuro da política portuguesa a curto, médio prazo. Primeiro, com maioria de direita no parlamento, mesmo com o Chega a crescer, pode haver um governo minoritário da AD porque o PS não se pode aliar aos “fascistas” do Chega. Por uma vez, o “fascismo” virou-se contra o PS. As eleições nos Açores também mostraram que o Chega deixou de ser um partido anti-sistema e passou a ser um partido que aspira ao poder, e sabe que só poderá lá chegar com a AD. Será uma questão de tempo até o Chega aceitar as exigências da AD e as linhas vermelhas acabarem.