Quatro empresas de Carlos Santos Silva, amigo de infância de José Sócrates e suspeito de ter sido seu “testa de ferro” no esquema de fraude fiscal e branqueamento de capitais que motivou a ‘Operação Marquês’, celebraram contratos com o setor público no valor de 3,4 milhões de euros entre abril de 2009 e junho de 2011 – os últimos dois anos de governação socialista. Os restantes 4 milhões foram conseguidos já no período de liderança social-democrata.

De acordo com os dados disponíveis na plataforma online Portal Base – onde só é possível consultar os contratos publicados a partir de agosto de 2008 -, Santos Silva, na qualidade de sócio-gerente, realizou negócios com o Estado através da Proengel, na qual tem uma participação de 50%, da Enaque, da Oficina de Engenheiros e da EFS – Engenharia Fiscalização e Serviços. Entre os principais clientes de Carlos Santos Silva contam-se várias câmaras (na maioria socialistas), empresas do grupo Águas de Portugal, a Estradas de Portugal e a Parque Escolar, duas empresas que foram bandeira política na governação de Sócrates, muito assente na recuperação económica com base em parcerias público-privadas.

Nos últimos anos de governação do antigo primeiro-ministro, as quatro empresas de Santos Silva celebraram contratos no valor de 504 mil euros com a Administração Central. No universo de empresas tuteladas pelo Estado, a Estradas de Portugal, S.A. foi um dos principais parceiros de negócios de Santos Silva: entre 2009 e meados de 2011, foram celebrados quatro contratos no valor total de 174 mil euros. O que mais ganhos gerou, assinado a março de 2010, rendeu 80 mil euros à Enaque, uma empresa vocacionada para elaboração de estudos e projetos de vias de comunicação e obras de arte – o contrato envolvia a elaboração de três projetos de passagens hidráulicas e de um outro para a construção de uma ponte sobre a descarga da Barragem de Alpiarça na Estrada Nacional 118, que liga o Montijo a Portalegre.

Mas a Parque Escolar, E.P.E foi o cliente mais lucrativo de Carlos Santos Silva: a 13 de outubro de 2010, a EFS celebrou, por exemplo, um contrato no valor de 193 mil euros com essa empresa para a gestão e fiscalização da obra de remodelação da escola Sá de Miranda, em Braga.

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Existem, ainda, outros dois contratos celebrados com a Parque Escolar no valor de 2,6 milhões e 1,7 milhões de euros, respetivamente, mas que foram obtidos em consórcio com outras três empresas (Gibb Portugal, Prospetiva, Prointec). Por isso, em rigor, não se podem atribuir os ganhos destes negócios exclusivamente à EFS, pelo que estes valores não entraram nas contas do Observador. Ainda assim, tiveram, naturalmente, impacto no valor total dos ganhos obtidos pelas empresas de Carlos Santos Silva em negócios com a Administração Central.

Os restantes 2,9 milhões de euros foram conseguidos através de contratos celebrados com associações de municípios e câmaras municipais espalhadas por todo o país. A 12 de novembro de 2009, por exemplo, a Proengel chegou a acordo com Câmara Municipal de Borba, presidida pelo socialista Ângelo de Sá, para a elaboração de dois projetos de arquitetura no valor de 205 e 105 mil euros, respetivamente.

No mesmo período [janeiro de 2009 a junho de 2011], a EFS assinou um dos maiores contratos com a Águas do Zêzere e Côa: 249 mil euros para fiscalizar três empreitadas relacionadas com o sistema de abastecimento de água e de saneamento em Fornos de Algodres-Gouveia, Fundão-Guarda e, ainda, na região do Mondego.

Por outro lado, a Oficina de Engenheiros, fundada em 1994 e com sede em Castelo Branco, conseguiu 259 mil euros em contratos celebrados com quatro municípios: Serpa (CDU), Belmonte, Castelo Branco e Torres Novas (PS).

Os negócios continuaram na era Passos

Durante os 42 meses de governação social-democrata, as quatro empresas já referidas conseguiram contratos no valor de 4 milhões de euros, dos quais 2,1 milhões são com a Administração Central. Um acréscimo de 600 mil euros face ao período anterior, quando contabilizados os 30 meses do Governo de José Sócrates analisados – uma janela temporal bastante inferior.

Os negócios com a Estradas de Portugal continuaram a ser os mais lucrativos para as empresas de Carlos Santos Silva – 995 mil euros entre julho de 2011 e dezembro de 2014.

Já no caso da Parque Escolar, o Estado fechou os cordões à bolsa e congelou todas as obras que estavam previstas – só as anteriormente acordadas com o Governo socialista foram concluídas. As contas da Parque Escolar foram, inclusive, alvo de uma auditoria quando o endividamento da empresa ultrapassava já os 900 milhões de euros.

Com a mudança de Governo, a carteira de clientes do ex-administrador do Grupo Lena entre câmaras municipais também se diversificou: os executivos camarários sociais-democratas tornaram-se os principais adjudicantes dos contratos celebrados com as empresas de Carlos Santos Silva.

Em julho de 2011, no rescaldo das eleições legislativas que deram a vitória a Pedro Passos Coelho, as Câmaras de Covilhã, Portalegre e Bragança, por exemplo, assinaram contratos no valor total de 64 mil euros com a Proengel. A isto juntam-se outros contratos, muitos no setor das águas. Ao todo, foram 320 mil euros em contratos negociados com empresas do grupo Águas de Portugal.

No entanto, os valores obtidos pelas quatro empresas de Santos Silva em intervenções contratualizadas com câmaras municipais e associações de municípios – 1,9 milhões de euros – não ultrapassa a quantia que ‘entrou nos cofres’ das empresas de Carlos Santos Silva durante o período de governação de José Sócrates: 2,9 milhões de euros, negociados, sobretudo, com empresas do grupo Águas de Portugal e Câmaras socialistas.

Estes contratos e valores envolvidos são apenas os que estão disponíveis no Portal Base. O valor dos ganhos foi bastante superior, até porque a Proengel, por exemplo, foi muitas vezes subcontratada pelo Grupo Lena – apelidado como “a construtora do regime” e que teve como administrador, precisamente, o amigo de infância do antigo primeiro-ministro.

Carlos Santos Silva tem ainda participações em mais quatro empresas, que, contudo, não aparecem no portal Base como tendo ganho contratos com o Estado: é sócio-gerente na XLM e da Itineresanis, presidente do conselho de administração da Proingel II International Projetcts e vogal do conselho de administração da XMI.